Acórdão nº 334/04 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Abril de 2004
Magistrado Responsável | DR. MONTEIRO CASIMIRO |
Data da Resolução | 27 de Abril de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: AA, BB e marido, CC, DD e EE propuseram, em 14/09/2001, no Tribunal da comarca de Idanha-a-Nova, acção com processo ordinário emergente de acidente de viação contra FF, pedindo a condenação desta no pagamento global de 10.000.000$00, ou no de 6.000.000$00 baseado no risco, com juros vencidos e vincendos à taxa legal desde a citação, a título de danos morais e a título de indemnização pela lesão do direito à vida, em consequência do acidente de viação ocorrido no dia 15/04/2000, na estrada nacional nº 354, originado pelo ora autor EE, que, ao conduzir o veículo ligeiro de passageiros KK, pertencente ao primeiro autor, desatento à condução, se despistou e foi embater numa árvore, provocando a morte a GG e ferimentos no primeiro autor, respectivamente, mãe e pai do referido EE, cabendo a responsabilidade pelas consequências do acidente à ora ré seguradora em virtude de o proprietário do veículo ter a responsabilidade civil por quaisquer danos provocados pela sua utilização transferida para a mesma seguradora, por contrato de seguro titulado pela apólice nº 01296045.
*A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção, uma vez que o acidente foi exclusivamente provocado pela falecida, não se verificando qualquer conduta negligente por parte do condutor da viatura, sendo certo, por outro lado, que o autor AA garantia apenas a responsabilidade civil, não sendo terceiro no presente acidente.
*Verificou-se a intervenção principal espontânea dos Hospitais da Universidade de Coimbra, reclamando o pagamento da quantia de 6.247,99 euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação, referente à assistência prestada ao ofendido AA.
*A ré contestou a intervenção, dando por reproduzida a matéria constante da sua contestação, e defendendo a improcedência da acção.
*De seguida, foi designado o dia 17/01/2003 para a realização de uma audiência preliminar, nos termos do artº 508º-A do C.P.Civil.
Consta da respectiva acta, designadamente, que: pelo mandatário da ré foi dito que mantinha a alegação por si feita em sede de contestação, no sentido de que, no seu entender, o autor AA não se configura como terceiro no âmbito desta acção para efeitos de ser considerado como abrangido pelo âmbito do seguro automóvel; que pelos autores foi mantida a sua posição, já defendida na petição inicial; e que foi proferido despacho a considerar improcedente a excepção invocada pela ré na sua contestação, em virtude de o Sr. Juiz entender que não via razões para que o autor AA não fosse considerado terceiro para efeitos da Lei do Seguro.
Mais consta da aludida acta que, seguidamente, o Sr. Juiz pôs à consideração dos mandatários um projecto de selecção de matéria de facto assente e controvertida, previamente por si elaborado, para que a apreciassem e formulassem as suas reclamações e, porque não houve reclamações, procedeu-se à fixação da matéria de facto assente e a que deverá ser levada à base instrutória.
Com data de 27/01/2003 (fls. 154/157), apresentou a ré seguradora uma reclamação, alegando que deveria o Tribunal alterar o despacho saneador, no sentido de considerar que o proprietário do veículo, segurado e tomador do seguro, consubstanciado na Apólice junta aos autos, com o nº 1296045, não se encontra abrangido pelo seguro do veículo KK, interveniente no acidente que nos autos se discute.
Por despacho de 21/02/2003 (fls. 180/182), foi tal reclamação indeferida, por se entender, por um lado, que a reclamação deveria ter sido apresentada na audiência preliminar, e por outro lado, que o despacho apenas poderia ser impugnado por via de recurso e não de reclamação.
A ré interpôs recurso do despacho que indeferiu a reclamação, o qual foi recebido como agravo, a subir diferidamente, nos autos, e com efeito devolutivo.
Teve, depois, lugar o julgamento, com gravação da prova, e, decidida a matéria de facto controvertida, sem reclamações, foi proferida a sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar aos H.U.C. a quantia peticionada de 6.247,99 euros, e juros desde a citação, ao autor AA a quantia de 4.000.000$00 e juros desde a citação, e a todos os autores a quantia de 3.000.000$00 e juros desde a citação.
*Inconformados com a decisão, interpuseram, tanto a ré como as autoras DD e BB, recursos de apelação, sendo do seguinte teor as conclusões destes e do recurso de agravo.
Recurso de agravo: 1. O AA, proprietário, segurado, tomador do seguro não é nos termos da Lei, mormente dos artºs 2 da C.G.Apólice, “Terceiro”.
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O recorrido, AA, ferido do acidente que nos autos se discute, era, nos termos do contrato de seguro do veículo naquele interveniente, que tomou o nº 1296045 de apólice segurado, tomador do seguro e sujeito da relação jurídica na e com a ora recorrente.
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Não se coaduna, no seguro obrigatório de responsabilidade seguro automóvel, que o segurado possa, a qualquer título, também e ainda, ser “terceiro”, pessoa alheia a certo negócio jurídico, mas que, por se encontrar em relação jurídica, com um dos sujeitos daquele, tem, por via dessa relação jurídica, um direito que colide com o próprio acto jurídico (P. Cunha: Garantia das Obrigações) ou ainda, em relação a um contrato, é todo aquele que, por si, ou por intermédio de outrem, não participa na sua celebração. É todo o que não pode ser qualificado como parte (leite de campos, Seguro de responsabilidade Civil – 66).
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Os artºs 6º das C.G. Apólice tal como o artº 7º do Dec. Lei nº 522/85 de 31/12 mediante a epígrafe “Exclusões”, destinam-se a retirar da garantia do seguro os danos decorrente de lesões corporais e materiais sofridas por pessoas que à luz do artº 1º do citado Decreto-Lei poderiam possuir a qualidade de terceiros.
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A decisão recorrida viola, antes de mais, o próprio conceito de terceiro e, por tal facto, o conceito de segurado, na relação jurídica do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, mais violando, entre outros, os artºs 1º, 2º e 6º das C.G. Apólice e os artºs 1º e 7º do Dec.-Lei nº 522/85, de 31/12.
Recurso de apelação da ré: 1ª- A sentença apelada enferma das nulidades previstas nas als. b) e d) do artº 668º do Cód. Proc. Civil. Mas, 2ª- Mais violados se encontram os preceitos legais consagrados nos artºs 369º, 370º, nº 1, 371º, nº 1 do Cód. Civil e 544º, 546º, 653º...
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