Acórdão nº 605/05-1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Maio de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | MARIA ASSUNÇÃO RAIMUNDO |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2005 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em audiência, os Juízes que compõem Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: No processo comum nº … a correr termos no 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de …, foi julgado A, pela prática de um crime de homicídio qualificado, sob a forma tentada, previsto e punido pelos artigos 131º, 132º, nº 1 e nº 2, alínea a) e d), 22º, 23º, 72º e 73º do Código Penal.
Proferido acórdão, veio o mesmo a ser condenado pela prática do referido crime ( homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131º, 132º, nº 1 e nº 2, alínea a), 22º, 23º, 72º e 73º do Código Penal ) na pena de quatro anos de prisão.
Desta acórdão interpôs o arguido recurso, concluindo: 1ª O tribunal "a quo", na apreciação final da prova, nomeadamente no ponto d), pagina 10 do Acórdão, defende que "As palavras, porém, atribuídas ao arguido, dizendo que ia deitar-se ao mar, denotam profunda mortificação, explicativa do seu desesperado acto, praticado na pessoa do seu pai." 2a Mais adiante, no ponto 5.a. dos "factores a ponderar", o douto acórdão, refere que "Relativamente, pois, aos sentimentos manifestados na prática do ilícito, pode concluir-se com segurança que o arguido foi movido pelo desespero." 3a E no ponto 6. que "Numa palavra, não houve motivo fútil ou prazer em matar. Houve um acto tresloucado, seguido, minutos depois, daquilo que o artigo 72°, nº2, al. c) do Código Penal designa por "actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente."- Sic.
4a Tal como referido supra, na apreciação da prova o douto acórdão recorrido, entendeu que As, palavras, porém, atribuídas ao arguido, dizendo que ia deitar-se ao mar, denotam profunda mortificação, explicativa do seu desesperado acto, praticado na pessoa do seu pai." 5ª Ou seja, o tribunal ficou convencido que se tratou de um "acto desesperado" que denota "profunda mortificação".
6a Dispõe o artigo 133° do Código Penal que "Quem matar outra pessoa dominado por (. .. ) desespero ou ( ... ), que diminuam sensivelmente a sua culpa, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. " 7a "Desespero é o estado de alma em que se encontra quem já perdeu a esperança na obtenção de um bem desejado, de quem enfrenta uma grande contrariedade ou uma situação insuportável, enfim quem está sob a influência de um estado de aflição, desânimo, desalento, angústia ou ânsia.
Ora, é evidente que quem se mantém sob tal influência e pratica um homicídio age sob o domínio do circunstancialismo angustiante em que se acha envolvido." - anotação ao artigo 133°, in Código Penal Anotado da autoria de Manuel Leal- Henriques e Manuel Simas Santos, 3a Edição, 2° Volume, Parte Especial.
8ª Se atentarmos na análise da prova levada a cabo pelo tribunal "a quo", mostra-se patente que os factos praticados pelo arguido, foram determinados pelo desespero, e por um estado de profunda mortificação.
Pelo que, 9ª Com todo o respeito por melhor opinião, entendemos que a sua conduta se enquadra no tipo p. e p. pelo supra citado artigo 133° do Código Penal- homicídio privilegiado - e não no tipo p. e p. pelos artigos 131 ° e 132° deste mesmo compêndio legal.
À CAUTELA, CASO ASSIM SE NÃO DECIDA 10a. - O tribunal "a quo" condenou o arguido como autor de um crime doloso tentado de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131°, 132°, n° 1 e 2, aI. a) do Código Penal.
11ª O tribunal "a quo" qualificou o homicídio tentado, pelo facto de a vítima ser pai do agente - cfr. al. a) do n° 2 do artigo 132° do C.P ..
12a Nas referências doutrinárias ao artigo 132°, os Senhores Doutores Manuel Leal-Henriques e Manuel Simas Santos, defendem que "( ... ) a definição do tipo se concentre no n° 1, não sendo o n° 2 mais do que uma mera lista de exemplos ou indícios que poderão eventualmente realizar esse mesmo tipo} sem excluir, portanto, a possibilidade de vir a ser completada por outras mais situações que revelem especial censurabilidade ou perversidade caracterizada no tipo." - idem ob. Cit.
