Acórdão nº 0051657 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Março de 2001 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução05 de Março de 2001
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto Maria ........., em 16.11.1998, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Marco de Canaveses, por apenso à acção ordinária n° .../.., que lhe moveram: Floranda ......... e marido Diamantino ........., e; Maria da Conceição ......... e marido Armando .........

Interpôs Recurso de Revisão da decisão proferida naqueles autos, já transitada em julgado.

Alegou, em síntese, que a sentença revidenda que julgou a acção procedente e, em consequência, considerou o testamento público de 5/08/1987, outorgado no Cartório Notarial de Marco de Canaveses, pelo autor da herança, como o único válido e eficaz, deve ser alterada, uma vez que, em Fevereiro de 1998, a recorrente teve conhecimento da existência de um outro testamento, cerrado, de Américo ......... datado de 30/12/1987, efectuado em França.

De tal testamento resulta a revogação de todos os anteriores e, por isso, também daquele em que se fundou a decisão revidenda, o que por si só é suficiente para modificar aquela em sentido favorável à recorrente.

Notificadas, as recorridas defenderam a inadmissibilidade do recurso, porque não se encontram preenchidos os requisitos previstos pelo art. 771°, al. c) do Código de Processo Civil e porque, também, o novo testamento não põe em causa a validade do anterior porque o autor tinha dupla nacionalidade e só dispôs quanto aos bens que possuía, em França e porque do próprio testamento resulta que ao dispor apenas de tais bens não foi vontade do testador revogar o testamento efectuado em 5/08/1987.

A final, foi proferida decisão, negando provimento ao recurso de revisão, considerando, essencialmente, que o testamento feito em França por Américo ........., tendo ele a nacionalidade francesa, não revogara o testamento anteriormente outorgado por si, em Portugal em -5.8.1987.

Inconformada recorreu Maria ......... que, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1- Nos termos do nº3 do art. 684º do Código de Processo Civil, o presente recurso limita-se a apreciar a parte da douta sentença recorrida segundo a qual o testamento de 30.12.87, feito em França pelo Américo ......... é suficiente ou não para só por si modificar a douta sentença revidenda.

2 - O documento junto pelas Recorridas com a sua resposta e a certidão do mesmo junta a fls. 163 foi impugnado pela Recorrente a fls. 44.

3 - O documento de fls. 163 é um mera fotocópia do documento particular junto noutro processo, também impugnado pela Recorrente, não autenticado por nenhum agente diplomático português nomeadamente pelo Consulado de Portugal em Dax (art. 540º do Código de Processo Civil.).

4 - A tradução desse documento não está legalizada nos termos do art. 140º do Código de Processo Civil.

5 - A Recorrente não foi notificada da junção do documento de fls. 163, o que a impediu de exercer os direitos dos artigos 374º do CC e 544º do CPC.

6 - A Recorrida não cumpriu o despacho do M.mo Juiz transitado em julgado com força obrigatória dentro do processo (art. 672 do CPC).

7 - A Recorrente só teve conhecimento das nulidades cometidas quando agora requisitou o processo para consulta com vista à produção das presentes alegações.

8 - As nulidades referidas nas alíneas 3, 4, 5 e 6 supra são essenciais e têm influência na decisão recorrida, pois foi com base no conteúdo do documento de fls. 163, sem qualquer força probatória, que julgou improcedente o Recurso de Revisão da Recorrente.

9 - A consequência é a anulação da parte da decisão que considerou o autor da herança francês e que o testamento de 30/12/87 (fls. 180) é só por si suficiente para modificar a decisão recorrida nos termos do pedido formulado no Recurso de Revisão.

10 - O autor da herança, Américo ......... é Português de nascimento, não constando do assento de fls. 160 a 162 qualquer registo de naturalização, como é obrigatório face ao disposto no art. 23 da Lei 10/7/12, art. 158 do Dec. 22.018, pelo que se presume que se mantém Português (art. 41 do DL 322/82).

11 - O testamento de fls. 180 é um testamento ológrafo, admitido pelo art. 970 do Code Civil pelo que é formalmente válido de acordo com a lei do lugar onde foi efectuado, concretizando-se assim uma das exigências do n.° 1 do art. 65º do Código Civil.

12 - Esse testamento observa a forma solene, por ter a forma escrita por contraposição com o testamento puramente nuncupativo, este não aceite pelo nosso ordenamento jurídico, e respeita o n.° 2 do art. 65º e art. 2223º do CC.

13 - Para regular a sucessão por morte é competente a lei pessoal pelo que sendo certo não ter o Américo ......... perdido a nacionalidade portuguesa, é esta a lei aplicável.

14 - Sendo válido e eficaz perante o nosso ordenamento jurídico o testamento em causa, temos que ele revoga expressamente o testamento feito no Cartório Notarial do Marco de Canaveses em 5/8/87 (art. 2312º do CC).

15 - Assim, relativamente aos imóveis existentes em Portugal, não pode ser invocado e utilizado o testamento do Marco.

16 - Sendo a mulher do autor da herança, sua herdeira legitimária e também por sentença transitada em julgado proferida contra as aqui Recorridas, constitui tal facto caso julgado material, pelo que podia dispor dos bens, como o fez a favor da Recorrente.

