Acórdão nº 1498/08.4TVLSB.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelRAQUEL REGO
Data da Resolução19 de Maio de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO.

  1. Luís…, solteiro, residente em Courel, Barcelos, intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário contra Augusto… e mulher Maria…, bem como contra Cristina…, todos residentes em Remelhe, Barcelos, pedindo sejam os RR. condenados: - A entregar ao A. todo o valor correspondente ao prémio obtido no jogo do “euromilhões”, do concurso 07/2007, no valor de €15.000.000,00, acrescido de juros e demais frutos recebidos pela aplicação do mesmo, juros esses contados desde a data de recebimento do prémio e até integral e efectivo pagamento; - Quando assim se não entenda, mormente caso se conclua que o pagamento de €2,00, efectuado posteriormente à obtenção do prémio, corresponde a um terço do mesmo, sempre o A. terá direito a dois terços do prémio obtido no sorteio; - Finalmente, sempre e em última instância, o A. terá direito a metade do prémio obtido; - Sempre, e em todas as circunstâncias e situações supra descritas, ao valor a entregar ao A. pelos RR deverá acrescer juros e frutos, contados desde a data do recebimento do prémio até integral e efectivo pagamento.

    Para tanto e em suma, alegou que há cerca de três anos encetou uma relação de namoro com a ré Cristina Simões e, desde então, começaram a jogar no “euromilhões”, em conjunto.

    Nessa sequência, no dia 9 de Janeiro de 2007, como era habitual, de acordo com a dita ré, efectuou o registo de três apostas pelo que pagou um total de €6,00.

    Efectuado o sorteio, no dia 19/01/07, veio a constatar-se que uma das apostas tinha sido premiada com um prêmio de €15.000.000,00.

    Por solicitação e insistência da ré Cristina, foi assinada um declaração na qual constava que o titular do prémio seria o réu Augusto, com a justificação de o seu pai ser mais sabedor.

    Não obstante ulteriores insistências e interpelações que efectuou, os RR nunca entregaram ao A. qualquer parte do montante global do prémio, que, por direito próprio lhe pertence.

  2. Regularmente citados, contestaram os RR aceitando a invocada relação amorosa e a regularidade do jogo durante o namoro, mas dizendo que jogavam individualmente, ficando sempre claro entre eles quais eram as apostas de cada um, suportando também cada um, exclusivamente do seu bolso, o custo das apostas que faziam, sendo, por isso, absolutamente falso que jogassem em conjunto.

    Concluem pela total improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.

  3. O autor apresentou réplica na qual, após impugnar a versão dos factos alegada pelos RR, concluíu como na petição inicial.

  4. Procedeu-se à elaboração da matéria de facto assente e da base instrutária e realizou-se a audiência de julgamento com observância do formalismo legal, tendo-se respondido à matéria constante da base instrutória por despacho proferido a fls. 1048 e segs., sem reclamação.

  5. De seguida, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou todos os RR a pagar ao Autor: - O montante correspondente a metade do valor do prémio do euromilhões - €7.500.000,00 —, acrescido de metade do valor resultante dos frutos civis ou rentabilização desse capital, obtidos através do investimento efectuado em produtos bancários; - O montante correspondente a metade do valor global recebido ou levantado por A. e R. que inclui o valor dos juros levantado pela R. -, acrescido de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data em que a A. procedeu à transferência do valor dos supra aludidos €100.000,00 - 17/05/07 -, até efectiva entrega, e incidentes sobre o valor da diferença existente entre o valor que o A. já recebeu — valores que lhe foram entregues pela R. -, e o correspondente àquele a que tem direito — correspondente ao valor da referida metade -, e que esteve na posse da R., Cristina.

  6. Inconformados, apelaram os RR para este Tribunal, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: (…) Terminam pedindo o integral provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida que deverá ser substituída por acórdão que absolva totalmente os RR do pedido.

  7. Foram apresentadas contra-alegações pugnando pela manutenção do decidido.

    1. FUNDAMENTAÇÃO A. Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos: 1 - O A. é estudante da Universidade Lusíada, pólo de Vila Nova de Famalicão.

      2 - Vive rio lugar de Boavista, Courel, em Barcelos.

      3 - O A. e a R. Cristina namoravam há cerca de 3 anos.

      4 - Os 1º e 2º RR são pais da 3ª R.

      5 - De Agosto de 2005 até Setembro de 2007, o A. trabalhou na empresa “P… & T… , Lda.”.

      6 - Empresa esta com escritório na Rua Fernão de Magalhães, nº2, 54/76, Barcelos.

      7 - O horário de trabalho era das 9h às 12h30 e das 14h30 às 19h.

      8 - Durante este período e no período de almoço, o A. deslocava-se do trabalho para casa para aí fazer a sua refeição de almoço.

      9 - Fazendo o caminho inverso, de casa para o trabalho, a seguir ao almoço, sempre entre as 14,00 h e as 14,25h.

      10 - Jogavam, com regularidade, no jogo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) designado “euromilhões”.

      11 - Praticamente todas as sextas-feiras, o A. dirigia-se ao Balcão da “Casa Brandão”, na freguesia de Alvelos, Concelho de Barcelos, para aí fazer a aposta e respectivo registo do “Euromilhôes”.

