Acórdão nº 1430/2004-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 19 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMÃO QUELHAS
Data da Resolução19 de Maio de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa I - Relatório (A) intentou no Tribunal do Trabalho de Lisboa, acção de impugnação judicial de despedimento com processo ordinário, contra BPI, S.A., pedindo que seja declarado ilícito o despedimento e que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia de escudos 6.405.389$00, ou, alternativamente, a quantia de 764.506$00 e respectiva reintegração e ainda, em qualquer caso, a pagar-lhe indemnização por danos morais no valor de 300.000$00, bem como o pagamento de todas as quantias que se vierem a vencer na pendência da acção até à respectiva sentença, incluindo juros à taxa legal, sem prejuízo dos montantes a liquidar em execução de sentença.

Requereu ainda a concessão do benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa total do pagamento de preparos e custas.

Alegou, em síntese: foi admitida ao serviço do ex-Banco Fonsecas & Burnay, S.A., actualmente BPI, S.A., em 22 de Setembro de 1980, por contrato de trabalho por tempo indeterminado, exercendo inicialmente as funções administrativas, com a categoria profissional de "Empregada de Carteira", Grupo I, nível 3 do ACTV para o Sector Bancário, tendo passado, a partir de 30/11/1992, a exercer as funções de chefia como responsável pelo BFB-Directo, actualmente, BPI-Directo, com a categoria profissional de empregada Grupo I-Nível 10.

O "BPI-Directo" é um serviço de informação e venda de produtos e serviços bancários, via telefone, visando proporcionar aos clientes um acesso cómodo, rápido e em horário alargado, a informações e aos serviços disponibilizados pelo Banco BPI.

No exercício das referidas funções, coordenava a actividade de 31 operadores, que constituíam as várias equipas de atendimento telefónico de clientes, nas quais se incluem 3 supervisores, incumbindo-lhe, designadamente : - acompanhar as tarefas realizadas pelos operadores, assegurando que as informações prestadas por estes aos clientes eram fiáveis e rigorosas e esclarecendo as dúvidas eventualmente surgidas; - acompanhar as execuções das operações bancárias ordenadas pelos clientes; - avaliar o desempenho dos operadores aos mais diversos níveis, como seja, a qualidade de atendimento, o rigor das informações prestadas e a qualidade dos serviços prestados aos clientes; - coordenar as campanhas promocionais desenvolvidas pelo Banco através do "BPI-Directo", como seja, campanha de crédito à habitação, campanha de crédito automóvel, marcação dos horários de trabalho dos operadores e respectivos turnos bem como dos supervisores; - avaliação das necessidades de formação dos operadores e supervisores e consequentes propostas de realização de acções formativas; - tratamento e encaminhamento de reclamações feitas por clientes.

No dia 19 de Março de 1999, foi informada pelos seus superiores hierárquicos, Drª (B) e Dr. (C), de que teria praticado actos susceptíveis de constituir ilícito disciplinar.

No dia 22 de Março de 1999 a R. instaurou um inquérito preliminar efectuado pela Direcção de Auditoria e Inspecção aos Serviços Centrais Estrangeiro e Participadas - DAISP, inquérito que foi remetido no dia 21 de Abril de 1999 ao Conselho de Administração do BPI.

No dia 23 de Junho de 1999 foi notificada da instauração de processo disciplinar com vista ao seu despedimento de acordo com a deliberação do Conselho de Administração do aqui requerido, datada de 28 de Maio de 1999, tendo-lhe sido enviada a nota de culpa.

No dia 16 de Junho de 1999 foi impedida de exercer as funções que vinha desempenhando, tendo sido incumbida de proceder ao arquivo de documentos nos processos individuais dos trabalhadores da R., ficando numa situação altamente desprestigiante e vexatória, causadora de graves danos morais.

Respondeu à nota de culpa, mas o processo disciplinar veio a ser concluído com o seu despedimento não obstante a preclusão do exercício da acção disciplinar em virtude de terem decorrido mais de 30 dias entre a conclusão do inquérito preliminar e seu envio ao Conselho de Administração, em 21 de Abril de 1999, e a notificação da nota de culpa, em 23 de Junho de 1999.

No que respeita às infracções imputadas, invoca a dupla qualidade de trabalhadora e de cliente do R., negando que tenha utilizado de forma abusiva e indevida a faculdade de movimentar contas no âmbito do serviço BPI - Directo, dando origem a situações de descoberto não autorizado e, por outro lado, não procedeu a transferências, a crédito e a débito, para as contas de várias empregadas que desempenham funções no BPI-Directo sem instruções escritas das respectivas titulares.

