Acórdão nº 1269/2002-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Dezembro de 2005

Magistrado ResponsávelCARLOS ALMEIDA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO 1 - O réu Ant. foi julgado, no âmbito do processo de querela n. ° 103/95.1TCLSB da 4ª Vara Criminal de Lisboa, pela prática de um crime de administração danosa em unidade económica do sector público, conduta p. e p. pelo artigo 333°, n. °s 1 e 3, da redacção original do Código Penal de 1982 (acusação provisória de 20/10/94 - fls. 988 a 993 verso -, convertida em definitiva em 25/1/95 - fls. 1004 -, e pronúncia de 9/2/95 - fls. 1005 a 1008).

Por acórdão de 3 de Março de 1997 (fls. 1129 a 1138), o tribunal decidiu: · Absolver o réu do crime por que tinha sido acusado e pronunciado; · Condenar o réu, nos termos do artigo 12° do Decreto-Lei n. ° 605/75, a indemnizar o Instituto do Azeite e Produtos Oleaginosos (IAPO) e o Fundo de Abastecimento pelos prejuízos causados, em montante a apurar em liquidação de sentença, mas não inferior a 3.336.550.000$00, valor acrescido de juros à taxa supletiva legal, contados desde a data da verificação de cada um dos prejuízos parcelares.

Nessa peça processual considerou-se provado que: 1. «O IAPO, Instituto do Azeite e Produtos Oleaginosos, é um organismo de coordenação económica dotado de personalidade jurídica e de autonomia financeira.

  1. Tem por objecto a regularização das condições de abastecimento, importação e exportação de azeite, óleos vegetais, gorduras alimentares e animais, oleaginosas, sabões, detergentes, e outras atribuições emanadas do Decreto-Lei n. ° 426/72, de 31 de Outubro.

  2. De acordo com os despachos dimanados da Secretaria de Estado de Abastecimento e Preços, datados de 22/1/75 e de 6/2/75, o IAPO passou a deter a exclusividade quanto à importação de sementes de oleaginosas, cujos produtos, a extrair, se destinassem ao abastecimento do mercado interno.

  3. O órgão de gestão do IAPO é uma direcção colegial, composta por um presidente e três directores.

  4. No lapso de tempo compreendido entre Outubro de 1977 e Maio de 1984, os lugares da direcção eram ocupados por B., também presidente, por L., e pelo réu Ant..

  5. Ao presidente da direcção cabia o voto de qualidade, bem como poderes de representação, coordenação, e orientação.

  6. O presidente da direcção podia delegar esses três últimos poderes nos directores das respectivas áreas funcionais, de acordo com praxe administrativa.

  7. Assim, pela área funcional do "Azeite" era responsável o também presidente B....

  8. O pelouro jurídico-administrativo era da responsabilidade de L....

  9. E a área das oleaginosas era da exclusiva responsabilidade do réu Ant..

  10. De acordo com as praxes administrativas instituídas para o período temporal situado entre Janeiro de 1983 e Maio de 1984, o IAPO procedia à comercialização da semente de soja, que importava, junto das unidades extractoras...

  11. O que fazia a preços de cotação internacional sempre que os óleos a extrair se destinassem à exportação...

  12. ... Bem como à comercialização, no mercado interno, de bagaços extraídos de semente cujo óleo era exportado.

  13. Entre essas unidades extractoras contavam-se as sociedades "T....., SARL" e "I...., SARL".

  14. A semente de soja que se destinava à venda no mercado interno era comercializada a preços fixados por portaria (preços administrativos).

  15. Os custos inerentes à importação da mesma semente, cujo óleo era exportado, deviam ser suportados pelas referidas empresas industriais.

  16. As diferenças ocorrentes entre os preços administrativos e os custos de aquisição constituíam encargos do Fundo de Abastecimento.

  17. Para cobrir as diferenças entre os preços de venda administrativos e os da «cotação acordada» o IAPO emitia notas de débito ou de crédito quando o óleo era exportado.

