Acórdão nº 54/2006-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelANA BRITO
Data da Resolução18 de Maio de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)
  1. No Proc. (de inquérito) Nº 482/04.1TABCL do TCIC, vieram A1, A2, B1, B2, B3, C, D., E., F., F1, G., H., I. e J. recorrer do despacho do Mmo JIC que julgou extemporâneas as irregularidades por estes arguidas, indeferiu as nulidades pelos mesmos invocadas, ambas respeitantes a BUSCAS efectuadas, e determinou a aplicação de taxa de justiça em 3 UCs,.

    Apresentaram as seguintes conclusões: "No âmbito da invocação de irregularidades ao abrigo do Art. 123.º do CPP, a expressão "acto a que o interessado assista", não pode referir-se sem mais ao materialmente visado pelo acto pretensamente irregular; Tal expressão antes deve reportar-se à pessoa escolhida pelo visado ou designada pela autoridade judiciária para o representar processualmente; Mesmo admitindo a interpretação constante da conclusão 1) supra, o Meritíssimo Juiz não pode rejeitar a arguição de irregularidade que não foi feita no acto, sem cuidar de apurar a cognoscibilidade de tal irregularidade por parte do visado; Subsidiariamente, sempre se dirá que as pessoas que se encontravam nos locais buscados e que assinaram os autos respectivos não representavam as entidades visadas nas buscas não podendo, consequentemente, arguir em nome destas as irregularidades que foram sendo cometidas. Este é o caso das seguintes sociedades: A2.; B1; C.; B2.; A1.

    É inconstitucional, por violação do Art. 32.º da Constituição, a norma do Art. 123.º do CPP quando aplicada e interpretada no sentido de que a irregularidade deve ser arguida no acto pelo interessado que a ele assista, independentemente de se apurar da cognoscibilidade do vício pelo arguido, agindo com a diligência devida; No que a este particular concerne, a decisão recorrida violou o Art. 123.º do CPP e, bem assim, o Art. 32.º da CRP, aplicável directamente por força do Art. 18.º da mesma Lei fundamental.

    Por força do Art. 296.º do Código Civil, é aplicável à contagem dos prazos em processo penal, designadamente, os prazos constantes dos Arts. 123.º n. 1 e 107.º n.º 5 do CPP, as regras constantes do Art. 279.º do Código Civil.

    Nos termos da alínea e) deste dispositivo, o prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; No caso em apreço, tendo o prazo a que alude o n.º 1 do Art. 123.º do CPP terminado no Domingo, dia 23 de Novembro de 2005, por força da alínea e) do Art. 279.º do Código Civil, deve ter-se por transferido para segunda feira, dia 24 de Novembro de 2005; Nesta conformidade e ainda no caso em apreço, o terceiro dia de multa a que alude o n.º 5 do Art. 107.º do CPP, terminou no dia 27 de Novembro de 2005 e não no dia 26 do mesmo mês e ano, como se sustenta na decisão recorrida; A decisão recorrida viola o disposto nos Arts.296.º e 279.º do Código Civil e Art. 107.º n.º 5 do Código de Processo Penal; Do exposto nas conclusões 1 a 10, resulta que no caso em apreço a arguição das irregularidades foi tempestiva; A apreensão, como meio de obtenção e conservação de prova que é, pressupõe a prévia análise do documento ou objecto apreendido com vista a averiguar a susceptibilidade do mesmo servir os propósitos probatórios da investigação; Particularmente no que tange à apreensão em estabelecimentos bancários e escritórios de Advogados, compete exclusivamente ao Juiz de Instrução proceder à indagação da pertinência da apreensão e a sua subsequente determinação, nos termos previstos nos Arts. 181.º, n.º 1 e 180.º n.º 1 do CPP, respectivamente; O regime legalmente instituído, pressupõe um critério de utilidade do objecto para efeitos probatórios que terá de ser sufragado pela autoridade no momento anterior à decisão de apreensão; O despacho recorrido, ao confessar que o critério que presidiu às buscas realizadas foi o de encontrar documentos e objectos relacionados com alegados esquemas de fraude fiscal, de circulação de meios financeiros e de ocultação de patrimónios e que, após conjugação do material probatório com outros elementos de prova se restituíram aos buscados os documentos ou objectos que se revelem inúteis, configura, ao arrepio da Lei e das garantias constitucionais, o instituto da apreensão como um meio de investigação e não como um meio de obtenção e conservação de material probatório; Esta visão da apreensão como meio de investigação perpassa, transversalmente, todo o despacho recorrido, contagiando a totalidade das apreensões efectuadas aos Recorrentes; Neste particular, o despacho recorrido violou os Arts. 178.º, 181.º, n.º 1 e 180.º n.º 1 do CPP; São inconstitucionais, por violação dos Arts. 32.º e 18.º da Constituição, os Artigos 178.º, 181.º, n.º 1 e 180.º n.º 1 do CPP, quando, como no caso em apreço, são aplicados e interpretados no sentido que a apreensão pode ser usada como um meio de investigação criminal e que o juízo relativo à decisão de apreensão não tem de ser realizado em momento lógica e cronologicamente anterior a esta; Não basta a existência nos autos de um despacho devidamente fundamentado para se considerar que foi dado cumprimento ao dever de fundamentação da decisão judicial que ordenou as buscas e as apreensões; Para que tal circunstância ocorra, necessário é que tal despacho seja entregue aos visados em momento anterior às referidas buscas e apreensões; No caso em apreço, o despacho truncado que foi entregue aos visados pelas buscas e apreensões, não contém os elementos necessários à sindicância da pertinência e/ou legalidade das diligências em causa, violando o dispostos nos arts. 94.º, 176.º, 179.º do CPP; A notificação ordenada no despacho recorrido, no sentido de ser entregue aos visados o despacho completo de fls. 3481 e segs, porque feita à posteriori, não represtina a legalidade de acto cuja irregularidade havia sido já suscitada; A prolação de despacho no decurso de buscas determinando a realização de outras buscas a entidades distintas, deve ser notificada aos novos visados, em obediência ao preceituado no art. 176.º do CPP.

