Acórdão nº 1976/04 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Setembro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelDR. JORGE ARCANJO
Data da Resolução28 de Setembro de 2004
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de CoimbraI – RELATÓRIO 1.1. - Os Autores – A... e marido B... – instauraram no Tribunal da Comarca de Leiria, acção declarativa, com forma de processo sumário, contra os Réus – C... e marido D....

Alegaram, em resumo: Os Autores são proprietários de um prédio urbano, confinante com um prédio urbano, de que a Autora e Ré são comproprietárias, ambos situados em Vigigal, freguesia de Pousos, Leiria.

Contra a vontade dos Autores, os Réus procederam a obras de inovação no prédio de que a Autora e Ré são comproprietárias que consistira, designadamente, na construção de uma parede encostada à moradia daqueles.

Esta parede tapou a janela da casa de banho, sita ao nível do rés-do-chão, chegando o tecto da construção inovada à base das janelas do primeiro andar, violando, assim, o direito de servidão de vistas, constituído por usucapião.

Em consequência da actuação dos Réus, sofreram danos patrimoniais e não patrimoniais.

Pediram cumulativamente a condenação dos Réus: a) - A demolir a construção inovada, nomeadamente a parede que encostaram à do prédio dos Autores, e a repor tudo como estava antes do início da obra; b) – A pagar aos AA quantia não inferior a 500.000$00, a título de danos não patrimoniais; c) – A pagar aos AA a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, correspondente a gastos feitos para consulta com o seu Advogado, telefonemas e honorários de Advogado e deslocações deste em serviço directo com o presente processo.

Contestaram os Réus, alegando, em síntese, inexistir qualquer compropriedade da Autora e Ré sobre o prédio urbano, não se verificando a servidão de vistas, por não ter decorrido o prazo legal da usucapião, sendo, por isso, lícitas as obras realizadas.

No saneador afirmou-se a validade e regularidade da instância.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, na parcial procedência da acção, decidiu: a) - Condenar os RR na demolição das paredes e da cobertura por si levantadas e que lhes permitiram cobrir com um só tecto os três anexos, - cozinha, quarto de banho e quarto – existentes no prédio sito em Vidigal de Baixo e inscrito na matriz urbana da freguesia dos Pousos sob o artigo 53, prédio este de que as litigantes mulheres são comproprietárias; b) - Condenar os RR. A pagarem aos AA. a quantia de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais causados pelas suas condutas; c) – Absolver os Réus do demais peticionado.

1.2. - Autores e Réus interpuseram recurso de apelação, mas o recurso dos Autores foi julgado deserto por falta de alegações.

Apelação dos Réus – conclusões: 1º) - O M.mo Juiz fez uma interpretação incorrecta das normas do Código Civil e Processo Civil, havendo graves contradições nas respostas aos quesitos.

  1. ) - Tendo em conta a matéria provada, o M.mo Juiz não devia ter condenado os apelantes na demolição das paredes e da cobertura por si levantadas e que lhes permitiram cobrir com um só tecto os três anexos – cozinha, quarto de banho e quarto – existentes no prédio dito em Vidigal Baixo e inscrito na matriz urbana da freguesia dos Pousos sob o artigo 53, prédio este que as litigantes mulheres são comproprietárias e, nem no pagamento aos Apelados da quantia de € 2.500,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais causados pelas suas condutas.

Contra alegaram os Autores sustentando a improcedência da apelação e requereram a condenação dos Apelantes como litigantes de má-fé em multa e numa indemnização, não inferior a € 2.500,00.

II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. - O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes ( arts.684 nº3 e 690 nº1 do CPC ), impondo-se decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, exceptuando-se aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras ( art.660 nº2 do CPC ).

Por seu turno, no nosso sistema processual civil, os recursos são meios para obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova.

Recurso de facto: A revisão do Código de Processo Civil, operada pelo DL 329-A/95 de 12/2, instituiu, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto.

Porém, o poder de cognição do Tribunal da Relação sobre a matéria de facto não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento de facto.

Desde logo, a possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados, com os pressupostos adrede estatuídos nos arts.690 nº1 e 690-A nº1 e 2 do CPC.

O art.690 nº1 do CPC impõe a obrigatoriedade do recorrente de formular conclusões, que delimitam o âmbito do recurso, sob pena do mesmo não ser conhecido.

Após o estabelecimento da gravação da prova e da consequente possibilidade da matéria de facto poder ser alterada em recurso ( art.712 do CPC ), foi acrescentado o art. 610-A do CPC, que determinou que, sob pena de rejeição, o recorrente que impugne aquela matéria deverá especificar os pontos concretos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados e os concretos meios probatórios que levam a decisão diversa da recorrida.

Tanto o argumento histórico, como o sistemático, impõem que tal especificação deverá obrigatoriamente constar das conclusões do recurso ( cf., por ex., Ac do STJ de 5/2/04 ( Bettencourt de Faria ), www dgsi.pt/jstj ).

Os Apelantes não impugnaram a decisão de facto na forma consentida pelos arts. 690 nº1 e art.690-A do CPC.

Ainda que nas alegações tenham procedido à transcrição dos depoimentos de determinadas testemunhas, o certo é que não especificaram os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, requisito indispensável para a apreciação do recurso de facto, tal como prescreve expressamente o nº1 a) do art.690-A do CPC ( “ deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição” ).

Não se trata sequer de mera deficiência, mas de total omissão sobre os pontos de facto nas conclusões, sendo certo que nem eles são ao menos perceptíveis e inteligíveis nas alegações.

A não satisfação deste ónus por parte dos apelantes implica a rejeição imediata do recurso, como resulta directamente da lei, pelo que nem sequer há lugar a convite prévio com vista a suprir tal omissão ( cf., AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3ª ed., pág.466, LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, pág.466, Ac do STJ de 20/3/03 ( Araújo de Barros ) e de 9/7/03 ( Neves Ribeiro ), www dgsi.pt/jstj ).

Por seu turno, é inócua a conclusão 1ª ao apontar “ graves contradições nas respostas aos quesitos “ (sic), pois nem sequer as referenciam, não passando de uma afirmação vaga, imprecisa e até irreflectida.

Em resumo, sendo de rejeitar o recurso de facto e não havendo que...

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