13a Donde se diga, com Margarida da Silva Ferreira, que "quem preenche uma das alíneas do artigo 132°, não entra automaticamente no âmbito da norma", só o entrando quando, sujeito ao "crivo normativo" do n° 1, se ajuíze que "há mesmo uma culpa especial" (Direito penal II - Os homicídios, 40 e 41)." - Idem ob. Cit.; 14a Os exemplos constantes do n° 2 do artigo 132°, "são sintomaticamente susceptíveis de preencher esse mesmo tipo (exemplos possíveis) e que constituem meros indicadores ou referenciais, não levando, só por si, à qualificação do facto, obrigando, pois, ao apuramento, no caso concreto, sobre se o índice em causa tem virtualidade de revelar força que justifique a tal qualificação (repare-se que a lei fala em "é susceptível"). Idem ob. cit.; 15a "E as (palavras) de FERNANDA PALMA (O homicídio no Novo Código Penal Português, Ver. Min. Público, 4°, n° 15,54): « a verificação por si das circunstâncias não preenche necessariamente o tipo, porque nem sempre elas transportam aquele valor negativo que o legislador considerou susceptível de revelar especial censurabilidade ou perversidade. Assim, é sempre conceptível um parricídio praticado por motivos de relevante valor social ou moral ou por quem esteja dominado por compreensível emoção violenta (art° 133°) ( .. ), isto é, em circunstâncias que justifiquem a atenuação e não a agravação da responsabilidade. - idem ob. Cit.; Ora, 16a Da matéria dada como provada pelo tribunal "a quo" não resultaram provados quaisquer factos indiciadores ou susceptíveis de revelar a "especial censurabilidade ou perversidade" exigida pelo n° 1 do artigo 132°, e que constitui condição "sine quo non" para a qualificação do tipo. Pelo que, 17a É patente que a conduta do arguido não se integra no disposto no artigo 132° do Código Penal, por não se encontrarem provados quaisquer factos "susceptíveis de revelar especial censurabilidade ou perversidade", andando mal, a nosso ver, o tribunal recorrido, ao qualificar o tipo com base na al. a) do n° 2 do mesmo preceito legal, quando não se mostra preenchido o n° 1 do mesmo artigo.
Logo, 18ª Entende o Recorrente que há insuficiência para decisão da matéria de facto provada.
À cautela, Caso assim se não entenda, 19a Ao arguido foi aplicada a pena de 4 (quatro) anos de prisão, pela prática em autoria de um crime tentado de homicídio qualificado, numa moldura penal abstracta que varia entre os 2 anos, 4 meses e 24 dias até aos 16 anos e 8 meses.
20a Ou seja, o tribunal "a quo" entendeu não dever aproximar a pena do seu mínimo legal, que seriam os 2 anos, 4 meses e 24 dias, justificando que "O intuito é advertir o arguido de modo veemente, levá-lo a reflectir e impor-lhe um modo de expiação que lhe permita alcançar a plena medida da censurabilidade do seu acto - e isto levando em conta. que nem se ponderou o seu grau de perigosidade, por parecer em seu abono, ocioso." - pág. 14 do Acórdão.
21ª Entende o Recorrente que, face à matéria dada como provada, sobretudo no que respeita à sua conduta anterior - sempre foi um bom filho - e após os factos em apreço nestes autos - o seu estado de aflição que o levou a pedir ajuda para o seu pai - à sua personalidade, que revela tratar-se de um jovem de natureza sensível, com formação musical de nível superior, 22a bem como face ao facto de na apreciação da prova o tribunal recorrido ter ficado convencido de que o recorrente foi movido pelo desespero, 23a deveria este tribunal ter aplicado a pena mínima (2 anos, 4 meses e 24 dias), suspendendo-a na sua execução ao abrigo do disposto no artigo 50° do C.Penal, por se revelar a mais adequada e ajustada atendendo às circunstâncias supra descritas; Assim, 24a Pela errada interpretação e aplicação que deles fez, o dou to acórdão recorrido, violou, entre outras as disposições legais contidas nos artigos 14°, 22°, 24°, 40°, 50º 70°, 71°, 72°, 131º, 132° e 133° todos do Código Penal e artigo 369° do C.P.P.
Nestes termos, e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá o douto acórdão ser revogado, e substituído por outro que altere o enquadramento jurídico-penal para o tipo p. e p. pelo artigo 1330 do Código Penal, com as legais consequências daí advindas, ou, caso assim se não entenda, que...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO