Acórdão nº 1215/06.3YRCBR de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Outubro de 2006

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução24 de Outubro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

A...

, intentou [ A acção foi originariamente intentada na jurisdição administrativa, transitando posteriormente para a jurisdição comum (no caso a 2ª Secção da Vara de Competência Mista de Coimbra), em função da declaração de incompetência material daquela jurisdição administrativa (cfr. fls. 79/83 e 89).

] contra a Caixa Geral de Aposentações, a presente acção visando a condenação desta entidade a reconhecer, a ela A., o direito a auferir, enquanto herdeira hábil da pensão de sobrevivência, decorrente do falecimento do seu “cônjuge de facto”, B...

, aposentado daquela Caixa à data do respectivo falecimento, pedindo ainda a retroacção dessa declaração à data de tal decesso [ A fls. 99/100 promoveu a A. – o que foi aceite pelo despacho de fls. 107 – a alteração do pedido para a seguinte formulação: A) decretar-se a existência de uma união de facto entre a A. e B..., desde 1/10/1992, até à data do falecimento deste, ou seja, 6/03/2004; B) decretar-se a impossibilidade de serem obtidos alimentos por parte da A. de seus ascendentes, descendentes, ex-cônjuge e herança do falecido.

].

1.1.

Culminando a tramitação desta acção na primeira instância, foi proferida, após julgamento – no qual se procedeu à gravação da prova testemunhal produzida –, a Sentença de fls. 148/151 (a decisão respeitante à matéria de facto consta de fls. 145/146 vº), julgando a acção improcedente.

Para alcançar este resultado, ponderou o Tribunal que, descontando aos rendimentos, que considerou serem os auferidos pela A., as despesas apuradas da mesma, emergia um saldo positivo de €607,00. Tal saldo – disse-se na decisão recorrida –, sendo “[…] insuficient[e] para a sobrevivência da A. e da mãe […]”, mas sendo superior ao salário mínimo nacional, levou o Tribunal a considerar que a situação da A. “[não] lhe daria direito a pedir alimentos da herança do falecido B..., caso esta herança tivesse meios para [os] prestar” [transcrições de fls. 150 vº].

1.2.

Inconformada recorreu a A., apontando à Sentença uma errada apreciação da matéria de facto, no caso através de uma incorrecta quantificação das despesas dela A. [ Adiante, ao apreciar a matéria de facto, analisaremos a forma pela qual a A. pretende a modificação desta: concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e concretos meios probatórios que, em seu entender, impunham decisão diversa.

]. Defende ainda que, independentemente disso, o requisito da necessidade de alimentos deve, nestas situações, ser dispensado, sob pena de violação dos princípios constitucionais da igualdade, o direito a constituir família fora do casamento e o princípio da proporcionalidade. Entende a A., com efeito, que: “[…] O reconhecimento da titularidade do direito à pensão de sobrevivência a favor das pessoas que tenham vivido em união de facto […] com beneficiário falecido não depende da verificação de todos os requisitos previstos no artigo 2020º do Código Civil, por referência ao artigo 2004º, nº 1 do mesmo Código, especialmente não depende da verificação do requisito da necessidade de alimentos. Pois, tal entendimento é materialmente inconstitucional por violar as disposições conjugadas dos artigos 2º, 13º, 18º, nº 1, 36º, nº 1, 63º, nºs 1 e 3 e 67º, todos da Constituição da República Portuguesa.

[…]” [transcrição da conclusão IX de fls. 194] Aliás – e continuamos a resumir os argumentos da A. –, mesmo fora de um quadro interpretativo por referência a normas e princípios constitucionais, ou seja, num quadro que se limite a interpretar as pertinentes normas de direito ordinário, considera a A. que, estando em causa a atribuição de pensão de sobrevivência ao “viúvo de facto”, deve considerar-se: “[…] dispensada a prova da necessidade de alimentos e a prova das possibilidades económicas da herança ou das pessoas mencionadas nas alíneas a) a d) do nº 1 do artigo 2009º do Código Civil.

[…]” [transcrição parcial da conclusão XV de fls. 196] Estes, no essencial, os argumentos da A., rebatidos pela Caixa Geral de Aposentações nas contra-alegações de fls. 202/210.

II – Fundamentação Da questão de facto: 2.

A A. pretende, conforme se referiu, que o Tribunal da Relação modifique determinados pontos da matéria de facto elencada na decisão, nos termos do disposto no artigo 712º, nº 1, alínea a) do Código de Processo Civil (CPC), impugnando para esse efeito – e cumprindo, assim, o ónus decorrente do artigo 690º-A do CPC – as respostas aos itens (quesitos) nºs 9, 10, 12, 13, 14 e 15 da base instrutória (v. fls. 162) e indicando o depoimento de quatro testemunhas (João Serpa Oliva, Aurora Arnaut, Filomena Roma e Graciela Grade) como determinantes de respostas distintas das dadas pelo Tribunal a esses pontos específicos da matéria de facto.

Está em causa a quantificação, decorrente da decisão da matéria de facto, das despesas mensais da A., sendo certo que estas foram postas em confronto na decisão recorrida com os rendimentos da mesma, deduzindo-se dessa ponderação (receitas – despesas) um “saldo positivo” que a primeira instância valorou em termos de afastar o elemento “carência de alimentos” [ Em rigor a afirmação da primeira instância é a de que, “sobejando” à A., deduzidas das receitas as despesas, algo mais que o salário mínimo nacional de 2004, esta nunca poderia pedir alimentos à herança do seu cônjuge de facto (v. fls. 150 vº).

] que o Tribunal considerou pressuposto do direito feito valer nesta acção pela A., contra a Caixa Geral de Aposentações.

2.1.

A crítica da A. pode ser resumida na alegação de terem ficado por contabilizar algumas importâncias a título de despesas fixas mensais. Embora esta reparo à Decisão tenha um conteúdo genérico, respeitariam essas despesas, desde logo, se bem compreendemos a argumentação da recorrente a fls. 165/167 (relativamente aos nºs 14 e 15 da matéria de facto), à não consideração da circunstância de ela própria vir assumindo a responsabilidade (o encargo) de cuidar da sua mãe, mantendo-a a viver com ela, sendo que se o não fizesse, suportaria com um Lar de idosos cerca de €600,00/€700,00 mensais. Seguindo esta linha argumentativa, tendo presente o montante da pensão de sua mãe (€332,80), deveriam adicionar-se aos gastos da A. com a mãe, a título de “alimentos em espécie” que lhe vem prestando, a diferença entre a pensão desta e o que pagaria ela A. – mas, sublinhe-se, não paga efectivamente –...

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