Acórdão nº 3283/05 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 31 de Janeiro de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCARDOSO ALBUQUERQUE
Data da Resolução31 de Janeiro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível da Relação de Coimbra: I – O Digno Magistrado do Ministério Público intentou em 21 11/1996 e no âmbito da legitimidade que lhe assiste para defesa dos interesses dos compartes dos baldios, conferida pelo artº 4º,nº2 da Lei de Baldios em vigor (Lei nº 68/93 de 4/09, alterada pontualmente pela Lei nº 98/97 de 30/07) no tribunal supra identificado, a presente acção ordinária contra : 1 ) A...

2 ) B...

3) C...

4) D...

5) E...

6) F...

7 ) G...

8) H...

9) I...

10) J...

11) K... e mulher L...

12) M... e mulher N...

13) O... e mulher P...

14) Q... e mulher R...

15) S... e mulher Maria de Fátima da Costa Ferreira pedindo, a final, a condenação dos RR a : a) Ver declarada a nulidade da justificação notarial titulada pela escritura de 22/05/1996; b) Ver declarada a nulidade dos contratos de compra e venda celebrados entre a 1ª R e os RR O..., K..., H..., S..., Q..., I..., M... e “J...”; c) Ver declarada a nulidade da doação do prédio denominado “ Berganteiro Baixo “, feita pelo R I... a a favor do R H... ; d) Reconhecerem que os prédios são terrenos baldios e a abrir mãos dos mesmos a favor dos compartes do lugar de Mogueirães; e) Abster-se a 1ª R de praticar quaisquer actos materiais de apossamento ou outros que dificultem ou impeçam o uso e fruição de tais baldios pelos respectivos compartes; f) Ver cancelados o registo dos mesmos prédios no que respeita à titularidade a que se arrogam sobre eles.

Alega, em resumo, que em 22 de Agosto de 1995, foi celebrada uma escritura de justificação do direito de propriedade por posse usucapiente da autarquia mencionada (indevidamente identificada pelo respectivo órgão executivo, ou seja, a Junta da Freguesia de Cambra), e conforme declarações prestadas pelos 2º, 3º e 4º RR dos terrenos rústicos denominados “Vale de Abrosa de Baixo”, “Vales “, “Berganteiro “, Vale de Abrosa “, “Berganteiro de Baixo”, “Picoto”, “Lomba da Porqueira “, “Medeiro”, todos situados na dita freguesia e melhor identificados na p.i, tendo tais declarações sido confirmadas pelos RR E..., F... e G... (5, 6º e 7º RR) na qualidade de testemunhas.

Mais alega que no mesmo acto, os 2º, 3º e 4º RR sempre em representação da Junta de Freguesia e cada um dos RR O..., K... , H..., S..., I... , M... , Q... (13º, 8º,16º9º, 12ºe 14ºRR) e ainda U..., este na qualidade de sócio-gerente da R “J... “(10ª R) declararam vender e comprar aqueles prédios rústicos, tendo sido na base dessa escritura efectuado o registo das aquisições na Conservatória a favor dos RR O..., K... , H..., I..., M... e “J... “.

Posteriormente o R H... adquiriu por doação do R I..., o prédio “Berganteiro de Baixo “, com inscrição do respectivo direito a seu favor.

Acontece que contrariamente ao exarado em tal escritura , jamais a 1ª R os possuiu como proprietária, antes desde tempos mais recuados que os habitantes do lugar de Mougueirães têm tirado dos ditos terrenos todas as vantagens possíveis, pelas mais diversas formas, em conjunto e sem oposição, na convicção de estarem a usufruir de coisa que comunitariamente lhes pertence, com observância dos usos e costumes reconhecidos pela comunidade de que fazem parte e das comunidades vizinhas a que por direito histórico e até por usucapião constituindo baldios, sendo, pois, falso que a Junta exercesse quaisquer actos de posse como proprietária, o que é do conhecimento de todos eles.

E refere ainda que a escritura de justificação, bem como as subsequentes transmissões onerosas ou gratuitas dos prédios são nulas por incidirem sobre baldios, existindo desconformidade entre a sua titularidade registral e a real.

Citados, os 1º a 7º, 9º e 11 º s RR contestaram em conjunto, impugnando os factos alegados e sustentando que os prédios em causa sempre foram do domínio privado da autarquia, com dedução da factualidade pertinente com a sua aquisição por posse usucapiente e a presunção registral.

Disseram ainda que as escrituras foram sobejamente divulgadas e publicitadas por toda a região, bem como a pretensão da 1ª R em vender os terrenos, através da afixação de anúncios públicos nos locais adequados e de após a outorga das escrituras, ser o seu extracto publicado no jornal tendo decorrido o prazo legal de 30 dias para serem inscritos a favor dos adquirentes no registo os direitos derivados da compra `1ª R , concluindo pela sua absolvição .

Também a R “J... “(10 ª R) contestou, afirmando ter adquirido por arrematação em hasta pública o prédio denominado “Medeiro” e que pretendendo construir no local as suas instalações viu aprovada pela Câmara Municipal o seu projecto, tendo procedido a diversas benfeitorias e que sempre agiu de boa fé, pelo que mesmo que fosse verdade o que alega o A, se estaria perante um clamoroso abuso de direito, a impôr a sua absolvição do pedido.

