Acórdão nº 0512297 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Fevereiro de 2006 (caso NULL)
Magistrado Responsável | GUERRA BANHA |
Data da Resolução | 01 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.
*I 1. B........., arguido nos autos de processo comum nº ..../02.8GAVFL do Tribunal Judicial da comarca de Vila Flor, foi julgado pelo tribunal colectivo daquela comarca, que, por acórdão de 6/12/2004, a fls. 882-900, proferiu a seguinte decisão: absolveu o arguido do crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos arts. 131º e 132º, nºs 1 e 2 al. h), do Código Penal, de que ia acusado; condenou o arguido, pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio da previsão do art. 131º do Código Penal, na pena de 14 anos de prisão; também o condenou, pela prática de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, previsto e punido pelos arts. 1º nº 1 al. c) e 6º nº 1 da Lei nº 22/97, de 27 de Junho, na pena de 9 meses de prisão; condenou ainda o arguido, pela prática de um crime de burla agravada, na forma tentada, da previsão conjunta dos arts. 22º, 23º nº 2, 73º, 313º nº 1 e 314º al. c) do Código Penal de 1982, na pena de 1 ano de prisão; em cúmulo jurídico daquelas três penas de prisão, condenou-o na pena única de 14 anos e 6 meses de prisão; mais condenou o arguido a pagar a cada um dos demandantes do pedido civil, C..... e D......, a quantia de 25.000,00€, e à demandante E..... a quantia de 26.300,00€; absolveu-o da parte restante dos pedidos civis contra si deduzidos; condenou o arguido a pagar as custas relativas à sua condenação criminal, fixando em 6 UC a taxa de justiça criminal devida, acrescida de 1% a favor do Cofre Geral dos Tribunais, nos termos do art. 13º nº 3 do Decreto-Lei nº 423/91, de 30 de Outubro; condenou o arguido e os demandantes civis a pagarem as custas relativas aos pedidos civis, na proporção do decaimento de cada um.
*2. Não aceitando a decisão condenatória contra si proferida, dela recorreu o arguido, a fls. 914-956, extraindo da motivação deste seu recurso as seguintes conclusões: O acórdão em crise é passível de sindicância nos inúmeros pontos de direito de facto já descritos e que a seguir se sintetizam.
O tribunal diminuiu as garantias de um julgamento imparcial e equitável ao prestar-se à crítica aos olhos de todos, por falta de atenção e compostura dos seus magistrados, os quais passaram a maior parte do tempo durante a produção da prova a consultar em simultâneo os seus computadores pessoas e a conversar, dando - pelo menos - uma aparência de displicência e de desconsideração pelos presentes.
Permitiu, sem intervir que, na parte final da 2ª sessão da audiência, o arguido fosse repetidamente insultado, denegrido e difamado na sua imagem e na sua honra por uma testemunha, também assistente, não protegendo assim, pela sua omissão os direitos fundamentais do presumido inocente que na sala se encontrava a ser julgado.
O tribunal permitiu que, sistematicamente, o MP e o assistente inquirissem as testemunhas de forma irregular, porque sugestiva, perturbadora e afirmativa nas perguntas que colocavam às testemunhas e, de imediato acompanhavam com as respectivas respostas.
Mais ainda, o Juiz Presidente, no âmbito de esclarecimentos pedidos às testemunhas, e MP e assistente, permitiram-se inquirir na base de depoimentos indirectos e do "ouvir dizer", sabendo conscientemente que tal matéria é rigorosamente ineficaz como meio de prova, porém, não se coibindo de o fazer em permanência e de forma sistemática, o que, aliás se traduziu de forma evidente na motivação da sentença.
Sua excelência o sr. Juiz Presidente, não raro, por sua iniciativa, perverteu conscientemente o espírito e o regime de inquirição das testemunhas plasmado no artigo 348º do CPP, fazendo do instrumento dos "esclarecimentos após o depoimento prestado" (artº 348º nº 5 do CPP) autênticos, prolongados e novos interrogatórios das testemunhas que haviam já prestado depoimento.
Elevando assim o princípio excepcional e subsidiário do inquisitório à posição e dignidade do princípio geral, o que muito contribuiu para a aparência notória de parcialidade por parte do colectivo, no sentido sempre favorável às teses da acusação e do assistente e sempre em prejuízo da posição da defesa.
Feriu também o tribunal os princípios da continuidade do julgamento e da espontaneidade na produção da prova testemunhal, ao ordenar a repetição total da produção da prova testemunhal produzida durante toda uma manhã, identificação e ajuramentação inclusos, sem base legal para o poder fazer.
E não utilizando os instrumentos processuais previstos na lei adjectiva capazes de, legalmente, sanar a irregularidade constatada, anunciada aos presentes, mas nunca provada, da não gravação - ou deficiente gravaþÒo da prova dessa manhÒ.
Ordenando assim a repetiþÒo parcial do julgamento, quando nÒo tinha competÛncia para tal.
O tribunal impediu consciente e deliberadamente a busca da verdade material, omitindo de ordenar diligÛncias essenciais para a descoberta da verdade, entre as quais a ida ao local dos factos, que sempre a defesa requereu, nomeadamente em sede de instruþÒo; a perÝcia mÚdica e psiquißtrica ao estado mental da testemunha F......, o qual, dois meses ap-s os factos, deu entrada nos serviþos de UrgÛncia do Hospital de Braganþa e permaneceu 15 dias internado nos respectivos serviþos de psiquiatria, tanto mais que credibilizou o seu depoimento de forma absoluta, em detrimento daqueles outros de testemunhas indicadas pela defesa, sem explicaþÒo, nem fundamento aparente.
Errou na qualificaþÒo do ilÝcito relativo Ó burla agravada na forma tentada e omitiu de apreciar as quest§es das amnistias e perdÒo de penas resultantes das leis anteriores.
O tribunal deu como provado o cometimento do crime de burla agravada na forma tentada a partir de uma decisÒo de nÒo provimento num processo cÝvel, em que o arguido ali era autor e demandante, extravasando, assim, do Ômbito pr-prio desse processo sumßrio e fazendo valer como prova neste processo a matÚria constante da decisÒo.
Ao mesmo tempo que errou quando impediu a leitura de declaraþ§es anteriores, como testemunha jß falecida, no referido processo cÝvel, quando a mesma havia prestado tais declaraþ§es perante um Juiz.
O tribunal nÒo cumpriu o estipulado na lei, nÒo realizando um efectivo exame crÝtico da prova que indicou.
Limitando-se a descrever, de forma sintÚtica e parcial, o conte·do daquilo que o tribunal afirmou que cada uma das testemunhas disse, porÚm, sem realizar um real exame crÝtico do respectivo conte·do e em confronto com o conte·do das demais.
Omitindo, ao mesmo tempo, partes fundamentais dos depoimentos de testemunhas confortantes e essenciais para a defesa e bondade da posiþÒo da defesa e prestando-se desse modo Ó suspeiþÒo evidente de parcialidade na apreciaþÒo da prova.
O tribunal nÒo fundamentou, nem explicou devidamente, a decisÒo quanto Ó dosimetria da pena exagerada que aplicou ao arguido, limitando-se a umas poucas frases vagas de conte·do e de circunstÔncia, que nada informam acerca da justificaþÒo de tÒo pesada pena, tÒo pr-xima do mßximo, abstractamente considerado, para o crime de homicÝdio simples.
O tribunal errou quando do texto da sentenþa ressalta Ó evidÛncia, em vßrios pontos, contradiþÒo insanßvel da fundamentaþÒo e, tambÚm, entre a fundamentaþÒo e a decisÒo, como ficou alißs, profusamente expresso em sede da motivaþÒo deste recurso.
O tribunal errou profundamente e, por vezes, de forma flagrante e incompreensÝvel, falseando mesmo afirmaþ§es contidas na gravaþÒo e com origem nos depoimentos de testemunhas, para dar como provados factos que nÒo tÛm a correspondÛncia exigida com a prova efectivamente produzida em audiÛncia e gravada.
Assim sendo, a sentenþa fez uma errada apreciaþÒo da matÚria dada como provada, face Ó prova efectivamente produzida, nos seguintes pontos: Deu erradamente como provado a matÚria vertida nos pontos 2 a 17 dos Factos Provados: assentando a decisÒo, quanto Ó burla agravada sob a forma tentada, apenas e tÒo s- nos depoimentos da assistente e da testemunha C....., eles mesmos baseados em puras conjecturas e daquilo que terÒo ouvido dizer ao falecido e, como tal, nÒo comprovado, tanto mais que o mesmo, em vida, sempre negou o cometimento de tais factos e desdisse a tese actual da acusaþÒo; Errou, tambÚm, na apreciaþÒo que fez dos neg-cios existentes entre os falecido I..... e o aqui arguido, nÒo levando em conta os serviþos m·tuos efectivamente prestados um ao outro e sem avaliar com um mÝnimo de rigor o valor de tais serviþos, por forma a poder definir quem, afinal, devia a quem e quanto; Desse modo, o tribunal apenas poderia dar como provado que o arguido e o falecido trocaram entre si produtos derivados das suas empresas, sendo que se nÒo provou que tais neg-cios tenham quebrado a amizade existente entre eles, bem ao contrßrio, dado que os dois continuaram a conviver como amigos, como ficou amplamente demonstrado em audiÛncia; O tribunal errou quanto Ó matÚria contida no ponto 19 dos Factos Provados, visto que, na motivaþÒo, entrou em contradiþÒo, da mesma forma que deixou que a decisÒo entrasse em contradiþÒo com a pr-pria motivaþÒo, no referente aos pontos atrßs especificados na motivaþÒo deste recurso e no capÝtulo intitulado ôContradiþÒo insanßvel da fundamentaþÒo (art║ 410║ n║ 2, al. b) do CPP)ö; A sentenþa errou porque nÒo explicou, quanto ao ponto 20 dos Factos Provados: quando concluiu e decidiu que a hora dos factos foi ôcerca das 20 horas e 30 minutosö, dado que da prova testemunhal resulta que o arguido chegou Ós bombas, para abastecer, cerca das 20h:10/15 m; Errou, tambÚm, quando deu como provado, no ponto 21 dos Factos Provados, que o I...... se tenha dirigido ao arguido ôa fim de conversarem acerca de quest§es que tinham pendentesö. Nada permite fazer tal afirmaþÒo, a qual Ú desprovida da mais insignificante base probat-ria, sendo certo que, perante tudo o que ficou dito e demonstrado em audiÛncia, se tratou de um encontro puramente ocasional, que deu origem a uma troca amigßvel de palavras entre os dois amigos, conhecidos e tidos por todos...
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