Acórdão nº 0331343 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 18 de Setembro de 2003

Magistrado ResponsávelPINTO DE ALMEIDA
Data da Resolução18 de Setembro de 2003
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

............. - Companhia de Seguros, S.A. intentou a presente acção declarativa, com processo sumário, contra Albino ................

Pediu que o R. seja condenado a pagar-lhe a quantia de € 13.217,62, acrescida de juros de mora legais contados desde a citação até integral pagamento.

Como fundamento, alegou, em síntese, que celebrou com Maria ......... um contrato de seguro do ramo automóvel relativo ao veículo de matrícula ..-..-CJ e que, como o Réu foi culpado num acidente de viação quando conduzia tal veículo e se pôs em fuga, abandonando o local e os respectivos ocupantes, que se encontravam feridos, pagou indemnizações a terceiros no aludido montante, pelo que pretende, agora, exercer o seu direito de regresso, ao abrigo do disposto na al. c) do art. 19º do DL 522/85, de 31 de Dezembro.

O Réu contestou, impugnando a matéria fáctica articulada na petição inicial e afirmando que a Autora não alegou qualquer quota de responsabilidade nos danos sofridos pelos lesados em resultado da conduta que lhe atribui de abandono dos sinistrados, nem alegou que, por causa desse hipotético abandono, é que se verificaram os danos que indemnizou ou o agravamento dos mesmos.

Concluiu pela improcedência da acção.

No saneador, por considerar que o processo continha já os elementos necessários, o Sr. Juiz passou a conhecer do mérito, tendo julgado a acção improcedente.

Discordando desta decisão, dela interpôs recurso a A., de apelação, tendo apresentado as seguintes Conclusões: 1. Considerou o Juiz a quo que os factos alegados na P.I e dados como provados nos pontos 5 e 6 da sentença não são suficientes para esclarecer se o abandono do local por parte do réu colocou as vitimas do acidente na situação de não receberem a tempo os primeiros socorros, agravando as lesões sofridas.

  1. Em consequência desta análise o Juiz emitiu logo sentença, por considerar que no caso em apreço a seguradora, ora recorrente, não alegou e provou que os prejuízos reclamados resultam do abandono a que houve lugar. Logo, no entender do Juiz, não assiste o direito de regresso à ora recorrente.

  2. Considera a recorrente que os factos por si alegados, apesar de sucintos, são de molde a serem provados em audiência de julgamento.

  3. A verdade é que a ora recorrente alegou o abandono do local pelo réu e o facto essencial de esse abandono se repercutir obrigatoriamente no estado físico dos feridos, pelo simples facto de ter automaticamente levado a que a ajuda e apoio clinico a eles prestados se ter dado mais tarde. É do senso comum que quanto mais tempo ficarem os sujeitos abandonados num local sem assistência médica pior para o seu estado de saúde.

  4. Logo, mesmo aceitando-se a doutrina referente ao direito de regresso do artigo 19º, alínea c) do DL 522/85 a prova da percentagem de danos que resultaram directamente do abandono somente seria efectuada e possível através de perícias médico-legais, mas a verdade é que com a decisão ora recorrida, que absolveu desde logo o réu do pedido, o Exmo Juiz a quo impossibilitou esse tipo de prova.

  5. Ficaram assim coarctados todos os possíveis meios de prova da autora, quando é certo que foram alegados factos que consubstanciam o abandono e o hipotético agravamento da situação física dos sinistrados resultante desse abandono.

  6. Na eventualidade de se considerar que a ora recorrente não alegou cabalmente que o abandono dos sinistrados contribuiu para o agravamento daqueles danos, a verdade é que sempre deveria o Exmo Juiz a quo ter aplicado o artigo 508º, nº 1, b) e nº 2 e 3 do Código de Processo Civil.

  7. Na verdade, "...impõe-se ao juiz convidar os autores a aperfeiçoar a P.I. e não proferir Saneador-Sentença julgando a acção improcedente, com base nessa deficiência." (Ac. da Relação do Porto de 25.6.98: Col Jur. 1998, 3°, e BMJ, 478°, 456); também o AC. Relação de Coimbra, de 5.3.96: BMJ, 455° - 578 e doutrinalmente, entre outros, Prof. M. Teixeira de Sousa, na ROA, 1995, II, págs. 362 e ss).

  8. Ora, seguindo a interpretação feita pelo Juiz do que foi alegado ou não na Petição Inicial, o que deveria ter sido feito era observar o plasmado nos artigos 508°, 266 e 266 A do CPC. Ao não seguir esta via, violou o Exmo Juiz a quo este princípio da cooperação e estes artigos processuais civis.

  9. Na verdade, o poder dever conferido ao Juiz pelo artigo 508°, nº 3 do CPC resulta na prevenção das partes sobre putativas deficiências ou lacunas na sua alegação, sendo que a omissão desse poder dever constituiu uma verdadeira nulidade, por influir no exame e decisão da causa.

  10. Acresce que este poder do Juiz não pode ser meramente discricionário, sob pena de, seguindo-se essa interpretação do artigo 508°, nº 3 do CPC, o referido artigo ser inconstitucional, por violação grosseira do princípio da igualdade e do acesso à justiça, inconstitucionalidades que agora expressamente se alegam e argúem, para todos os efeitos legais.

    Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, devendo o douto despacho/sentença recorrido ser revogada.

    O R. contra-alegou, concluindo pela improcedência da apelação.

    Após os vistos legais, cumpre decidir II. Os factos...

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