Acórdão nº 0230656 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Maio de 2002 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPIRES CONDESSO
Data da Resolução16 de Maio de 2002
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO Oportunamente, a Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Oliv. de Azeméis remeteu ao Tribunal Judicial da mesma cidade o processo relativo aos menores Ana Cristina..., nascida a 29/10/92, e Nuno Miguel... nascido a 24/7/85.

Foi ele registado, distribuído e autuado como processo tutelar a 29/6/00 nos Juízos Cíveis.

Veio a ser reclassificado a 25/1/01 como de Promoção e Protecção nos termos do DL 147/99 de 1/9.

Por decisão de 27/6/01 foi a Ana confiada provisoriamente à guarda e cuidados dos seus padrinhos.

Ocorreram diligências de instrução.

Veio a ser designado o dia 11/9/01 para a realização do debate judicial, que entretanto foi dada sem efeito e marcado o novo dia de 18/9/01, e depois, mercê de adiamento foi designado o dia 18/2/02.

Entretanto por despacho de 5/2/02, o Sr Juiz declarou o Juízo Cível onde decorriam os autos como materialmente incompetente sendo-o, no seu entender, os Juízos Criminais do mesmo Tribunal.

+ Inconformado, AGRAVOU o Mº Pº que apresentou as suas alegações concluindo com a única questão de que a seu ver os Juízos Cíveis são os competentes e não os Criminais.

+ O Sr Juiz sustentou a sua posição em bem elaborado despacho.

+ Sabendo-se que as conclusões delimitam objectivamente o recurso, salvo quanto às questões de conhecimento oficioso ainda não decididas com trânsito, podemos conhecer da apresentada nos autos.

+ Para tal dispomos dos factos expostos neste relatório, salientando-se que resulta do processo que a situação que levou os autos à Comissão de Protecção de Menores foi uma participação anónima no sentido de que os menores eram vítimas de maus tratos físicos e psicológicos, alimentação deficiente («passam fome») e abandono, sendo a família deles conhecida como desestruturada, conflituosa, negligente e sem recursos psicológicos, habitacionais e económicos que assegurem o mínimo de condições às crianças.

+ Debrucemo-nos, então, sobre a competência material para o processo em causa.

E começando pela Lei 3/99 de 13/1, que aprova a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais, refere-se ela no seu artº 64º aos Tribunais de competência especializada, no artº 77º aos de competência genérica e dentro daqueles vêm os artºs 78º e segs estabelecer, no que nos interessa, relativamente a menores, os de Família com competência relativa a Menores (artº 82º) e os Tribunais de Menores (artº 83º).

Prevê, portanto, estas duas espécies de Tribunais de Competência Especializada e fixa em ambas as disposições legais (artº 82º nº 2 e artº 83º) a competência, bem diferenciada, de cada um deles: o de Família com competência relativa a Menores de cariz nitidamente civil e o de Menores em que ao lado de aspectos tipicamente criminais (menores agentes de algum facto qualificado pela lei penal como crime ou contravenção) surgem outros de natureza que mais se nos afiguram próxima do cível e/ou mista.

No artº 93º vem prever a criação de Juízos de competência especializada cível e criminal.

Perante a criação destes Juízos de competência especializada era necessário fixar a sua competência nos casos em que não houvesse outro tipo de Tribunais, existindo apenas eles.

Surgem, por isso, os artºs 94º e 95º que vêm manter, no essencial, a mesma orientação do anterior artº 55º-A nº 3 e 4 da Lei 214/88, com a redacção do DL 312/93.

O artº 94º veio estabelecer que aos juízos de competência especializada cível compete a preparação e o julgamento dos processos de natureza cível não atribuídos a outros tribunais, o que a nosso ver significa a atribuição de uma competência residual para tudo o que não seja atribuído especificamente a outros Tribunais.

No artº 95 veio regular a competência especializada criminal e na al.b) estabeleceu que «nas comarcas não abrangidas pela plenitude dos tribunais de menores, a prática dos actos que, nessa matéria, é atribuída aos tribunais de competência genérica».