17 - As recorridas não podem socorrer-se do instituto do legado universal, que além de duvidosa interpretação ao testamento em vigor não tem cabimento no nosso ordenamento jurídico.

18 - A douta decisão recorrida violou assim, o disposto nos artigos 140º, 540º, 544º, 672º, 673º, 674 do Código de Processo Civil; 31º, 62º, 63º, 64º, 65º, 374º, 2223º, 2312º do Código Civil; 23º da Lei de 10/7/12, 158º do Dec. 22.018 e 41º do Dec-Lei 322/82.

Termos em que deve o presente Recurso ser julgado procedente e provado, revogando-se a parte recorrida da douta decisão proferida e julgando-se totalmente procedente e provado o Recurso de Revisão da Recorrente por tal ser de Justiça.

As recorridas não contra-alegaram.

Maria ........., atempadamente, juntou aos autos o douto Parecer de fls. 226 a 252.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Relevam para a decisão os seguintes factos: 1- Transcrição parcial do saneador-sentença revidendo: Floranda ......... e marido, Diamantino ........., e Maria da conceição ......... e marido, Armando ........., intentaram acção declarativa de condenação, com processo comum ordinário, contra Maria .......... .

Alegaram, em síntese, que o falecido Américo ......... deixou às AA., em testamento, vários prédios urbanos, sendo que estes se encontram ilegitimamente em poder da R. Nesse pressuposto, e por se acharem suas proprietárias, reivindicam a entrega dos mesmos e ainda a condenação da demandada no pagamento dos prejuízos advindos de não se encontrarem a usufruir os rendimentos dos prédios em causa.

Pedem o cancelamento dos registos de aquisição dos ditos prédios a favor da antecessora da R. e da própria R.

Contestou a R., defendendo-se com a existência de um testamento cerrado outorgado em momento posterior ao testamento público em que assenta a pretensão dos AA., testamento cerrado esse no qual o "de cuius" declarou revogar todos os anteriores.

Os AA. replicaram a nulidade deste testamento cerrado.

Questões a resolver: saber se o testamento cerrado é efectivamente nulo e, em caso afirmativo, quais as consequências que daí decorrem.

São os seguintes os factos provados: 1. Américo ......... era proprietário dos prédios urbanos descritos nos docs. de fls. 6, 1 l, 12, 13 e 14, que aqui dou por reproduzidos; 2. por testamento público outorgado no Cartório Notarial de Marco de Canaveses em 5Ago87, o mesmo Américo ......... legou: - a ambas as AA, em comum e partes iguais, o prédio identificado no doc. fls,6; - à A. Floranda, os prédios identificados nos docs. fls.1 l, 13 e 14; - à A. Maria da Conceição........., o prédio identificado no doc. fl.12 (doc. fls.19 a 23), 3. em Dez87, o Américo ......... fez um testamento cerrado no qual expressamente revogou todos os outros, nomeadamente os lavrados no Cartório Notarial do Marco de Canaveses (doc. fls.56 e 57); 4. por sentença de 30Mai94, proferida na acção ordinária n°131/92 do Tribunal Judicial de Penafiel, o testamento cerrado referido em 3. foi declarado nulo, em virtude de não ter sido objecto de aprovação notarial (doc. fls.67 a 71); 5. o testamento referido em 2. era o único válido e eficaz à data da abertura da herança de Américo .........; 6. as AA. aceitaram os legados que lhes foram deixados pelo testamento referido em 2.; 7. o Américo ......... faleceu em l5Ago88 no estado de casado em separação de bens com Mathilde .........; 8. desde Mar95, a R. tem colhido os frutos, utilidades e rendimentos dos prédios indicados em l.

Pelo exposto, julgo procedente a acção e, em consequência: a) declaro: - o testamento público outorgado no Cartório Notarial de Marco de Canaveses em 5Ago87, o único válido e eficaz à data da abertura da herança de Américo .........; - ambas as AA únicas comproprietárias, em partes iguais, do prédio identificado no doc. fl.6; - a A. Floranda ......... única proprietária dos prédios identificados nos docs. fls.l l, 13 e 14; - a A. Maria da Conceição única proprietária do prédio identificado no doc.fl.12.

  1. condeno a R.: - a entregar às AA. os referidos prédios; - a indemnizar as AA. dos prejuízos decorrentes da apropriação ilícita dos prédios, desde Mar95 até à sua efectiva entrega, relegando-se a liquidação para a execução de sentença.

  2. ordeno o cancelamento de quaisquer registos, referentes aos prédios descritos em a), a favor de pessoa diversa das AA.

    Custas pela R.

    Notifique.

    Penafiel, 18.4.1997" - Conforme certidão de nascimento de fls. 160-162, Américo ......... nasceu em Portugal, no dia 14.9.1902.

    3- Da referida certidão de nascimento apenas constam os averbamentos do seu casamento com Mathilde ........., em França, em 6.9.1973, e a morte, ocorrida em 15.8.1988 naquele país.

    4- Do Extracto de Certidão de Casamento - doc. de fls. 39 a 41- consta que o Américo ......... adquiriu a...

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