Acórdão nº 872/2006-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 03 de Maio de 2006

Magistrado ResponsávelISABEL TAPADINHAS
Data da Resolução03 de Maio de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório ( .... ) Fundamentação de direito Face ao disposto no art. 710º do Cód. Proc. Civil há que começar por apreciar a apelação interposta pelo autor, pois o agravo interposto pela ré só será apreciado se a sentença não for confirmada (nº 1) e só será provido se a infracção cometida tiver influído no exame ou decisão da causa ou se, independentemente da decisão do litígio, o provimento tiver interesse para a agravante (nº 2).

Como se disse a única questão a resolver na apelação interposta pelo autor consiste em saber se a conduta deste justifica a sanção disciplinar de despedimento com justa causa que lhe foi aplicada.

Uma vez que a relação laboral cessou no dia 30 de Outubro de 2001, ao caso não é aplicável Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto apenas entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2003 - art. 8º nº 1 e 3º nº 1 da lei preambular - mas o regime pré-vigente a que nos vamos referir.

O nº 1 do art. 9º do Regime Jurídico de Cessação do Contrato Individual de Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro (RJCCIT também conhecido por LCCT), dá-nos a noção de justa causa como sendo o comportamento do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

Deste modo para a existência de justa causa de despedimento é necessária a verificação cumulativa de um requisito de natureza subjectiva traduzido num comportamento culposo do trabalhador, pressupondo uma acção ou omissão imputável ao trabalhador a título de culpa e violadora dos deveres emergentes do vínculo contratual a que o trabalhador, como tal, está sujeito e cuja observância é requerida pelo cumprimento da actividade a que se obrigou ou pela disciplina da organização em que essa actividade se realiza, outro de natureza objectiva, traduzido na impossibilidade da subsistência da relação de trabalho e, ainda, a existência de nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade de subsistência da relação laboral.

Sendo o despedimento a mais grave das sanções, para que o comportamento do trabalhador integre a justa causa é ainda necessário que esse comportamento seja grave em si mesmo e nas suas consequências e essa gravidade não pode aferir-se em função do critério subjectivo do empregador, devendo ser apreciadas de acordo com o entendimento de um empregador normal, em face do caso concreto, atendendo-se a critérios de objectividade e de razoabilidade, considerando a natureza da relação laboral, o grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, o carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes - art. 12º, nº 5 do RJCCIT -, existindo justa causa de despedimento quando se verifica a impossibilidade prática da subsistência da relação laboral ou seja quando o estado de premência do despedimento deve ser julgado mais importante do que os interesses opostos na permanência do contrato de trabalho e dos deveres emergentes do vínculo laboral, o que sucede sempre que a ruptura da relação laboral seja irremediável, por não existir nenhuma outra sanção susceptível de sanar a crise contratual aberta com aquele comportamento culposo do trabalhador.

Aquela impossibilidade prática, leva-nos para o campo da inexigibilidade, a determinar através do balanço, em conflito, dos interesses em presença - o da urgência da desvinculação e o da conservação do contrato de trabalho - e envolve um juízo de prognose sobre a viabilidade da relação laboral, a realizar segundo um padrão essencialmente psicológico - o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, que implica frequentes e intensos contactos entre os sujeitos.

Assim, existirá impossibilidade prática de subsistência da relação laboral sempre que, nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais, que ele importa, sejam de forma a ferir, de modo exagerado e violento, a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal, colocada na posição do empregador, ou seja, sempre que a continuidade do vínculo represente uma insuportável e injusta imposição ao empregador (Monteiro Fernandes, "Direito do Trabalho, 8ª edição, págs. 461 e segs., Menezes Cordeiro, "Manual do Direito do Trabalho", 1997, págs. 822 e segs., Lobo Xavier, "Curso de Direito de Trabalho" págs. 488 e segs., Jorge Leite e Coutinho de Almeida, "Colectânea de Leis do Trabalho", 1985, págs. 249 e segs., Motta Veiga, "Direito do Trabalho", II, págs. 128 e segs. e Ac. do STJ de 05.02.97, CJ/STJ, Ano V, T. 1, pág. 275 e jurisprudência aí citadas).

Colhidos estes ensinamentos, vejamos, agora, a que conclusão nos conduzem os factos provados.

Ficou provado que em duas situações, ocorridas, uma no dia 3 de Julho de 2001 e outra no dia 2 de Agosto de 2001, os montantes constantes da caixa do apelante à hora de almoço não coincidiam, como deviam mercê do procedimento descrito na alínea f), com os valores constantes na folha de caixa produzida informaticamente - alíneas j) e l).

Resultou, igualmente, provado que fim do dia 3 de Julho de 2001, no fecho da caixa do apelante, o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT