Acórdão nº 236/11.9TBGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelMARIA DA CONCEI
Data da Resolução26 de Maio de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes na 1ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório: Abílio… e mulher, Emília… , vieram propor contra Alfredo… providência cautelar de restituição provisória da posse alegando, em síntese, que são donos e legítimos possuidores de um prédio urbano sito no Lugar da Seara, freguesia de Brito, e de um prédio rústico situado no mesmo local, contíguo ao anterior, os quais confrontam pelo lado sul com um prédio rústico do requerido, cujo limite é assinalado por marcos (esteios) em pedra, e que ao longo desta confrontação existe um caminho de servidão, em linha recta, com cerca de 100 metros de comprimento e 4 metros de largura, que constitui o único acesso ao prédio rústico dos requerentes, ao “Campo de Roriz”, propriedade de José… , e ao campo do requerido que confronta com o caminho. Mais referem que esse caminho sempre assim foi utilizado há mais de 10/20 anos pelas pessoas que agricultam os terrenos que com ele confinam, tais como os requerentes que o usam a pé ou com máquinas agrícolas, à vista de toda a gente, de forma continuada e sem oposição de ninguém, incluindo o requerido, com o ânimo e a convicção de exercerem um direito próprio, o de propriedade, e de não lesar direitos de outrem. Invocam, ainda, que no dia 30.8.2010 o requerido construiu uma vedação, formada por uma fiada de pedras, sobre o leito daquele caminho, vedando-o e ocupando-o numa extensão de cerca de 40 metros a partir da Travessa da Seara, impedindo, assim, os requerentes de utilizar o mesmo e acederem aos respectivos terrenos de cultivo. Mais referem que o requerido viu judicialmente reconhecido o seu direito de passagem no mencionado caminho através do processo que, com o nº 5071/07.6TBGMR, correu termos no 3º Juízo Cível deste Tribunal. Concluem, pedindo se ordene a restituição aos requerentes da posse sobre o dito caminho de acesso ao seu prédio, intimando-se o requerido a retirar toda a pedra que ali colocou e a não praticar actos que perturbem a posse dos requerentes, bem como se fixe uma sanção pecuniária compulsória de € 50,00 por cada dia em que o requerido mantenha o impedimento de utilização do mencionado caminho.

Foram inquiridas as testemunhas arroladas pelos requerentes e, fixando-se a matéria de facto, foi proferida sentença, em 4.11.2010, que decidiu julgar procedente a providência, ordenando-se que: “ - aos requerentes e seja restituída provisoriamente à posse sobre o caminho de servidão identificado e que, - o requerido remova imediatamente as pedras que colocou a impedir a passagem dos requerentes e proíbe-se o requerido de, por qualquer modo, praticar quaisquer actos capazes de turbar a posse e o direito de passagem dos requerentes.

Mais se condena o requerido no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 50,00 (cinquenta euros) por cada dia em que se mantenha o impedimento de utilização do caminho e de acesso ao prédio dos requerentes.” Ouvido o requerido, veio este deduzir oposição, defendendo, no essencial, que é falsa toda a matéria vertida nos pontos c) a l) da decisão proferida e que esta contende com a determinação dos limites objectivos do caso julgado formado pela decisão proferida no aludido processo nº 5071/07.6TBGMR, que correu termos no 3º Juízo do Tribunal Judicial de Guimarães, e no processo nº 384/08.2TCGMR, que correu termos na 1ª Vara Mista do mesmo Tribunal, a primeira das quais confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães. Alega que a procedência da excepção do caso julgado obsta à reapreciação da questão, pelo que a sentença proferida na providência não pode subsistir. Pede a revogação da mesma com tal fundamento ou, se assim se não entender, por falta da verificação dos pressupostos para o seu decretamento e pede, ainda, a condenação dos requerentes como litigantes de má fé. Junta documentos, requer o depoimento de parte do requerente marido e arrola testemunhas.

Os requerentes responderam à matéria de excepção, reconheceram, no essencial, que o caminho referido nas decisões indicadas na oposição é, pelo menos em parte, aquele cuja restituição aqui se reclama, e concluíram pela manutenção do decidido.

O Tribunal ordenou, em consequência, a requisição de processo judicial de execução para consulta.

Seguidamente, foi proferida nova sentença, em 20.2.2011, que concluiu nos seguintes termos: “... decide-se julgar verificada a excepção dilatória de caso julgado quanto à factualidade dada como indiciariamente provada nas als. c) a l) na decisão proferida nos autos, com base na decisão proferida no processo nº 5071/07.6 TGMR, bem assim quanto ao facto referido em m) da mesma decisão, no que ao local da colocação das pedras pelo requerido respeita, com base decisão transitada em julgado no processo nº 384/08.2TCGMR, que reconheceu o requerido como titular do direito de propriedade do prédio onde a descrita actuação ocorreu, resultando abalados os fundamentos que conduziram à decisão de restituição do caminho de servidão em apreço nos autos, justificando-se a sua alteração.

Em conformidade, decido alterar, a decisão de decretamento da providência cautelar requerida e proferida a fls. 65 a 74, dando-a sem efeito.

