Acórdão nº 7342/2001-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERREIRA MARQUES
Data da Resolução26 de Maio de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO (A), solteiro, advogado residente em Lisboa, instaurou acção declarativa, com processo ordinário, emergente de contrato individual de trabalho, contra Estado Português, pedindo que se declare que ambos estiveram vinculados por um contrato individual de trabalho sem prazo, a que o Estado pôs termo, através de um despedimento ilícito e que, em consequência, este seja condenado: a) No pagamento das retribuições que deixou de auferir desde data desse despedimento até efectiva execução de sentença, acrescidas dos juros legais; b) No pagamento de subsídios de Natal e de férias e na indemnização pela não permissão do gozo de férias no período de vigência do contrato, no valor de esc. 8.036.668$00, acrescidos de juros de mora legais até efectiva execução da sentença; c) No pagamento da quantia de esc. 9.667$00, respeitante a parte da retribuição do mês de Novembro de 1994, acrescida de juros de mora legais até efectiva execução de sentença; d) Na sua reintegração sem prejuízo da sua categoria ou antiguidade e, alternativamente, e só no caso de aquela ser materialmente inexequível, na indemnização de antiguidade prevista no art. 13º, n.º 3 da LCCT; E, se se concluir que o contrato de trabalho é nulo, pediu em alternativa que o R. seja condenado no peticionado nas alíneas a), b) e c) e na indemnização prevista no art. 13º, n.º 3 da LCCT e ainda nas indemnizações referidas nos artigos 223º e 224º da petição inicial.

Alegou para tanto e em síntese o seguinte: O A. e o R. outorgaram, em 6/9/94, um contrato que foi designado de "Contrato de Avença", embora o seu clausulado tenha resultado não da negociação entre as partes, mas sim por imposição da DGV; A prestação de trabalho do A. realizava-se obrigatoriamente nas instalações da DGV, aí elaborando propostas de decisão nos autos de contra-ordenação resultantes de infracções ao Direito Estradal, mediante utilização obrigatória de um sistema informático denominado "SIGA", obedecendo a concretizações da DGV que o obrigavam à preparação da formulação de decisões jus-administrativas contra a sua vontade e autonomia técnico-administrativa e científicas, tudo segundo instruções precisas que se reportavam à medida das coimas e das sanções acessórias aplicáveis e à qualificação das infracções praticadas, bem como ao fundamento de todas; O A. prestou à DGV uma actividade - o trabalho - e não apenas o resultado ou produto deste, durante mais de 3 anos e aquela fez acreditar o A. de que o iria integrar nos serviços da função pública, o que nunca fez; Em 18/11/97, a DGV notificou pessoalmente o A. da rescisão unilateral do contrato; Tal despedimento não foi precedido de processo disciplinar e foi efectuado de forma dolosa, constituindo-se o R. na obrigação de indemnizar o A. pelos prejuízos e danos causados pela situação laboral ilícita em que esteve envolvido, bem como das actividades que teve de abandonar para se dedicar ao trabalho na DGV.

O R. contestou a acção, alegando em resumo o seguinte: O contrato celebrado entre autor e réu foi executado, de facto, como de prestação de serviços; Se, todavia, se entender que na prática tal contrato foi celebrado como contrato de trabalho subordinado, então o mesmo deve considerar-se nulo, já que a relação jurídica de emprego na Administração Pública apenas se pode constituir por nomeação e por contrato de pessoal e este só pode revestir as formas de contrato administrativo de provimento e de contrato de trabalho a termo certo; Apenas a nomeação dá origem a uma relação de emprego na Administração Pública com carácter duradoiro; Mesmo que se entenda que foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo, nunca o mesmo se podia transformar em contrato de trabalho sem termo, uma vez que a lei não admite tal tipo de contrato na Administração Pública; Tal contrato teria, assim, de se considerar nulo, nos termos do art. 294º do CC e como tal, apenas produziria efeitos como se fosse válido em relação ao tempo em que esteve em execução, nos termos do art. 15º da LCT, pelo que a rescisão do mesmo nunca poderia configurar um despedimento; O A. e o R. quando celebraram o contrato de avença tinham plena consciência de que haviam celebrado um contrato de avença, sabendo o autor, enquanto advogado, das obrigações e direitos que do mesmo lhe advinham; O A. tinha poderes e autonomia para propor e proceder a uma apreciação jurídica, propondo o que entendesse, segundo as normas aplicáveis ao caso concreto, não havendo qualquer fiscalização por parte da DGV; O R. cumpriu sempre pontualmente tal contrato e denunciou-o com a antecedência acordada, pelo que o A. não tem direito a nenhuma das prestações peticionadas.

Concluiu pedindo que se vingar a tese do contrato de trabalho, deve ser julgada procedente a excepção da nulidade desse contrato e o R. absolvido no pedido, excepto quanto à parte confessada; se vingar a tese do contrato de prestação de serviços deve a acção ser julgada improcedente e o R. absolvido dos pedidos.