  18. A referida «cotação» era acordada com as sociedades T. e I., e as demais empresas do sector...

  19. E consistia na cotação internacional, calculada de acordo com o câmbio em vigor à data da exportação, acrescida de encargos aduaneiros e demais despesas.

  20. Contudo, no lapso de tempo ultimamente referido, o réu Ant., como responsável pela área de oleaginosas, adoptou uma cotação de valor inferior ao de custo internacional à referência CIF/Roterdão...

  21. Acarretando para o IAPO, desse modo, um prejuízo patrimonial de 2.642.700.000$00 (dois biliões, seiscentos e quarenta e dois milhões, e setecentos mil escudos)...

  22. ...Com efeito, a favor da T. emitiu as seguintes notas de crédito: a. No dia 7/3/83, de 5.015.000$00, 16.250.000$00, 1.593.000$00, e 4.596.000$00; b. em 12/5/83, de 728.000$00; c. em 24/8/83, de 218.367$00; d. em 13/9/83, de 54.721$00 e 51.007.000$00; e. em 30/12/83, de 46.368.000$00, 24.025.000$00 e 49.656.000$00; f. e, em 15/3/84, de 631.000$00, 2.157.000$00 e 1.347.000$00.

  23. Ainda a favor da T., emitiu as seguintes notas de débito: a. Em 7/3/83, de 1.204.000$00 e 1.299.000$00; b. em 20/4/83, de 2.808.000$00; c. em 31/5/83, de 9.050.000$00, 8.884.000$00, 21.221.000$00 e 23.699.000$00; d. em 13/7/83, de 91.274.000$00; e. em 27/7/83, de 102.590.000$00; f. em 2/8/83, de 91.170.000$00 e 19.035.000$00; g. em 30/12/83, de 21.199.000$00; h. em 8/2/84, de 6.445.000$00, 36.611.000$00, 31.269.000$00 e 55.971.000$00; i. em 5/3/84, de 19.809.000$00; j. e, em 7/5/84, de 757.000$00 e 7.373.000$00.

  24. A favor da I. emitiu as seguintes notas de crédito: a. Em 7/3/83, de 12.038.000$00 e de 5.735.000$00; b. em 25/3/83, de 9.537.000$00; c. em 1/9/83, de 36.300.000$00, 34.607.000$00, 1.644.000$00, 68.263.000$00 e 13.728.000$00; d. em 25/11/83, de 87.393.000$00, 38.840.000$00, 2.599.000$00; e. em 30/12/83, de 9.874.000$00; f. em 17/2/84, de 2.960.000$00; g. em 24/2/84, de 865.000$00; h. em 15/3/84, de 13.570.000$00; i. e, em 2/5/84, de 6.672.000$00.

  25. Emitiu ainda, quanto à mesma I., as seguintes notas de débito: a. Em 13/5/83, de 463.000$00; b. em 3/5/83, de 7.196.000$00; c. em 26/6/83, de 35.624.000$00; d. e, em 27/7/83, de 3.354.000$00.

  26. Por outro lado, o IAPO, sempre representado pelo réu no sector das oleaginosas, adquiriu às referidas clientes, T. e I., bagaço proveniente de sementes de que fora extraído óleo para exportação...

  27. E isto porque o réu entendeu que tais aquisições coarctavam exportações daquela produção a efectuar pelas mesmas clientes.

  28. O réu atribuiu-lhes uma compensação, que consistiu na diferença registada entre o preço de comercialização do bagaço no mercado interno (preço administrativo), e uma cotação internacional que se baseava em valores superiores ao CIF de Roterdão.

  29. Deste modo, acarretou para o IAPO um prejuízo patrimonial que ascende a 693.850.000$00 (seiscentos e noventa e três milhões, oitocentos e cinquenta mil escudos).

  30. Na verdade o IAPO, de acordo com a descrita actuação do réu, emitiu as seguintes notas de débito a favor da T.,: a. No dia 24/8/83, de 55.188.000$00; b. no dia 13/9/83, de 13.499.000$00; c. e, no dia 30/12/83, de 9.740.000$00...

