Acórdão nº 3524/05 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Dezembro de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | GARCIA CALEJO |
Data da Resolução | 14 de Dezembro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I- Relatório: 1-1- A..., com sede na Estrada Nacional 109, Variante de Esgueira, Aveiro, propõe contra B..., com sede em Colosseum 1, 1213, Hilversum, Holanda, a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário, pedindo que se declare resolvido o contrato que menciona e que seja a R. condenada a pagar-lhe a quantia de Esc 37.538.264 a título de indemnização pelo incumprimento contratual e, efectuada a compensação com a obrigação da A., no valor de Esc 23.538.264$00 ( facturas não pagas, devidas pela A. à R. ), ser a mesma R. condenada a pagar-lhe a quantia de Esc 13.656.899$00, com juros legais desde a citação Fundamenta este seu pedido, em síntese, no facto de ter celebrado um contrato de natureza comercial com a R. ( contrato de distribuição a norte do Mondego, Madeira e Açores, de sapatos da marca “B...”, em regime de exclusividade ), em 15-9-1999, contrato que a R. não cumpriu.
1-2- Contestou a R., deduzindo reconvenção, sustentando, também em síntese, que entre as partes não foi celebrado o contrato que a A. indica, tendo sido apenas assumido um acordo para fornecimento de produtos que a R., mas nunca em regime de exclusividade. Foi a A. que, a partir de Setembro de 2000, deixou de pagar, atempadamente, as facturas vencidas, recusando-se também a restituir um desconto suplementar de 8% que por lapso constou de algumas facturas. A A. não pagou facturas no montante total de Esc 34.800.546$00 e daí a suspensão das relações por parte da R.
Termina pedindo a improcedência da acção e a procedência da reconvenção, solicitando a condenação da A. a pagar-lhe a quantia de Esc 34.800.549$00 ( com juros vencidos de Esc 1.743.344$00 ), correspondente à facturas não pagas, e os juros legais vencidos e vincendos desde 29-5-98, sobre este capital em divida.
1-3- A A. replicou, sustentando, também em resumo, que o contrato celebrado com a R. foi o indicado na p.i.. Além disso e quanto à reconvenção, refere que pagou parte das facturas indicadas pela R., pelo que não deve a totalidade do montante peticionado por esta.
1-4- Na tréplica e quanto ao pagamento de facturas indicadas pela A. na réplica, manteve a posição que assumiu na sua reconvenção.
1-5- O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido despacho saneador, fixado os factos assentes e a base instrutória, após o que se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu a esta base e se proferiu a sentença.
1-6- Nesta julgou-se a acção parcialmente procedente, por provada, a acção, condenado-se assim a R. a pagar à A. 34.915,85 euros e o que se liquidar em execução de sentença quanto aos demais danos por ela alegados. Mais se julgou parcialmente procedente, por provada, a reconvenção, condenado-se a A. a pagar à R. a quantia de 150.784,48 euros, acrescida de juros comerciais desde a citação, absolvendo-se a A. do demais peticionado.
1-7- Não se conformando com esta sentença, dela veio recorrer a R., recurso que foi admitido como apelação e com efeito devolutivo.
1-8- A recorrente alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões úteis: 1ª- Ainda que a relação entre as partes pudesse vir a ser considerado de contrato de distribuição, jamais poderia ser tido como sendo em regime de exclusividade, por evidente falta de formalismo, face ao disposto no art. 4º da Lei 178/86 de 3/7.
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- Da prova feita em julgamento, resultou claro que jamais foi celebrado entre as partes um contrato de distribuição.
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- À data dos factos, não era política da recorrente estabelecer distribuições para os seus produtos, uma vez que, como é reconhecido da decisão recorrida, a recorrente tinha uma rede própria de vendedores que cobrem cabalmente todo o território nacional ( ponto 32 dos factos provados ).
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- Seria, pelo menos improvável, que a relação negocial encetada pelas partes pudesse ser qualificada de distribuição.
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- Existindo uma sucessão de contratos de compra e venda e mesmo nesta envolvência negocial, foi a recorrida quem deixou de cumpriu atempadamente as suas obrigações, considerando a data de Setembro de 2000, como o início dos incumprimentos por parte dela.
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- Os atrasos referenciados protelaram-se por mais de 30 dias em alguns casos, havendo mesmos casos em que a recorrida não cumpriu.
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- Como agravante para a situação vivenciada entre as partes, a recorrida, quando interpelada para tal, recusou-se a devolver o desconto acrescido que sabia ter-lhe sido erradamente atribuído pela recorrente.
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- Da prova produzida, nomeadamente dos depoimentos dos comerciantes que foram ouvidos, é retirada a conclusão que a recorrente tolera, não se podendo legalmente opor, a algumas situações de revenda por parte dos seus clientes.
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- Não foi pela recorrente celebrado um contrato de distribuição, em nenhuma das suas vertentes doutrinariamente consideradas.
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- Da prova produzida resultou ser prática da recorrente atribuir descontos em função das encomendas que lhe são feitas, tendo inclusivamente padronizado os descontos a atribuir: 4%, 8% e, no máximo, 13%.
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- Não se entendendo assim porque motivo se arrogaria a recorrida a um desconto de 21% ( 13% + 8% ), superior ao atribuído à generalidade dos clientes da recorrente.
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- Bem sabia aliás a recorrida não haver justificação para o desconto acrescido.
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- Reconhece o Mº Juiz que a recorrida incumpriu o contrato que havia celebrado com a recorrente.
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- Em consequência e face à suma importância que o pontual pagamento na manutenção de qualquer relação comercial, impunha-se o Mº Juiz justificasse a cessação dos fornecimentos no primeiro incumprimento do pagamento de facturas vencidas pela recorrida.
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- Ou seja, o não fornecimento de bens pela recorrente, foi motivado pelo incumprimento da recorrida, o que é verdade como se demonstrou e foi reconhecido pelo Mº Juiz, tendo gerado inevitável desconfiança na recorrente.
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- Face à justificação dos fornecimentos não se percebe que seja a recorrente condenada ao pagamento de qualquer quantia a título de indemnização ou compensação.
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- Acresce que não logrou provar a recorrida que a recorrente deu causa, sugeriu ou motivou os investimentos levados a cabo pela recorrida, razão pela qual apenas a ela serão imputáveis.
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- Nem logrou provar a existência ou o quantum dos lucros cessantes que reclama.
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- Do mesmo modo que não foi feita prova pela recorrida, como lhe competia, quanto ao lucro que iria perceber com a venda de mercadorias cuja entrega a recorrente suspendeu, razão pela qual não deve o mesmo vir a ser fixado.
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- Como consequência, a sentença carece de fundamentação quanto à matéria de justificação da indemnização conferida.
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- Julgou mal o tribunal a quo ao dar provimento, ainda que parcialmente à acção.
Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, com revogação da decisão recorrida.
1-9- A parte contrária não respondeu a estas alegações.
Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.
II- Fundamentação: 2-1- Uma vez que o âmbito objectivos dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos apenas as questões que ali foram enunciadas ( arts. 690º nº1 e 684º nº 3 do C.P.Civil ).
2-2- Após a resposta à base instrutória, ficou assente a seguinte matéria de facto: 1. A A. dedica-se ao comércio de sapatos 2. A R. tem por objecto a distribuição e venda de artigos desportivos.
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A A. e a R. acordaram, pelo menos, no fornecimento de produtos por esta àquela, sendo que sobre as facturas emitidas pela R. tinha a A. um desconto de 13%.
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Para os pagamentos das referidas facturas teria a A., pelo menos, um prazo de 60 dias.
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A A. emitiu os anúncios constantes dos documentos de fls. 21 e 22.
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Por escritura pública celebrada em 22 de Maio de 2000, no Segundo Cartório Notarial de Aveiro, a A. procedeu à alteração do seu objecto social que passou a consistir no "comércio por grosso e a retalho de sapatos e afins".
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A partir de Julho de 2000 a R. passou a fazer à A. um desconto acrescido de 8%, pelo menos, nalgumas facturas, designadamente nas constantes dos documentos de fls. 65 a 67, 69 a 74.
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Pelo menos até finais de Setembro de 2000, os pagamentos efectuados pela A. foram atempadamente processados por depósito bancário na conta de que a R. é titular...
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