Acórdão nº 10700/2003-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Fevereiro de 2004

Magistrado ResponsávelVARGES GOMES
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2004
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam em conferência neste Tribunal da Relação de Lisboa 1- Por douta sentença proferida nos autos n.º 407/00 do Tribunal Criminal de Lisboa, foi o arguido (R) condenado em duas penas de 90 dias de multa, à razão diária de 2 euros, pela prática de um crime de sequestro p.p. no art.º 158º n.º 1, e de um crime de coacção p.p. no art.º 154º n.ºs 1 e 2, ambos do CP, em cúmulo das quais resultou a sua condenação na "pena única de 120 (cento e vinte) dias de multa, à razão diária de 2 euros, o que perfaz a multa global de 240 (duzentos e quarenta) euros ou, em alternativa, 80 (oitenta) dias de prisão".

1.1- Da mesma interpõe agora o presente recurso (...) 1.2- Sem qualquer conclusão, respondeu o Digno Magistrado do MºPº opinando pela não provimento do recurso, devendo ser "confirmada a douta sentença".

2- Já neste Tribunal da Relação o Il. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual conclui pela sua rejeição "por ser manifesta a falta de fundamentação e manifesta a sua improcedência - art.ºs 419º n.º 4 al. a) e 420º n.º 1 al. a) do CPP".

2.1- Cumprido que foi o disposto no art.º 417º n.º 2 do CPP respondeu o Recorrente - com alguma ironia e acinte, cremos que algo desnecessários - não ver "que as conclusões do recurso tenham ficado, sequer, beliscadas", ali concluindo "como na motivação".

2.2- Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre então decidir.

Fundamentação 3- Em longas, mas doutas, considerações de vinte páginas, expõe o Recorrente a sua motivação de recurso, cujo objecto, face às conclusões apresentadas, sintetizamos, nas seguintes vertentes : - A relativa à lei processual aplicável nos autos, em especial no respeitante ao art.º 333º do CPP, que entende dever ser aplicado na redacção dada pela Lei 59/98, de 25/08, e não na actualmente em vigor - decorrente do Dec.Lei 320-C/00, de 15/12 - sob pena de inconstitucionalidade ; - A não fundamentação relativamente ao despacho que dispensou a presença do arguido/recorrente da audiência de julgamento, bem como a não adopção das medidas necessárias e legalmente admissíveis para assegurar a sua comparência ; - Conclui também que os factos provados não permitem a condenação quer pelo crime de sequestro, quer de coacção na forma tentada ; - Finalmente e ainda, pela impossibilidade de uma criteriosa aplicação do disposto no art.º 72º n.º 2 do CP em matéria de aplicação da pena ; Apreciemos pois cada uma delas.

  1. A lei processual penal aplicável 1- "Tempus regit actus", é este o princípio omnipresente, simultaneamente velho (1) e actual, nesta matéria.

    Pese embora a extrema simplicidade da sua enunciação, não deixará de reconhecer-se que a "velocidade" dos nossos "tempos", também no campo da legiferação, vem exigindo do intérprete e do aplicador do direito cada vez mais e melhor atenção nesta matéria, face aos múltiplos, novos/velhos, problemas e questões que a mesma suscita.

    A "regra geral", ensina o Prof. G. Marques da Silva, continua a ser a que "consta do artº 12º do CC, segundo o qual a lei só dispõe para o futuro, mas no futuro, isto é, depois da sua entrada em vigor, é só ela que dispõe, ou seja, é de aplicação imediata".

    "É ainda o Código Civil - adianta - que determina que quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos".

    E conclui : "Assim, a regra é que a lei processual se aplica imediatamente aos processos a instaurar e aos actos a praticar nos processos pendentes ; não se aplica nunca aos actos já praticados anteriormente, cuja validade deve ser julgada de harmonia com a lei revogada" (2) - sublinhados nossos.

    Especificamente em sede processual penal rege o art.º 5º segundo o qual, mantendo aquele velho princípio da aplicação imediata, salvaguardando e respeitando o anteriormente processado - n.º 1 - excepciona, no seu n.º 2, quanto "aos processos iniciados anteriormente à sua vigência", no que agora releva, as situações em que, da sua aplicação imediata, possa resultar "agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa" - al. a) - de novo sublinhados nossos.

    No que se concretize este "agravamento", que terá de ter-se por "sensível e ainda evitável da situação processual do arguido", em especial no que ao seu "direito de defesa" respeita, como se sabe constitucionalmente consagrado pelo art.º 32º n.º 1 da CRP, só caso a caso se poderá aferir.

    2- Posto o sumariamente referido, vejamos então a realidade concreta dos presentes autos.

    Iniciados no domínio da lei processual decorrente das alterações levadas a cabo pela Lei 59/98, de 25/08 - vd "auto de notícia" de fls 2, datado de 7/08/00 - dispunha então o art.º 333º do CPP, aqui posto em crise, que, perante a ausência do arguido na audiência, não sendo "possível obter a sua comparência imediata", "a audiência é adiada, cabendo ao presidente tomar as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter o comparecimento" - n.º 1.

    Se, "sujeito a termo de identidade e residência não estiver presente na nova data designada e não for possível a sua...

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