    Os despachos de fls. 4313 e 4288 ordenando a realização de buscas nas instalações das sociedades B1., B2, B3., não foi objecto de notificação aos visados; Tal omissão constitui irregularidade que foi oportunamente arguida e que determina a invalidade das buscas e apreensões efectuadas relativamente a tais entidades; A possibilidade de apreensão de documentos de terceiro constante do art. 181.º n.º 1 do CPP, pressupõe que tais terceiros ou que tais documentos se relacionem com a prática do crime; Para que se possa sindicar a legalidade da apreensão de documentos de terceiros, deve a relação entre os terceiros e os factos em investigação ser expressa e justificada em sede de auto de apreensão; No caso em apreço, não se mostra tão pouco cumprida a formalidade prevista no n.º 2 do art. 183.º do CPP, irregularidade essa oportunamente arguida; Relativamente aos autos que foram efectivamente entregues e quando em causa estão documentos de terceiros, não se mostra que nos mesmos haja sido justificada ou explicitada a relação dos terceiros com os factos em investigação; É o caso, designadamente, da busca levada a cabo no prédio sito na Av. António Augusto de Aguiar n.º 132, onde no sexto piso foi aprendido um servidor da propriedade da B2 contendo uma pasta de nome "Group" dentro da qual se encontrava um "directório de empresas" onde se continha informação relativa a 200 empresas, sendo que o Despacho de fls. 3481 e o respectivo auto de apreensão, é omisso quanto à relação de tais empresas com os crimes em investigação e quanto à relevância dos documentos apreendidos para a descoberta da verdade ou para a prova desta.

    A irregularidade em causa foi oportunamente suscitada, pelo que o despacho recorrido violou igualmente os Arts. 181.º e 183.º do CPP; O indeferimento das nulidades e irregularidades suscitadas pelos Recorrentes no tocante às buscas realizadas à sociedade E.. com instalações na Av. …, n.º 5, em Lisboa, estriba-se nos mandados de fls. 4245 e auto de fls. 4246; Tal mandado e auto, todavia, reportam-se à busca que decorreu na Av. … n.º 132 respeitante ao A2. e B1; A busca e apreensão na R.… n.º 5 não pode ser considerada uma parte da busca e apreensão da Av. ….; A referida busca não foi ordenada por despacho judicial, não foi objecto de mandado de busca e apreensão e nem sequer foi presidida por Juiz de Instrução Criminal, nem autorizada ou presidida pelo Ministério Público, pelo que esta é irregular porque não autorizada, devendo ser invalidada bem como todos os actos subsequentes que desta dependam, nos termos do disposto no Art. 123.º do Código de Processo Penal; Os documentos e objectos apreendidos na busca identificada na conclusão anterior encontram-se afectados da nulidade probatória prevista no n.º 3 do Art. 126.º, do CPP e nos n.º 8 do Art. 32.º e n.º 4 do Art. 34.º da Constituição da República Portuguesa; Ao contrário do que é sustentado no despacho recorrido, não há uma diminuição de exigências garantísticas entre correspondência fechada e correspondência aberta; As diferenças de tratamento jurídico entre a correspondência aberta e a correspondência fechada observam-se no seguinte aspecto: é que, enquanto em relação à correspondência aberta, o juiz que autorizou ou ordenou as apreensões pode e deve fazer previamente uma valoração crítica da documentação apreendida no sentido de avaliar a relevância do seu conteúdo para a prova do crime; em relação à segunda, essa valoração crítica só pode ser posterior à apreensão, devendo o juiz formular de seguida um juízo positivo ou negativo sobre a sua importância probatória e decidir imediatamente a sua retenção ou devolução ao respectivo titular; No respeitante à correspondência fechada, a Constituição e a lei só autorizam a sua retenção após uma avaliação da relevância do seu conteúdo para a prova; em relação à correspondência aberta os direitos ao sigilo e à sua inviolabilidade obrigam o juiz a indagar primeiro dessa relevância antes da apreensão; A apreensão de documentação retirada de arquivos de...

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