O A. respondeu à matéria da excepção, tendo concluído pela sua improcedência.

Após a prolação do despacho saneador, especificação e questionário, o A. apresentou os seus meios de prova, tendo requerido o depoimento de parte do R. a prestar pelo Director Geral e Subdirector Geral de Viação, que foi indeferido por estes não serem partes nesta acção (cfr. despacho de fls. 445).

Irresignado, o A. interpôs recurso de agravo do referido despacho, no qual formulou as seguintes conclusões: 1ª) - O Estado é parte na presente acção; 2ª) - O Director-Geral de Viação e qualquer dos seus quatros Subdirectores-Gerais são órgãos daquele, vinculando-o no seu todo e também ao nível do Ministério da Administração Interna, no qual se integra, com a categoria de serviço a Direcção Geral de Viação; 3ª) - Tais personalidades singulares tomam competente e dependentemente decisões e só elas conhecem da matéria sobre a qual foi requerido o depoimento de parte, através de desconcentração e delegação de poderes conferidas por lei e em nome da pessoa colectiva Estado Português, R. na presente acção; 4ª) - Em consequência, o Governo (colectiva ou singularmente), o Ministério da Administração Interna, bem como o seu Secretário de Estado, carecem de qualidade jurídica - rectius, legitimidade - para deporem de parte no presente processo; 5ª) - Tal como o ilustre Procurador Adjunto junto do Tribunal a quo, que é mandatário judicial do R., logo seu representante processual; 6ª) - Ao não se admitir os requeridos depoimentos de parte do Director Geral de Viação e de um dos seus Subdirectores-gerais, esvaziam-se de conteúdo e de efeito útil as estatuições constantes dos arts. 28º, 519º e 553º, respectivamente, do Cód. Proc. Trabalho e Cód. Proc. Civil.

Terminou pedindo a revogação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que admita os depoimentos requeridos.

O Estado, na sua contra-alegação, pugnou pela manutenção do despacho impugnado.

O despacho recorrido foi mantido na íntegra pelo M.mo juiz a quo e o agravo foi admitido por este com subida deferida.

Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou o R. a pagar ao A. quantia de esc. 3.850.001$00, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, sobre as quantias parcelares respectivas, desde as datas dos respectivos vencimentos até integral pagamento.

Inconformado, o A. veio interpor recurso de apelação da referida sentença, tendo sintetizado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1ª) - A matéria dada como provada na douta sentença - ponto VII da mesma - não resulta que A. e R. tenham celebrado um contrato de trabalho a termo, porque as funções e actividades prestadas pelo 1º ao 2º não se inscrevem nas condições taxativamente previstas no art. 18º do DL 427/89, de 7/12; 2ª) - Mesmo que se propenda por tal qualificação para o contrato, este excedeu, em razão das sucessivas renovações que por escrito nele e automaticamente operaram, o prazo máximo permitido pelo art. 20º do DL 427/89, de 7/12, razão porque se não pode considerar que sendo a termo e à luz do mencionado normativo legal, as partes lhe apuseram um termo resolutivo, nos termos do art. 278º do Cód. Civil, e justamente porque excedeu aquele prazo máximo legalmente previsto. Neste sentido o douto aresto desta Relação de 20/3/96, CJ 1996, 2º, 168, no qual: "verifica-se nulidade de estipulação do termo quando se prova não ter havido concordância entre o declarado no documento e a realidade"; 3ª) - Razão porque nestes dois pontos 1) e 2) parece ter havido excesso de pronúncia da douta sentença sob impetração, e para os efeitos do art. 668º n.º 1 al. d) do CPC, aplicável ex vi art. 72º do CPT; 4ª) - Se esta Relação entender dever manter a qualificação que para o contrato do A. lhe foi conferida pelo tribunal a quo, então parece dever ter de decretar a nulidade do mesmo, nos termos dos arts. 280º e 294º do CC, porque celebrado contra as disposições constantes dos arts. 18º e 20º do DL 427/89, de 7/12 e do Ac. n.º 368/00 de 30/11, do Tribunal Constitucional. E até à declaração de tal nulidade - que não tendo sido prevista na douta sentença, a esta confere omissão de pronúncia, nos termos e para os efeitos do art. 668º, n.º 1 al. d) do CPC - o contrato manterá todos os seus efeitos nos termos do art. 15º do DL 49.408, de 24/11, de 1969, aplicável ao caso dos autos ex vi arts. 14º, n.º 3 do DL 427/89, de 7/12 e 1º do DL 64-A/89, de 27/2, com as legais consequências como as peticionadas para o efeito pelo autor; 5ª) - E porque "indexados" àquela nulidade os pedidos indemnizatórios do A. constantes de arts. 191º a 224º da p.i. deverá esta instância apreciá-los, maxime, o por danos morais, porquanto lhe subjaz matéria que o justifica e fundamenta, nomeadamente, a dada como provada a fls. 493, sobretudo pontos 25 a 28; 6ª) - Mesmo que assim se não entenda tal indemnização por danos não patrimoniais, deverá ser conferida...

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