Conhecendo o legislador, necessariamente, a especialização que nos artigos anteriores fizera entre os apontados Tribunais de Família com Competência Relativa a Menores (artº 82º) e os de Menores (artº 83º) só se pode entender a referência que naquele artº 95º-b) se faz a estes últimos, e não aos de Família e Menores, como apenas pretendendo definir os casos «....não abrangidos pelo plenitude dos TRIBUNAIS de MENORES...».

Devendo presumir-se que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (artº 9º CC) afigura-se-nos de concluir que ali (artº 95º-b) se pretendeu em verdade regular somente os casos em que não existissem TRIBUNAIS de MENORES, cuja competência nos surge definida no artº 83º.

Quanto aos casos abrangidos pelos Tribunais de Família com Competência Relativa a Menores, previsto no artº 82º serão regulados, na sua falta e face à especialização dos Juízos, pelos Cíveis, nos termos do artº 94º.

Portanto, tudo o que anteriormente cabia ao Tribunal de Família na Competência de Menores passa para os juízos cíveis, o que bem se compreende se atentarmos no que vem estabelecido no artº 82º pois logo se verifica que tudo gira à volta de questões de caracter nitidamente cível/tutelar cível.

Do exposto flui que a disciplina do artº 95º-b) apenas tem aplicação, à data da Lei 3/99, à jurisdição dos Tribunais de Menores.

E daí, do disposto nos artº 82º nº 2, 83º e 95-b), resulta, a nosso ver com clareza, que o que não for da competência dos Tribunais de Menores caberá aos Tribunais de Família e Menores (salvo, claro, os caso dos Tribunais de Comarca com competência genérica, mas que, pelo menos por agora não interessa abordar).

Posteriormente surge o DL 186-A/99 de 31/5, que aprova o Regulamento daquela Lei 3/99.

Acontece que ao estudá-lo, verificamos que, pese a distinção feita na anterior Lei 3/99 entre Tribunais de Família com competência relativa a Menores (artº 82º nº 2) e Tribunais de Menores (artº 83º), com competências específicas e bem diferenciadas, a verdade é que este Regulamento não prevê na organização judiciária do país um único Tribunal de Menores, stricto sensu, digamos, apenas passando a existir Tribunais de Família e Menores os quais, pese a diferença de nomes devem, presumimos, corresponder aos falados Tribunais de Família com Competência Relativa a Menores.

No mesmo regulamento não se extinguem os Tribunais de Menores existentes, mas a verdade é que não há nenhum instalado e os existentes de Lisboa e Porto vêm os seus Juizes serem transferidos para os Tribunais de Família e Menores em que se convertem os de Família (artºs 58º e 59º).

Portanto, face ao novo Regulamento não há um único Tribunal de Menores em actividade (sem terem sido extintos formalmente, contudo) apenas existindo os apontados de Família e Menores.

Claro que, como já referimos, tudo isto contém uma ressalva (que, porém, não tem interesse directo, por agora, para o nosso caso) para os Tribunais de Comarca funcionando com competência genérica que têm sob a sua jurisdição todas as matérias quando ao existam aqueles tribunais especializados nem juízos como tais.

Uma coisa é certa e isto é que conta para o nosso recurso: não há actualmente a funcionar, como Tribunais de Competência Especializada, Tribunais de Menores mas apenas os de Família e Menores.

+ Vejamos outro aspecto que quase coincide com esta inexistência de Tribunais de Menores.

A 1/9/99 surge a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (a Lei 147/99) que se nos afigura como de natureza tipicamente civil (repare-se, a este propósito que o seu artº 126º manda aplicar subsidiariamente, com as necessárias adaptações, na fase de debate judicial e de recursos, as normas relativas ao processo civil de declaração sob a forma sumária) e que logo no artº 4º do seu preâmbulo legal revoga «...as normas do DL 314/78 de 27/10, conhecida por O.T.M., e demais legislação relativa às matérias abrangidas pelo presente diploma, enquanto no artº 101º atribui a competência aos Tribunais de Família e Menores para a instrução e julgamento dos processos e onde estes não existam aos tribunais de Comarca, que nesses casos se constitui como um Tribunal daquela natureza, como expressamente diz o seu nº 3.

Logo em seguida é...

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