Acórdão nº 3305/03 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2003 (caso NULL)
Magistrado Responsável | DR. RUI BARREIROS |
Data da Resolução | 16 de Dezembro de 2003 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra, no recurso de agravo nº 3305/03, vindo do Tribunal da Comarca de Ansião (arrolamento nº 52/03.1TBANS-A): I – Relatório.
1.1. Recorrente: Cristina Maria.
1.2. Recorrido: Carlos dos Santos .
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Objecto do recurso.
O presente recurso de agravo tem por objecto um despacho que declarou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide fls. 28.
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Enquadramento da pretensão da recorrente.
A recorrente requereu procedimento cautelar de arrolamento como preliminar de acção de divórcio. Instaurado este, os interessados acordaram em convolar a acção litigiosa em divórcio por mútuo consentimento, tendo, além do mais, relacionado os bens comuns do casal. Foi proferida a respectiva sentença homologatória.
No seguimento desta sentença, no procedimento cautelar, foi proferido o referido despacho a julgar extinta a instância por inutilidade superveniente.
A requerente do procedimento cautelar não se conformou com este despacho e interpôs recurso, que foi admitido como agravo, a subir imediatamente e com efeito suspensivo.
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Alegações.
4.1. Não obstante não ser necessário, a recorrente alegou factos integradores de receio de dissipação de bens por parte do requerido, o que não evitou que este tivesse citado.
4.2. Há bens comuns do casal que o requerido mantinha ocultos, pelo que a sua citação, antes do decretamento da providência, veio favorecer o requerido.
4.3. A relação de bens junta no processo de divórcio não tem ligação nem prejudica o arrolamento, porque o artigo 1419º do Código de Processo Civil sempre entrou em rota de colisão com o disposto no artigo 1.775º do Código Civil (antigo 1413º) e actual 427º do CPC.
4.4. O oferecimento de uma relação de bens comuns não torna inútil o arrolamento previsto no artigo 427º do CPC.
4.5. A recorrente não podia ser impedida de se divorciar por mútuo acordo pelo facto de desconhecer os bens que o requerido terá ocultado.
4.6. Assim participou na relacionação dos bens de que tinha conhecimento, mas tal não é determinante dos bens a partilhar.
Aponta como violadas as normas constantes dos artigos 287, al. e), 421º, 423º, 424º a 427º, 86, 1419º, nº 1,al. b), 1326º a 1405, todos do CPC e 1775, do CC.
II – Fundamentação.
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Os factos.
5.1. A recorrente requereu o arrolamento dos bens comuns do casal em 14 de Janeiro de 2003.
5.2. Os bens objecto do pedido de arrolamento são os indicados nos artigos 38º e 39º do requerimento, e os saldos de todas as contas bancárias, carteiras de título com cotação na Bolsa e outras aplicações existentes em qualquer instituição bancária, mormente as referidas no artigo 37º.
5.3. O requerido indicou como sendo do casal dois vídeos e uma máquina de lavar roupa (artigo 9º da oposição).
5.4. Entretanto, foi instaurado processo de divórcio litigioso nº 52/03.1TBANS.
no qual, em 6 de Março de 2003, recorrente e recorrido acordaram na conversão para divórcio por mútuo acordo.
5.5. Aí, relacionaram os bens constantes dos artigos 37º, 38, 39º do requerimento e 9º da oposição.
5.6. Em 17 de Março de 2003, no processo de arrolamento, foi proferido despacho a julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
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O Direito.
6.1. Nas suas alegações, a recorrente insurge-se contra o facto do requerido ter sido citado antes de decretado o arrolamento.
Contudo, tal despacho transitou em julgado, pelo que tal facto não pode ser objecto de conhecimento por este tribunal. Aliás, a requerente do arrolamento interpôs recurso da decisão de fls. 28, a que pôs termo ao processo e não da que mandou citar o requerido.
6.2. A razão de ser da decisão sob censura não está desenvolvida. No respectivo despacho, o MMº Juiz considerou que «o presente procedimento cautelar visava obter o arrolamento dos bens comuns do casal formado pela requerente e requerido e que «no decurso da tentativa de conciliação aqueles apresentaram já a relação dos bens comuns do casal», pelo que conclui: «atenta a natureza e o âmbito dos presentes autos, (que) se tornou inútil a sua continuação» fls. 28.
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6.3. A inutilidade superveniente da lide é a cessação da matéria da contenda cf. Professor Alberto dos Reis, Comentário ao Código de Processo Civil, Coimbra Editora, 1946, 3º vol., pág. 369.
. Verifica-se a inutilidade da lide quando a pretensão do autor deixou de se poder manter, ou porque desapareceram os sujeitos ou o objecto do processo ou ela foi satisfeita fora do esquema da providência pretendida Dr. José Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1999, vol. I, pág. 512.
. Na verdade, a relação processual tem como elementos os sujeitos - as partes ou os interessados - e o objecto - o pedido e a causa de pedir -. Se, depois de iniciada a instância, um destes elementos deixar de existir, a relação processual fica «desprovida de um dos seus elementos vitais, sucumbe, porque se tornou impossível, ou porque já é inútil a decisão final sobre a demanda» Dr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, vol. II, pág. 59.
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6.3.1. Ora, requerente e requerido continuam com a mesma posição que tinham no início, pelo que os sujeitos da relação processual se mantêm.
6.4. Então, ter-se-á pensado que o pedido estava já satisfeito: se se tinha vindo pedir a descrição (dos bens ou documentos), a avaliação (dos bens por avaliador) e o depósito (entrega ao depositário) artigo 424º.
, tudo isso tinha sido conseguido com a decisão espontânea e consensual que os interessados tiveram no processo de divórcio ao acordarem em entregar a relação dos seus bens e respectivos valores. Também se poderia admitir que a causa de pedir tinha desaparecido: se o requerido esteve de acordo em colaborar na indicação dos bens e valores, então deixou de se verificar o receio de extravio, ocultação ou dissipação.
6.5. Mas, não parece que seja assim. Nem do ponto de vista estritamente técnico-jurídico, nem do dinâmico, ou seja, do relacionamento...
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