Acórdão nº 2415/04-1 de Tribunal da Relação de Évora, 18 de Janeiro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelALBERTO BORGES
Data da Resolução18 de Janeiro de 2005
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de ..(1.º Juízo) correu termos o Proc. n.º…, no qual foi julgado procedente (por sentença de…) o recurso interposto pelo arguido A, melhor identificado na sentença de fol.ªs 277 a 290, e absolvido o arguido da contra-ordenação pela qual havia sido condenado pelo Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (INFARMED), ou seja, a contra-ordenação p. e p. pelos art.ºs 2 al.ª a) e 4 do DL 72/91, de 8.02, na redacção dada pelo DL 272/95, de 23.10, e 242/2000, de 26.09, e art.º 92 n.º 1 al.ª a) do mesmo diploma e 3 n.º 1 do DL 101/94, de 19.04, conjugado com o art.º 92 n.º 1 al.ª f) do DL 72/91, de 8.02, pela qual havia sido condenado na coima de 3.950 euros.

  1. Inconformado com tal decisão, recorreu o Ministério Público, concluindo, em síntese, nas suas alegações de recurso: a) A noção de medicamento, para os efeitos previstos na legislação e jurisprudência comunitárias sobre medicamentos (nomeadamente a partir da Directiva 65/65/CEE ou, hoje, do art.º 1 da Directiva 2001/83, de 6 de Novembro de 2001) deve ser interpretada como abrangendo medicamentos que: - se apresentem como possuindo propriedades preventivas ou curativas de afecções humanas ou animais; - possam ser administrados ao Homem ou a outros animais para estabelecer um diagnóstico médico ou para intervir sobre as respectivas funções fisiológicas.

    b) Nela se incluem produtos que, pela sua apresentação, possam induzir os consumidores a utilizá-los no lugar e em vez dos remédios adequados, sendo que a apresentação como medicamento pode deduzir-se, entre outros factores, da forma utilizada, do acondicionamento, do folheto informativo, de afirmações que pretendam conferir-lhes dignidade científica ou, mesmo, de recomendações por parte de médicos ou farmacêuticos.

    c) A alínea a) do DL 72/91, de 8 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pelo DL 242/2000, de 26 de Setembro, considera "Medicamento: toda a substância ou composição que possua propriedades curativas ou preventivas das doenças e dos seus sintomas, do homem ou do animal, com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou modificar as suas funções".

    d) O citado preceito tem, naturalmente, de ser interpretado à luz do direito e da jurisprudência comunitários, em obediência ao primado do direito comunitário consagrado nos art.ºs 7 e 8 n.ºs 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa.

    e) O Mm.º Juiz "a quo" fez errada caracterização dos produtos apreendidos à ordem dos autos, porque, como se vê da respectiva rotulagem e, nalguns casos, dos seus folhetos informativos, todos eles são apresentados como possuindo "propriedades curativas ou preventivas das doenças e dos seus sintomas, do homem ou do animal, com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou modificar as suas funções". Facto que, aliás, é reconhecido nesse despacho.

    f) Por isso, os produtos em causa enquadram-se no conceito de medicamento, sendo certo que, para que esteja abrangido pelo regime jurídico dos medicamentos, basta que o produto "apareça aos olhos de um consumidor médio, mesmo que de maneira implícita, mas certa - considerando a sua apresentação - como tendo um efeito como o descrito na primeira definição comunitária".

    g) Pelo que, ao entender diferentemente, o Mm.º Juiz "a quo", no douto despacho recorrido, violou o disposto na citada al.ª a) do artigo 2 do DL 72/91, de 8.02, bem como o disposto no n.º 2 do art.º 1 da citada Directiva 2001/83/CE e a pertinente jurisprudência comunitária citada nesta peça processual.

    h) Apesar de reconhecer a existência de referências a propriedades terapêuticas, o despacho recorrido entende erradamente que tais referências não são suficientes para os considerar como medicamentos, porque, na sua opinião, "a mera referência a indicação terapêutica não é suficiente para qualificar um qualquer produto como medicamento". Tal entendimento é manifestamente contrário ao estabelecido na legislação comunitária e nacional em vigor e da jurisprudência firmada a nível comunitário, já invocadas na presente peça processual.

    i) O mesmo despacho considera, erradamente, que os produtos em causa "não se destinam, «prima facie», à cura ou alívio de doenças, como se de medicamentos se tratasse, mas destinam-se a suprir carências que a alimentação moderna apresenta, em termos de nutrientes, minerais e compostos vegetais e animais". Porém, basta analisar os referidos produtos para extrair a conclusão oposta, visto que, por um lado, os mesmos são primacialmente destinados ao tratamento (sic) e prevenção de determinadas doenças (algumas bastante graves) e, por outro, os mesmos não incluem nutrientes, na acepção da al.ª b) do artigo 3 do DL 136/2003.

    j) Não colhe a alegação de que os produtos apreendidos são suplementos alimentares (art.º 3 al.ª a) do DL 136/2003), porque, para que os produtos em causa possam ser qualificados como suplementos alimentares é necessário que os mesmos sejam vitaminas ou minerais (al.ª b) do mesmo artigo). Porém, compulsada a matéria de facto considerada provada, dela não resulta que qualquer dos indiciados produtos integre na sua composição qualquer vitamina ou mineral.

    k) Pelo que, ao concluir que tais produtos são suplementos alimentares, o douto despacho recorrido violou o disposto nas al.ªs a) e b) do artigo 3 do citado DL 136/2003, de 28.06, e a al.ª a) do art.º 2 do DL 72/91, de 8.02.

    l) O DL 136/2003, de 28.06, "não se aplica aos medicamentos, tal como definidos no DL 72/91, de 8.02, com a redacção que lhe foi dada pelo DL 242/2000, de 26.09, relativo aos medicamentos para uso humano" (n.º 2 do artigo 1.º), sendo que "a rotulagem, apresentação e publicidade dos suplementos alimentares não pode incluir menções que (...) atribuam aos mesmos propriedades profilácticas, de tratamento ou curativas de doenças humanas, nem fazer referência a essas propriedades" (art.º 7 al.ª a)).

    m) Os produtos apreendidos enquadram-se na definição de medicamento consagrada na al.ª a) do art.º 2 do DL 72/91, pelo que a aplicação do DL 136/2003 fica automaticamente afastada pelo n.º 2 do art.º 1 deste diploma, sendo que o despacho recorrido reconhece que os produtos em causa fazem "referência a certas propriedades terapêuticas". Tal facto afasta-os igualmente da sua qualificação como suplementos alimentares.

    n) Ao decidir diferentemente, o Mm.º Juiz "a quo", no douto despacho recorrido, violou os citados n.º 2 do art.º 1 e al.ª a) do art.º 7 do DL 136/2003 e a al.ª a) do art.º 2 do DL 72/91.

    o) Face à jurisprudência comunitária invocada nesta peça processual, o despacho recorrido qualificou erradamente como produtos cosméticos e de higiene corporal os produtos referidos sob os n.ºs 22 e 27 da factualidade dada como provada, porque deveria tê-los qualificado como medicamentos. Mas mesmo que assim não fosse, sempre tal qualificação estaria errada, porque apenas assentou nas forma farmacêuticas - spray e creme - de cada um deles...

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