Acórdão nº 218/2001.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Janeiro de 2007

Magistrado ResponsávelARTUR DIAS
Data da Resolução30 de Janeiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

RELATÓRIO “A....” com sede na Rua de S. Domingos à Lapa, nº 35, Lisboa, intentou acção declarativa de condenação, com processo comum e forma sumária, contra B...., residente em Casal Carvalho, Benedita, Alcobaça, pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de 1.049.366$00 (5.234,21 €) a título de direito de regresso pelo pagamento da indemnização ao lesado, nos termos do artº 19º al. c) do Dec. Lei nº 522/85, de 31/12, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação, e vincendos até integral pagamento.

Alegou, para tanto, em síntese, que, com base no contrato de seguro através do qual o R. transferiu para si a responsabilidade civil perante terceiros inerente à circulação do veículo automóvel de matrícula FQ-22-99, indemnizou os lesados por um acidente de viação ocorrido no dia 9 de Maio de 1999, em que foi interveniente aquela viatura, conduzida pelo R., seu proprietário; e que o R., sobre quem recai a culpa da ocorrência do acidente, conduzia sob influência do álcool, apresentando uma taxa de alcoolémia no sangue (TAS) de 1,89 g/l e, verificado o sinistro, pôs-se em fuga, abandonando o local.

O R. contestou, impugnando que na altura da ocorrência do acidente se encontrasse sob a influência do álcool, e alegando que não existiu qualquer abandono de sinistrado, porquanto o réu se ausentou do local do acidente porque necessitava de receber cuidados médicos e hospitalares.

Saneada, condensada e instruída a acção, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, em cujo âmbito foi exarado o despacho de fls. 359-360, decidindo a matéria de facto controvertida.

Foi depois proferida a sentença de fls. 266 a 279, julgando a acção procedente e condenando o Réu a pagar à Autora a quantia global de 5.234,21 € (cinco mil, duzentos e trinta e quatro euros e vinte e um cêntimos) a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados às taxas legais, desde a citação e até integral pagamento.

Inconformado, o R. interpôs recurso que foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.

Na alegação oportunamente apresentada o recorrente formulou as conclusões seguintes: 1) No cruzamento da estrada municipal com a EN nº 1 parou o seu veículo, após o que prosseguiu a sua marcha e cruzou a EN nº 1 respeitando, assim, o sinal de "STOP"; 2) O veículo XS-22-93 circulava a velocidade superior a 50 Km/hora; 3) O local do sinistro era uma localidade, havendo várias residências; 4) O veículo XS circulava em excesso de velocidade; 5) A responsabilidade civil pela produção do sinistro é imputada ao veículo XS; Mas, se assim não for entendido e sem prescindir, 6) Não é possível concluir se existiu ou inexistiu culpa, efectiva ou presumida de algum ou de ambos os condutores na produção do acidente facto que afasta o funcionamento das normas atinentes a responsabilidade civil por facto ilícito estando perante responsabilidade objectiva ou pelo risco aplicando-se as regras do artº 506º Código Civil; 7) Consequentemente, dos danos resultantes do embate hão-de ser ressarcidas pelas entidades responsáveis de acordo com os níveis de diferenças de risco; 8) À apelada não é conferido o exercício do direito de regresso; 9) Resultando provado que, em consequência do embate o veículo do Réu caiu numa ribanceira, este foi cuspido do mesmo ficando combalido e se dirigiu ao Hospital, havendo no local várias residências e na altura da ocorrência algum trânsito, tais factos afastam o conceito de “abandono do sinistrado”; 10) Ao Réu não seria exigível permanecer no local.

Sem prescindir; 11) O direito de regresso importa sempre um juízo de dano à previsão legal, só existindo se, efectivamente, da situação prevista na lei resultar, em concreto, um dano exorbitante, excessivo do risco normal assumido; 12) No momento em que o apelante se afasta já os danos resultantes do acidente, cobertos pelo seguro, estão efectiva e potencialmente, provocados, existindo já, relativamente a eles (ainda que futuros) responsabilidade civil da seguradora; 13) Competia à apelada alegar e provar, o que não fez, que para além dos danos do acidente houve outros ou o agravamento daqueles, por força do abandono do sinistrado; 14) Não tendo a apelada alegado e provado que resultaram danos ou o agravamento dos provenientes por força do abandono do sinistrado, isto é, um dano exorbitante, excessivo do risco normal assumido, o direito de regresso da apelada não existe; 15) Foram violados os artºs 483º a 510º Código Civil e DL nº 522/85 de 31/12.

16) Pelo que, deve a sentença recorrida ser substituída por outra que absolva o Réu do pedido.

A recorrida respondeu defendendo a confirmação da sentença sob recurso.

Colhidos os pertinentes vistos, cumpre apreciar e decidir.

*** 2.

QUESTÕES A SOLUCIONAR Tendo em consideração que, de acordo com os artºs 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. Proc. Civil, é pelas conclusões da alegação do recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, constata-se que à ponderação e decisão deste Tribunal foram colocadas as questões seguintes: a) Se a culpa pela ocorrência do acidente recai, total ou parcialmente, sobre o R.; b) Se houve abandono de sinistrado; c) Se a A. tem direito de regresso.

*** 3.

FUNDAMENTAÇÃO 3.1.

De facto Não tendo sido impugnada a decisão de facto nem havendo fundamento para oficiosamente a alterar, considera-se assente a factualidade dada como provada na 1ª instância e que é a seguinte: 3.1.1. No dia 9 de Maio de 1999, pelas 21h55m, na EN nº 1, no cruzamento desta estrada com a estrada municipal que liga Moita do Poço a Turquel, área do concelho e comarca de Alcobaça, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula XS-22-93 embateu no veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula FQ-22-99 [al. a) dos Factos Assentes].

3.1.2. O veículo de matrícula XS-22-93, pertença de Maria Alice Honório Gonçalves, era conduzido por Luís António Gonçalves Serra Fragoso e circulava na EN nº 1, no sentido de marcha Porto / Lisboa, pela semi-faixa direita de rodagem, atento o aludido sentido de marcha [al. b) dos Factos Assentes].

3.1.3. No interior do veículo de matrícula FQ-22-99 seguia, gratuitamente, como passageiro, António Ferreira Félix [al. c) dos Factos Assentes].

3.1.4. O réu conduzia o veículo de matrícula FQ-22-99, de sua pertença, pela referida estrada municipal, no sentido...

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