E em reconvenção, pede que no caso da nulidade vir a ser declarada e não ser considerado o abuso do direito que por força da acessão industrial imobiliária, visto as benfeitorias terem o valor de 9.579.823$00 e o terreno tal como existia antes da incorporação das mesmas, não mais de 1.326.250$00 que se lhe reconheça o direito a fazer seu o prédio em causa.

Por seu turno os RR M... e mulher (12ºs RR) contestaram igualmente os factos articulados na petição e que sempre estiveram convictos que o prédio que adquiriram por compra era propriedade da autarquia, acrescentando que a venda foi publicitada pela 1ª R através de editais afixados em variados locais e que na arrematação em hasta pública foram cumpridas todas as formalidades e feitas as vendas em sessão aberta a toda a gente .

Mais alegam ter decorrido mais de um ano desde a data da escritura sem que alguma vez ela tivesse sido posta em causa e nem mesmo quando procederam a trabalhos de terraplanagem com vista à instalação de um estaleiro de materiais de construção civil, o que além do mais poderá configurar a iniciativa do Mº Público como um abuso de direito, a implicar a improcedência, mesmo que se viesse a provar a natureza de baldio dos terrenos .

Igualmente os RR O... e mulher(13º RR) contestaram nos mesmos termos dos anteriores e no que respeita ao prédio que adquiriram, concluindo pela improcedência.

Também o R H... e ímplicitamente, a da interveniente Caixa Inconformados, recorreram de apelação as RR A... e outros, J... e Caixa Geral de Depósitos, tendo apenas as duas últimas apresentado alegações na 1ª instância em que concluem nos seguintes termos: Apelação da R J...

1 – O princípio da boa fé, nos contratos e fora deles, aplica-se a todos os intervenientes, incluindo o Estado 2 – A interpretação da lei pode e deve fazer-se perspectivando não só o seu elemento literal, mas também aquilo que o legislador pretendia proteger com determinado preceito.

3 – È possível a uma entidade admnistrativa o não cumprimento de uma ordem quando em resultado desse mesmo cumprimento os prejuízos daí resultantes para si e para terceiros sejam manifestamente superiores aos que resultam desse mesmo cumprimento, tomando-se em consideração nesta área o interesse público como fim último a prevalecer .

4 – A recorrente é uma sociedade comercial que se dedica à produção de aves e que adquiriu um terreno para a construção de pavilhões, no âmbito da prossecução dessa sua actividade, à vista de de toda a gente, de forma publicamente publicitada antes e depois da escritura.

5 – Não devendo resultar dúvidas sobre a boa fé de actuação da sociedade ora recorrente aquando desta compra .

6 – E não milita em sentido contrário a esta boa fé o facto provado em 13. de que um dos seus sócios e gerentes ter conhecimento que o terreno era administrado pela A..., a vendedora .

7 – Não é legítimo pensar-se que um gerente deva ter conhecimento jurídico suficiente e capaz de discernir entre uma administração de um terreno e a possibilidade da sua propriedade ser de outrem por se tratar de uma simples administração, não compatível com a propriedade .

8 – A... recebeu o preço da aquisição realizada pela recorrente e utilizou essa verba em benefício da população em geral, como lhe compete .

9 – Na sequência da escritura, a recorrente pagou o preço à Junta de Freguesia, pagou os custos da escritura e da Conservatória, pagou a sisa, o licenciamento da construção e outras licenças.

10 – Foi devidamente licenciada para a construção, para a ligação eléctrica e para o específico fim a que se dedica.

11–Lidou desde o início com todas as entidades públicas competentes, sem qualquer restrição .

12 – Com a venda realizada à recorrente e com as demais, as entidades públicas e em particular a Junta receberam as contrapartidas devidas, tendo-as integrado na sua contabilidade e utilizado a favor de de todos.

13 – Sendo este interesse público que a lei pretende proteger com a legislação relativa aos baldios .

14 – A decisão do tribunal, ao decidir na simplicidade do preceito legal, é violadora das elementares regras de boa fé.

15 – Constituindo uma situação abusiva que o Mº Público, em representação dos interesses do Estado pretenda por esta via a aplicação da lei, literalmente quando um outro organismo do Estado beneficiou dessa mesma actuação e foi aliás quem a imaginou e levou à prática 16 – A improcedência da acção será, assim, um acto de justiça.

17 – A situação dos autos configura, assim, o instituto do abuso do direito.

18 – Pois o cumprimento da decisão sempre se revelará mais prejudicial para o Estado e para os cidadãos do que o seu não cumprimento.

19 – Devendo, assim, aferir-se a proporcionalidade entre o custo do cumprimento ou incumprimento, ponderados os benefícios e os prejuízos 20 – A ser levado ao extremo o decidido, a recorrente julga–se no direito de ser reembolsada pela Junta que lhe vendeu o terreno, do custo do mesmo bem como a indemnizá-la de todos os prejuízos causados.

21 – O que será insustentável para a autarquia e para os cidadãos 22–Tanto mais que todos os cidadãos, sem excepção e ainda que políticamente adversos, beneficiaram do encaixe financeiro realizado pela Junta.

23 – Deve...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT