Acórdão nº 56/05-3 de Tribunal da Relação de Évora, 05 de Maio de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelRUI VOUGA
Data da Resolução05 de Maio de 2005
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, na Secção Cível da Relação de ÉVORA: ANTONIO……….. demandou JOÃO…………, pedindo a denúncia de contrato de arrendamento habitacional existente entre ambos e que tem por objecto a fracção designada pela letra "AR", correspondente ao 8º andar direito do prédio sito na Rua Tratado de Tordesilhas, nº 8, em …………..

Alegou, para tanto, que necessita do locado, pois vive em local ermo e de acesso difícil da Serra da …….. e sofre de doença do foro cardiológico e de natureza crónica, necessitando de residir junto do hospital onde é assistido, em ………..

O Réu contestou, por excepção e por impugnação.

Defendendo-se por excepção, arguiu a sua ilegitimidade (por estar desacompanhado na lide do seu cônjuge, apesar de a acção ter por objecto a casa de morada da família) e deduziu a excepção peremptória inominada consistente na circunstância de ele próprio sofrer de incapacidade total para o trabalho (cfr. o art. 107.°, n.° 1, al. a), do RAU).

Defendendo-se por impugnação, negou a invocada necessidade de o A. vir residir para Setúbal, tanto mais que vem insistindo com o R. para este adquirir o locado, alegando para tanto dificuldades económicas.

O Autor respondeu à matéria das excepções deduzidas pelo R.

Findos os articulados, foi ordenada a intervenção principal provocada da mulher do R., Maria Helena ………….., a qual, citada, nada disse.

No despacho saneador, depois de verificada a existencia dos pressupostos processuais necessarios, relegou-se para final o conhecimento da excepção peremptória fundada no cit. art. 107.°, n.° 1, al. a) do RAU.

Organizada a base instrutória, instruído o processo com a prova requerida pelas partes e discutida a causa em audiência de julgamento, veio a ser proferida (em 23/4/2004) sentença que julgou a acção improcedente, tendo absolvido o R. e a interveniente principal MARIA HELENA do pedido deduzido pelo Autor.

Inconformado com o assim decidido, o Autor interpôs recurso de Apelação da referida sentença, tendo finalizado as alegações que apresentou com as seguintes conclusões: "

  1. A sentença recorrida dá como provado que o Réu sofre de incapacidade total para o trabalho.

  2. Ora as testemunhas do Réu não responderam à questão no sentido daí se retirar que o Réu sofre de incapacidade total para o trabalho.

  3. Por outro lado uma incapacidade parcial, total ou absoluta par o trabalho deve ser provada mediante atestado emitido pela Autoridade de Saúde competente, nos termos do n°.s 2 e 4 do artigo 4° do Dec. Lei 202/96, de 23 de Outubro, na redacção do Decreto-Lei n.° 174/1997, de 19 de Julho.

  4. Com efeito, feito um exame médico, o presidente da junta médica passará o respectivo atestado médico de incapacidade."(n°.

    2 do artigo 4°) e) E "sempre que a lei faça depender a atribuição de beneficios de determinados requisitos específicos, o atestado médico de incapacidade deve indicar o fim a que se destina e respectivos efeitos e condições legais " (n°.

    4 do art°. 4°).

  5. A teleologia da Lei é impedir as constantes fraudes e nos presentes autos estamos perante uma fraude, já que o Réu trabalha na sua própria empresa de confecções: - a "PIONEIRO - Confeccoes, Lda.

    ", onde é sócio-gerente (ver certidão comercial anexa).

  6. A falta de atestado emitido pela entidade competente torna o facto "o Réu sofre de incapacidade total para o trabalho" como não existente.

  7. Devia o Tribunal "a quo " exigir ao Réu o respectivo atestado e não existindo este dar como não provada a falta de incapacidade total para o trabalho.

  8. Por outro lado, as considerações expedidas na sentença (em III - O Direito) são divagações de natureza sócio-cultural, parte delas sem fundamento nos factos e na experiência da vida.

  9. Não se provou que o Autor viveu toda a sua vida no meio rural, não se provou que para o Autor, a cidade, seja um meio que lhe é totalmente estranho.

  10. O Autor veio dizer ao Tribunal que sofre de doença do foro cardiológico, que foi operado de urgência ao coração em 2003, que está sob vigilância médica, que tem de se deslocar mensalmente ao Hospital para regulação de hemoglobina, que tem 66 anos, que cada dia que passa o Autor teme pela sua vida, que tem medo que lhe aconteça nova recaída e de não ser transportado ao Hospital em tempo útil, que reside na Serra da ………., sendo o local ermo e de acesso difícil...

    1) Estes os factos, provados quase na sua totalidade, que fundamentam a necessidade do locado para habitação o Autor.

  11. Desvalorizou ainda o Tribunal "a quo" as razões do Autor, invocando que este sofre do coração desde 1990 e que foi neste ano de 1990 que deu de arrendamento o locado ao Réu.

  12. Em 1990 o Autor já era doente cardíaco, mas não poderia então prever que a sua doença evoluísse, como aconteceu, ao ponto de ter necessidade de ser operado ao coração em 2003.

  13. Devia o Tribunal "a quo" não ter dado como provado que o Réu sofre de incapacidade total para o trabalho, por falta de atestado bastante emitido pela competente Autoridade nos termos do Dec. Lei 202/96, de 23 de Outubro e declarar que se verifica a necessidade do locado para habitação do Autor e em consequência declarar a caducidade do contrato para o termo invocado, ordenando o despejo.

  14. Não o fazendo o Tribunal "a quo" violou as normas dos n°.s 2 e 4 do artigo 4° do Dec. Lei 202/96 de 23 de Outubro e artigo 364° n°. 1 do CCivil, e artigo 69°, n°. 1 al. a), artigos 70°, 71° e 107° do RAU".

    O Réu ora Apelado não apresentou contra-alegações.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    MATÉRIA DE FACTO

    1. Factos Considerados Provados na 1ª Instância: O tribunal a quo considerou provados (por documentos dotados de força probatória plena nos termos dos arts. 371º, nº 1, 374º, nº 1, e 376º, nºs 1 e 2, todos do Código Civil, por acordo das partes nos termos do art. 490º, nº 2, do C.P.C. e em face das respostas por ele próprio dadas à Base instrutória, após a audiência de julgamento nos termos dos arts. 653º, nº 2, e 791º, nº 3, do C.P.C.) os seguintes factos: 1) - Por escritura de 11.10.1990, o A., solteiro, e Alcídia ……., divorciada, adquiriram a fracção autónoma designada pelas letras "AR", correspondente ao 8.° andar direito, do prédio sito na Rua Tratado de Tordesilhas, n.° 8, em ………., e descrito na 2.a CRP sob o n.° 00501/210286, inscrição essa que foi levada a registo pela inscrição G-1, ap. 20/180690; (al. A) da matéria assente por documentos dotados de força probatória plena) 2) - Em princípios de 1990, o A. deu de arrendamento a identificada fracção ao R. marido, mediante acordo verbal, para habitação permanente deste, e pela renda mensal de 60.000$00, actualmente fixada em € 323,00; (al. B) da matéria assente por acordo das partes) 3) - O A. e companheira residem em Casais da Serra, Vila ………….; (al. C) da matéria assente por acordo das partes) 4) - A residência do A. situa-se numa aldeia na Serra da ………., denominada Casais da Serra, a qual dista cerca de 20 Kms. do Hospital de S. Bernardo, em ……….; (resposta ao Quesito 4º da Base Instrutória) 5) - O local onde o A. reside confina com via pública; (Quesito 9º da Base Instrutória) 6) - Na propriedade onde o A. reside, existe um restaurante; (Quesito 12º da Base Instrutória) 7) - O A. dispõe de veículo automóvel, que utiliza para se deslocar diariamente; (Quesito 11º da Base Instrutória) - O A. sofre de doença do foro cardiológico, de natureza crónica, pelo menos desde 1990; (resposta ao Quesito 1º da Base Instrutória) 7) - Por volta das 13h 24m do dia 1 de Fevereiro de 2003, o A. deu entrada no Serviço de Urgência do Hospital de São Bernardo, onde foi operado de urgência ao coração; (Quesito 2º da Base Instrutória) 8) - Actualmente, o A. está sob vigilância médica, deslocando-se mensalmente ao Hospital de São Bernardo, para observação e regulação da hemoglobina; (Quesito 3º da Base Instrutória) 9) - Em caso de recaída do A., e dado o local onde este habita, poderá demorar cerca de 45 minutos entre chamar uma ambulância e chegar ao Hospital de S. Bernardo, em …….; (resposta ao Quesito 5º da Base Instrutória) 10) - Não existe em Azeitão e proximidades, um hospital com serviços de cardiologia; (Quesito 7º da Base Instrutória) 11) - O A. nasceu a 15.01.1937; (cfr. o documento junto na audiência de julgamento) 12) - O A. não tem em Setúbal qualquer outra habitação, para além da fracção referida em A) da Matéria Assente; (resposta ao Quesito 8º da Base Instrutória) 13) - O A. propôs ao R. a aquisição por este do locado, há cerca de quatro anos; (resposta ao Quesito 13º da Base Instrutória) 14) - O R. marido nasceu a 8 de Junho de 1941. (al. D) da matéria assente por documentos dotados de força probatória plena) 15) - O R. marido sofre de incapacidade total para o trabalho; (Quesito 14º da Base Instrutória) 16) - Ao R. foi atribuída uma pensão de invalidez, com inicio em Julho de 1997, pela qual recebe, actualmente, € 660,47 mensais. (cfr. documento junto pelo R. na audiência de julgamento) O OBJECTO DO RECURSO Como se sabe, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintéctica, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2] . Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º) [3] [4] .

    Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso.

    No caso sub judice, emerge das conclusões da alegação de recurso apresentada pelo Autor ora Apelante que o...

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