Citada em 18 de Janeiro de 2000, a Ré contestou, alegando, em síntese, que: a A. utilizou de forma abusiva e indevida a faculdade de movimentar contas no âmbito do serviço BPI - Directo, dando ordens de compra de títulos sem que tivesse saldo suficiente na sua conta de depósito à ordem, o que conduziu em 17 de Setembro de 1998, 11 de Novembro de 1998 e 15 de Março de 1999, a situações de descoberto não autorizado, sendo certo que apenas dispunha de um limite de crédito de conta-ordenado de 210.000$00; a gestora de conta não tinha poderes para autorizar saldos a descoberto; as ordens de compra em bolsa, desde que comunicadas ao balcão, são sempre cativas; o BPI - Directo não tinha poderes de crédito e tais descobertos resultaram de ordens dadas pela A. à Bolsa para compra de acções da Portugal Telecom, Imparsa e Telecel, sem que o saldo da sua conta de depósito à ordem fosse suficiente e se encontrasse cativo para suportar as respectivas despesas, tendo-se mantido os saldos devedores por um dia até efectiva regularização, o que prejudicou de forma definitiva a confiança que devia subjazer à relação laboral; durante o primeiro trimestre de 1999, a A. efectuou várias transferências de valores que oscilam entre os 4 e os 110 contos, a crédito e a débito, de e para as contas das empregadas (D), (E) e (F), que também desempenham funções no BPI-Directo e do seu próprio filho, (G), todos clientes do BPI-Directo, actuação que é deontologicamente incorrecta, potenciando eventuais responsabilidades do Banco, em caso de litígio ou contestação dos movimentos efectuados; a transferência da A. para a Direcção de Recursos Humanos nada tem de humilhante por se tratar de trabalho que é feito indistintamente por qualquer empregado, incluindo a coordenadora da Área Administrativa de Pessoal, quando tal se torna necessário; não ocorreu a preclusão do exercício da acção disciplinar, uma vez que a entidade com competência disciplinar jamais mandou instaurar qualquer processo prévio de inquérito e o Conselho de Administração apenas teve conhecimento da infracção em 28 de Maio de 1999, quando apreciou o Processo de Averiguação nº 23/S/99 da Direcção de Auditoria e Inspecção.

A A. ampliou o pedido, pedindo a condenação da R. em multa e indemnização como litigante de má-fé, alegando que o descoberto de 15 de Março de 1999 não decorreu de facto que lhe fosse imputável mas de deficiente funcionamento da R., a qual creditou a conta da A. pela importância de 52.927$00 por não ter executado a ordem de venda de 60 acções da Telecel dada pela A. em 10 de Março de 1999.

A R. respondeu, concluindo pela sua improcedência.

Concedido à A. o benefício do apoio judiciário na modalidade requerida, a fls. 93 vº 94 do apenso de procedimento cautelar de suspensão de despedimento, foi proferido saneador, relegando-se para final o conhecimento da excepção de caducidade da acção disciplinar e fixando-se a matéria de facto assente e a base instrutória, após reclamações de A. e R.

A A. agravou da decisão que relegou para final o conhecimento da excepção de caducidade da acção disciplinar, requerendo a subida imediata nos próprios autos, não tendo tal recurso sido admitido.

Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais, em várias sessões, tendo na última sido decidida, sem reclamações, a matéria de facto levada à base instrutória.

Conclusos os autos, o M.mº Juiz proferiu sentença escrita, julgando a acção improcedente, por não provada, absolvendo a R. dos pedidos formulados.

Inconformada com a sentença, a A. apresentou recurso de apelação, com alegações e as seguintes conclusões: (...) A R.contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso e que a sentença deve ser confirmada.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

A questão a decidir, é a de saber, se os comportamentos da ora Apelante, enquanto ao serviço da R., constituem, ou não constituem, justa causa de despedimento; neste último caso, haverá ilicitude do despedimento, pelo que há que determinar as respectivas consequências legais.

II - Fundamentos de facto Estão provados os seguintes factos: A. (A) foi admitida ao serviço do ex-Banco Fonsecas & Burnay, S.A., actualmente BPI, S.A., em 22 de Setembro de 1980, por contrato de trabalho por tempo indeterminado, exercendo inicialmente as funções administrativas, com a categoria profissional de "Empregada de Carteira", Grupo I, nível 3 do ACTV para o Sector Bancário.

B. A partir de 30/11/1992, passou a exercer as funções de chefia como responsável pelo BFB-Directo, actualmente, BPI-Directo, com a categoria profissional de empregada Grupo I-Nível 10 (doc.fls.44).

C. O "BPI-Directo" é um serviço de informação e venda de produtos e serviços bancários, via telefone, visando proporcionar aos clientes um acesso cómodo, rápido e em horário alargado, a informações e aos serviços disponibilizados pelo Banco BPI, possuindo as demais características e regras de funcionamento que constam da nota interna do Banco junta como doc.nº2; D. No exercício das referidas funções, a A. coordenava a actividade de 31 operadores, que constituíam as várias equipas de atendimento telefónico de clientes, nas quais se incluem 3 supervisores.

E. Incumbindo-lhe, designadamente: - acompanhar as tarefas realizadas pelos operadores, assegurando que as informações prestadas por estes aos clientes eram fiáveis e rigorosas e esclarecendo as dúvidas...

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