Acórdão nº 329/09.2PBVRL.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelJOAQUIM GOMES
Data da Resolução09 de Março de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso n.º 329/09.2PBVRL.P1 Relator: Joaquim Correia Gomes; Adjunta: Paula Guerreiro Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto I.- RELATÓRIO.

  1. No PC n.º 329/09.2PBVRL do 1.º Juízo do Tribunal de Vila Real, em que são: Recorrente/Arguido: B… Recorrido: Ministério Público por sentença de 2010/Jul./07, de fls. 116-121, o arguido foi condenado pela prática, como autor material, de um crime de abuso sexual de criança da previsão do art. 171.º, n.º 3, alínea a) do Código Penal numa pena de 5 (cinco) meses de prisão, cuja execução ficou suspensa por 1 (um) ano.

  2. O arguido recorreu desta condenação em 2010/Set./02, a fls. 129-141 pugnando pela sua revogação e subsequente absolvição, concluindo, resumidamente, que: ……………………………… ……………………………… ……………………………… 2. O Ministério Público respondeu em 2010/Set./23 a fls. 143-161 pugnando pela manutenção da sentença e a improcedência do recurso, porquanto e essencialmente: ……………………………… ……………………………… ……………………………… 5. Colheram-se os vistos legais, nada obstando que se conheça do mérito deste recurso.

*O objecto deste recurso passa pela nulidade da sentença [a)], o reexame da matéria de facto [b)], a insuficiência da matéria de facto [c)] e, se for, caso a qualificação jurídica da conduta do arguido [d)].

* * *II.- FUNDAMENTAÇÃO 1. A sentença recorrida Na parte que aqui releva transcreve-se o seguinte: “A – Factos provados Em sede de audiência de discussão e julgamento provaram-se os seguintes factos: 1) O arguido B… reside em ….

2) No dia 14 de Julho de 2009, pelas 15.30 horas, o arguido B… deslocou-se ao ….

3) Aí chegado o B… encontrou o C…, nascido em 15.11.1995, que aí estava a andar de bicicleta.

4) Então aproximou-se do C…, desceu o fecho das calças e introduziu as mãos pelo fecho das calças, dando a entender que iria tirar o pénis das calças e mostrá-lo ao C….

5) O C… fugiu do local de bicicleta antes de ver o arguido tirar o pénis do interior das calças e exibi-lo.

6) Agiu o arguido B… com o propósito de molestar e incomodar o C…, sabendo que o mesmo tinha menos de 14 anos de idade e por isso reagia com desconforto e desagrado à sua atitude de colocar a mão no pénis à sua frente, como sucedeu.

7) O arguido agiu de forma livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal.

8) O arguido não desejou prestar declarações.

9) O arguido não tem antecedentes criminais averbados no seu certificado do registo criminal.

10) O arguido é referenciado por aqueles que sobre a sua personalidade prestaram depoimento como sendo pessoa bem comportada, estudioso e muito inteligente, não lhe sendo conhecidos quaisquer comportamentos deste jaez no meio onde viveu e vive e trabalhou.

11) O arguido é reformado bancário auferindo reforma de 800,00 euros, não paga renda de casa e não tem filhos ou qualquer outra pessoa a seu cargo.

*B - Factos não provados - que o arguido se desloca com frequência a Vila Real, onde sabe que se encontram crianças na rua a brincar.

- que no dia dos factos o arguido soubesse que o menor C… estava a brincar na Rua, porque já o tinha visto naquele local em outras ocasiões.

- que ao aproximar-se do C… o arguido começou a sorrir.

- que não era a primeira vez que o arguido tinha aquela atitude.

- os constantes da contestação que tenham sentido diferente dos que supra se deram como provados.

*C - Motivação ……………………………… ……………………………… ………………………………*2. - Os fundamentos do recurso a) A nulidade da sentença O art. 379.º, n.º 1, do Código Processo Penal(1), estabelece as situações em que uma sentença é nula, sendo uma delas a da sua al. a), onde se menciona que tal sucede quando a mesma “não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do art. 374.º.”.

Naquele primeiro segmento normativo [374.º, n.º 2] preceitua-se que “Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”.

Tal nulidade, por não integrar o catálogo das insanáveis do art. 119.º e não estando especificadamente prevista como tal, está dependente de ser suscitada, podendo o sê-lo, em sede de recurso [120.º, n.º 1 e 379.º, n.º 2].

*O dever de fundamentar uma decisão judicial é uma decorrência, em primeiro lugar, do disposto no art. 205.º, n.º 1 da C. Rep., segundo o qual “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma previstas na lei”.

No entanto, tal dever de fundamentação, no âmbito do processo penal e na perspectiva do arguido, surge, igualmente, como uma das suas garantias constitucionais de defesa [32.º, n.º 1, da C. Rep.].

Tal implica que, ao proferir-se uma decisão judicial, se conheça as razões que a sustentam, de modo a se aferir se a mesma está fundada na lei.

É isso que decorre expressamente do disposto no art. 97.º, n.º 4 do Código Processo Penal, ao estabelecer que “Os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão”.

Por isso essa exigência é, simultaneamente, um acto de transparência democrática do exercício da função jurisdicional, que a legitima, e das garantias de defesa, ambas com assento constitucional, de forma a se aferir da sua razoabilidade e a obstar a decisões arbitrárias.(2) Daí que a fundamentação de um acto decisório deva estar devidamente exteriorizada no respectivo texto, de modo que se perceba qual o seu sentido, sendo certo que no caso de uma sentença deve obedecer ainda aos requisitos formais enunciados no citado art. 374.º, n.º 2.

Tudo isto para se conhecer, ao fim e ao cabo, qual foi o efectivo juízo decisório em que se alicerçou o correspondente sentenciamento, designadamente os factos acolhidos e a interpretação do direito perfilhada, permitindo o seu controlo pelos interessados e, se for caso disso, por uma instância jurisdicional distinta daquela.

Assim e à partida, não cumprem estes requisitos os actos decisórios que não tenham fundamento algum, por mínimo que seja, e aqueles que se revelem insuficientemente motivados.

Porém, também não se deve exigir que no acto decisório fiquem exauridos todos os possíveis posicionamentos que se colocam a quem decide, esgotando todas as questões que lhe foram suscitadas ou que o pudessem ser.

O que importa é que a motivação seja necessariamente objectiva e clara, e suficientemente abrangente em relação às questões aí suscitadas, de modo que se perceba o raciocínio seguido.

Muitas vezes confunde-se motivação com prolixidade da fundamentação e esta apenas serve para confundir ou obnubilar a compreensibilidade que deve ser uma característica daquela.

*Como é sabido e muito embora, segundo o disposto no art. 127.º, o tribunal seja livre na formação da sua convicção, existem algumas restrições legais ou condicionantes estruturais que o podem comprimir.

Tais restrições existem no valor probatório dos documentos autênticos e autenticados [169.º], no efeito de caso julgado nos Pedido de Indemnização Cível [84.º], na prova pericial [163.º] e na confissão integral sem reservas [344.º].

Aquelas condicionantes assentam no princípio da legalidade da prova [32.º, n.º 8 C. Rep.; 125.º e 126.º] e no princípio “in dubio pro reo”, enquanto emanação da garantia constitucional da presunção de inocência [32.º, n.º 2, C. Rep.].

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