Concluiu-se pela não verificação de litigância de má fé.

Custas pelos requerentes.” Inconformados, interpuseram recurso os requerentes, apresentando as respectivas alegações que culminam com as seguintes conclusões que se transcrevem: “ A) Para haver caso julgado é necessário que haja repetição da causa. Art. 497 do CPC.

B) A repetição da causa pressupõe uma tríplice identidade: dos sujeitos, do pedido e da causa de pedir. Art. 498 do CPC.

C) (Inexistente) D) A decisão proferida na providência cautelar não se debruça sobre a relação material controvertida suscitada nos processos enunciados. Art. 671 do CPC E) Verificam-se, assim, os limites objectivos à excepção do caso julgado quanto ao processo nº 5071/07.6TBGMR do 3º Juízo Cível de Guimarães.

F) E, não existe identidade de sujeitos relativamente ao processo nº 384/08.2TCGMR da 1ª Vara Mista de Guimarães.

G) Igualmente não ocorre identidade de pedidos e de causas de pedir nos processos em confronto sendo diferentes os efeitos jurídicos pretendidos, e, as pretensões formuladas procedem de factos jurídicos diversos.

H) Aliás, o caso julgado refere-se à decisão em si e não aos fundamentos da decisão, sejam de facto, sejam de direito.

I) A douta decisão recorrida violou as disposições legais citadas e deve ser revogada, mantendo-se a decretada providência cautelar.” Em contra-alegações, conclui o requerido: “ 1. Face ao conhecimento pelo Tribunal das decisões judiciais proferidas nos processos nºs 5071/07.6TGMR, 3º Juízo Cível e 384/08.2TCGMR, 2ª Vara Mista e ao conhecimento do processo executivo nº 3430/09.9TBGMR, bem andou a Mmª Juiz a quo ao julgar verificada a invocada excepção do caso julgado face à decisão judicial, com trânsito em julgado, proferida no aludido processo 5071/07.6TGMR, 3º Juízo Cível.

  1. Bem andou o Tribunal, de igual modo, ao julgar relevante para os presentes a decisão transitada em julgado proferida no processo nº 384/08.2TCGMR, 1ª Vara Mista que reconheceu ao apelado o direito de propriedade do prédio onde a actuação indiciariamente descrita na providência ocorreu.

  2. Na sua alegação, os recorrentes escolhem ignorar que está assente, desde logo por acordo, que o caminho com a descrição dada na presente providência foi objecto das decisões referidas. Por conseguinte são os próprios requerentes que restringem o objecto da presente acção, apenas à restituição desse caminho.

  3. É este caminho o objecto do referido processo executivo – n.º 3430/09.9TBGMR –, sendo certo que em 14.01.2011 já a solicitadora de execução procedeu à diligência de restituição do caminho, concluindo que o caminho restituído foi delimitado.

  4. Citando a decisão recorrida “não é através desta providência cautelar que os requerentes poderão anular os efeitos decorrentes da pendência da oposição à execução nem contrariar o cumprimento de uma decisão judicial que os condenou à entrega do caminho, que não acatam, sob pena de se chegar ao absurdo de ver anulados os efeitos de uma decisão transitada em julgado, com a instauração da providência cautelar para além de impraticável, é juridicamente insustentável.” 6. Donde a improcedência de todas as conclusões dos apelantes.” Pede a improcedência do recurso e a manutenção do decidido.

    O recurso foi recebido como de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito suspensivo.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    *** II- Fundamentação de facto: A decisão da 1ª instância considerou como provada a seguinte factualidade: A – Na 1ª decisão, proferida antes do contraditório, em 4.11.2010: a) Os AA. são donos de dois prédios: um prédio urbano, sito no Lugar da Seara, freguesia de Brito, inscrito na matriz respectiva sob o art. 338 e descrito na Conservatória sob nº 1490 e de um prédio rústico, situado no mesmo local e contíguo ao anterior, inscrito na respectiva matriz sob o art. 205 e descrito na Conservatória sob o nº 1482.

    b) Tais prédios foram adquiridos pelos Requerentes a uma irmã do Requerido, por compra, em 13/01/2006.

    c) Os prédios identificados em a) confrontam pelo lado sul com um prédio rústico do Requerido, sendo o limite dos prédios assinalado por marcos (esteios) em pedra.

    d) Ao longo de toda esta confrontação, em linha recta, existe um caminho de servidão com cerca de 100 metros de extensão e 4 metros de largura.

    e) O caminho referido em d) tem o seu início na Travessa de Seara e, no sentido Nascente/Poente, desce em direcção ao “Campo de Roriz” propriedade de José S. Gonçalves.

    f) No subsolo do leito do caminho foram, há alguns anos atrás, construídos poços de vigia e uma conduta para drenagem de águas pluviais.

    g) O leito do caminho encontra-se bem trilhado e calcado sendo o único acesso aos vários terrenos agrícolas já referidos.

    h) Designadamente, ao prédio rústico dos Requerentes, ao Campo de Roriz e ao campo do Requerido...

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