  31. Bem como as seguintes notas de crédito, a favor da mesma sociedade: a. Em 7/3/83, de 50.011.000$00, 61.498.000$00, 84.387.000$00, 63.742.000$00, 63.694.000$00 e 58.761.000$00; b. em 12/5/83, de 22.504.000$00; c. em 20/4/83, de 57.047.000$00; d. em 31/5/83, de 34.418.000$00, 33.788.000$00, 79.100.000$00 e 81.010.000$00; e. em 13/7/83, de 219.439.000$00; f. em 27/7/83, de 142.009.0000; g. em 2/8/83, de 124.621.000$00, e de 25.738.000$00; h. em 13/9/93, de 31.909.000$00; i. em 30/12/83, de 14.394.000$00, 32.762.000$00, e 80.475.000$00; j. em 8/2/84, de 16.768.000$00, 95.720.000$00, 95.720.000$00, 81.753.000$00 e 146.334.000$00; k. em 5/3/84, de 60.733.000$00; l. e, em 15/3/84, de 16.324.000$00, 38.981.000$00, e 24.349.000$00.

  32. De acordo com a mesma actuação, o IAPO emitiu, ainda, as seguintes notas de crédito a favor da I: a. em 7/3/83, de 92.213.000$00, e 43.936.000$00; b. em 25/3/83, de 99.619.000$00; c. em 13/5/83, de 1.668.000$00; d. em 3/5/83, de 116.017.000$00; e. em 23/6/83, de 310.520.000$00; f. em 27/7/83, de 8.755.000$00; g. em 1/9/83, de 18.836.000$00, 20.105.000$00. 566.000$00, 49.346.000$00 e 12.131.000$00; h. em 25/11/83, de 104.654.000$00, 82.282.000$00 e 3.751.000$00; i. em 30/12/83, de 29.367.000$00; j. em 17/2/84, de 59.576.004$00; k. em 24/2/84, de 6.724.000$00; l. em 15/3/84, de 50.970.000$00; m. e, em 2/5/84, de 60.926.000$00.

  33. Com toda a actuação acima descrita, o réu provocou ao IAPO/Fundo de Abastecimento um prejuízo global de 3.336.550.000$00 (três biliões, trezentos e trinta e seis milhões, quinhentos e cinquenta mil escudos), prejuízo esse que se traduziu em débitos insuficientes lançados pelo IAPO, em virtude da semente de soja ter sido vendida a preços inferiores aos da cotação internacional CIF/Roterdão e aos dos custos CIF do último fornecimento, e em créditos excessivos, em virtude das compensações de preços do bagaço de soja terem tomado por referencial cotações substancialmente superiores às vigentes no mercado internacional.

  34. Por outro lado, ainda no desempenho das aludidas funções, no dia 10/5/84, o réu determinou que o IAPO distribuísse à Fábrica M., SA, 4.063 toneladas de semente de girassol, pelo preço de 40.126$00 a tonelada...

  35. ...Tendo excedido em 613 toneladas as necessidades atendíveis, fixadas de acordo com os gastos médios da empresa.

  36. Deste modo, deu origem ao pagamento, por parte do Fundo de Abastecimento, de encargos de montante não exactamente apurado.

  37. Estes prejuízos (§§ 34 e 37) apenas se verificaram porque o réu não observou as regras fixadas em praxes administrativas (portarias) para a comercialização dos produtos em causa...

  38. ... Ao invés, adoptou regras próprias, o que lhe não competia...

  39. Acarretando para o IAPO/Fundo de Abastecimento os aludidos prejuízos.

  40. O réu agiu deliberada, livre e conscientemente.

  41. Sabia que toda a sua descrita actuação lhe não era permitida por lei.

  42. A política seguida pelo réu possibilitou a retenção e poupança de divisas, quanto à opção de compra de bagaços excedentes aos produtores nacionais.

  43. A "cotação acordada" tinha como referenciais algumas cotações internacionais ...

  44. ... Mas apenas como referenciais.

  45. As...

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