      12 - A “Casa Brandão” situa-se a caminho do domicílio do A. para o trabalho.

      13 - A caminho da casa Brandão, no dia 19-01-2007, o Autor recebeu uma mensagem da sua namorada, aqui 3ª Ré, a lembrá-lo de jogar no dito euromilhões” 14 - Em regra, a aposta era de cerca de €2,00 (dois euros) a €6,00 (seis euros) por semana.

      15 - Sendo uma aposta sugerida pela 3 Ré.

      16 - Habitualmente o A. jogava duas apostas e a R. Cristina apenas uma, embora nem sempre assim sucedesse (dado que muitas vezes jogavam ambos o mesmo número de apostas).

      17 - E também habitualmente as apostas eram feitas num único boletim e realizadas num só momento pelo A.

      18 — Desde que iniciaram o namoro o A. e a R. Cristina jogavam no euromilhões, pelo menos, uma aposta sugerida pela R., Cristina, e outra sugerida pelo A., sendo que, por vezes, este último, por sua iniciativa, fazia mais apostas, suportando os respectivos custos, sem que disso desse prévio conhecimento à R., Cristina, mas fazendo-o com a convicção de que se saísse o prémio em qualquer delas estava obrigado a proceder à divisão pela metade, com a R., Cristina.

      19 - Um dos boletins do euromilhões que o A. e a R., Cristina, jogaram foi premiado com um prémio de valor não concretamente determinado.

      20 - O valor do custo das apostas semanalmente efectuadas era suportado pelo A. e pela R. Cristina.

      21 - Na presente situação, referente ao sorteio nº3, de 2007, do “euromilhões”, o A. efectuou o pagamento de €4,00, e a R., Cristina, de €2,00, referentes a duas e a uma das três apostas efectuadas, respectivamente.

      22 - O registo de aposta foi efectuado às 14.15 h. do dia 19 de Janeiro de 2007.

      23 - Registo esse que o A. fez, pagando um total de €6,00 (seis euros), equivalente a três apostas.

      24 - O A. guardou o talão comprovativo de pagamento e aposta consigo.

      25 - Após a realização do sorteio do euromilhões, no mesmo dia 19/01, o A. e a R., Cristina, constataram que o talão que aquele detinha tinha sido o premiado, com o 1º prémio no valor total de €15.000.000,00 (quinze milhões de euros).

      26 - A chave sorteada com o primeiro prémio deste jogo, corresponde aos números 5-13-27-33—42, e as estrelas 2 e 4, indicados pela R. Cristina, que os comunicou ao A., por forma não concretamente apurada.

      27 - Depois de ter verificado que no sorteio do “euromilhões” tinha saído a chave que tinha indicado ao A., a R. Cristina telefonou-lhe a confirmar se ele tinha registado a aposta por si sugerida.

      28 - Perante a resposta afirmativa do A., comunicou-lhe que o “euromilhões” tinha saído na chave que ela indicou no boletim que tinha registado.

      29 - E pediu-lhe para guardar o talão e para lho entregar no dia seguinte.

      30 - Ao que o A. anuiu.

      31 - Após essa constatação — de que o talão que o A. detinha havia sido premiado -, a R. Cristina deu conhecimento desse facto aos RR. Augusto… e Maria…., seus pais, e o Autor deu também desse facto conhecimento ao Joaquim…, seu pai.

      32 - O A., no dia seguinte - 20 de Janeiro de 2007, sábado - apareceu em casa da Ré Cristina, por volta das 20 horas e 30 minutos.

      33 - O A. entregou voluntariamente à R. Cristina e à mãe desta o talão do registo da aposta efectuada, cujo original foi entregue à SCML.

      34 - Nessa ocasião a R. Cristina entregou ao A. o valor de €2,00, referente à aposta correspondente aos números por ela indicados.

      35 - E o A. não reclamou qualquer parcela do prémio.

      36 - Durante a semana seguinte, o Autor, todos os RR. e o pai do Autor combinaram deslocar-se à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), para se proceder à confirmação do prémio e ao seu eventual levantamento.

      37 - A R. Cristina já tinha em sua posse os títulos relativos à aposta premiada.

      38 - O A. era, nessa ocasião, o seu namorado e tinha sido ele quem procedeu ao registo da aposta que levou à obtenção do prémio.

      39 - E, no dia combinado o A. apareceu na estação de serviço de Viatodos, acompanhado pelo seu pai, local onde ficaram de se encontrar para depois seguirem para a estação de caminho de ferro de Vila Nova de Famalicão, dado pretenderem fazer a viagem de ida e volta de comboio.

      40 - Na SCML de Lisboa — no departamento de jogos — foram recebidos por uma responsável que se identificou como sendo a Drª Ana Marta Costa.

      41 - Intitulando-se como uma das responsáveis pelo atendimento e pagamento deste tipo de prémios.

      42 - Esta perguntou aos presentes quem tinha sido o premiado.

      43 - Nessa reunião tendo sido colocada por um dos presentes a questão de saber se era possível passar mais do que um cheque para pagamento da totalidade do valor do prémio, a Drª Ana Marta logo esclareceu que a SCML só iria proceder à emissão de um cheque. 44 - A Drª Marta aguardou que lhe fosse comunicado por algum dos presentes, qual o...

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