Acórdão nº 0335241 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Dezembro de 2003

Magistrado ResponsávelPIRES CONDESSO
Data da Resolução04 de Dezembro de 2003
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO Nos autos de expropriação n° .../.. que correm termos no Tribunal de ........... e em que é expropriante a C.M. daquela cidade e expropriados os Herdeiros de Manuela ............. e outros foi oportunamente interposto para o Tribunal de comarca recurso da arbitragem.

Eram solicitados. pelos expropriados 473.995,67 € e pelo expropriante 293.079,93 € para os proprietários e 2.067,42 € para o arrendatário.

A avaliação indicou 465.739,57 € para os expropriados e de 17.517,78 € para o arrendatário.

+Em tal recurso não foi requerida qualquer outra diligência apenas se tendo procedido à habitual avaliação.

Não foi requerida a intervenção do Tribunal Colectivo. .

+Terminada esta o Sr Juiz da comarca proferiu despacho no qual remetia os autos para o «Exmº Sr Juiz de Círculo a fim de ser proferida sentença (cfr. Artºs 58° e 60° n° 2 ambos do C. Exp-DL 168/99; 646 nºs 1 e 5 CPC e 106-b) L.O.T.J».

+Remetidos os autos veio este Sr Juiz de Circulo que declarou o Trib. de Circulo funcional/especificamente incompetente para apreciação dos subsequentes termos dos presentes autos.

+Veio de pois o expropriado suscitar o presente conflito.

+Cumprido o disposto nos artº 119° CPC: Nada foi dito.

+Cumprido o artº 120° CPC: O Mº Pº sustentou a competência do Sr. Juiz de Circulo de ........

+Cumpre conhecer do conflito salientando que os factos disponíveis são os atrás indicados.

+Face aos elementos constantes do conflito temos sérias dúvidas em apurar qual a questão ou questões concretas em discussão e daí que nos vamos debruçar sobre as que se nos oferecem como possíveis, assim procurando evitar quaisquer omissões ainda que correndo o risco de nos pronunciarmos sobre algo que não será absolutamente necessário.

Assim, abordaremos a problemática da competência entre Juízos Cíveis e Varas (embora saibamos que extravasa da questão posta, pensamos que muitos dos argumentos que apresentamos sobre tal questão terão grande interesse para a abordagem final do que temos verdadeiramente de decidir) para o desenvolver do processo de expropriação a partir da altura em que é remetido para Tribunal e, conexionado com este, a questão da intervenção ou não do Tribunal Colectivo, acabando por decidir sobre quem deve proferir a sentença em casos como o dos autos.

Vejamos, então, o que vimos entendendo acerca da competência dos Juízos Cíveis ou Varas, o que faremos dentro do espírito acima enunciado.

Tudo se prende com o saber-se a quem compete o processamento dos autos de expropriação antes ou após a interposição do recurso de arbitragem nos termos do artº 58° DL 168/99 de 18/9 quando em tal requerimento não tenha sido requerida a intervenção do Tribunal Colectivo, questão esta que abordaremos em conexão com a de saber quando, em processo de expropriação, deve ou não intervir este Tribunal e não o singular.

Anteriormente tomamos posição ligeiramente diferente da que agora vamos defender e expor mas que no essencial aponta no mesmo sentido (CJ 18/1/200-205).

Pensamos porém, que a agora proposta e mais correcta e já teve anteriores decisões em sentido semelhante embora também em relação a estas sigamos um percurso fundamentador ligeiramente diferente em alguns aspectos (Ver Conflitos n° 1367/03 e 476/02).

Com esta nova posição temos consciência que na construção jurídica (e só quanto à fundamentação pois quanto à decisão da competência são no mesmo sentido) nos afastamos ligeiramente da decisão do STJ no Agravo n° 1856/03 da 7ª Secção, que saibamos ainda não publicado, e que coincide com a que primeiramente defendemos e que está publicada na CJ acima referida.

Porém, com todo o respeito por opinião contrária, pensamos hoje que a solução que propomos é mais correcta pelas razões que se verão.

+Vejamos então, salientado que para melhor decidirmos e se compreender o que está em causa, começamos por fazer a abordagem do todo legislativo que disciplina a questão a decidir .

Nos termos do artº 97° n° 1-a) da L.O.E Func. Trib. Judiciais (Lei 3/99 de 13/1) compete ás Varas cíveis a preparação e julgamento das acções declarativas cíveis de valor superior à alçada do tribunal da Relação em que a lei preveja a intervenção do colectivo. Por seu lado o artº 99° estabelece que compete aos Juízos cíveis preparar e julgar os processos de natureza cível que não forem da competência das Varas e dos Juízos de pequena instância.

O artº 58° C. Exp. (Lei 168/99 de 18/9) regula o recurso da arbitragem e impõe que nele se exponham as razões das divergências, se ofereçam todos os documentos e provas e se requeira a intervenção do Tribunal Colectivo.

No sentido desta mesma necessidade de requerer o Tribunal colectivo logo nesta fase há também o artº 60° deste último diploma no que se refere à resposta e ao recurso subordinado.

Os artº 42°, 51º nº 1 e 54° n° 2 deste último diploma prevê os momentos em que o processo administrativo deve ser remetido a Tribunal.

Bem se sabe que o processo expropriativo comporta uma fase administrativa e outra contenciosa e esta «...embora apresente algumas especificidades, integra-se no exercício da função jurisdicional, sendo-lhe aplicáveis os princípios gerais reguladores do processo civil», como bem ensina Osvaldo Gomes in Expropriações por Utilidade Pública a pág. 369, desdobrando-se a primeira numa de tipo administrativo por excelência e outra que podemos chamar de pré-contenciosa mas que decorre em parte (por vezes, mesmo em grande parte-artº 42° n° 2 C. Exp.) no Tribunal, havendo ainda a fase de recurso.

Dentro do processo civil poderemos, convictamente, integrar o processo expropriativo como processo especial e que como tal será regulado pelas disposições que lhe são próprias, conforme o processo especial a usar, e pelas disposições gerais e comuns (que são, segundo os ensinamentos de J. R. Bastos in Notas ao CPC-artº 463° as constantes dos artºs 137° a 459°) e não estando aí prevenidas numas e noutras observar-se-á, então, o que se acha estabelecido no processo ordinário.

Ora de acordo com o artº 3° n° 1 CPC o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.

Esta disposição legal consagra na 1ª parte o princípio do dispositivo e no segundo o do contraditório (J R. Bastos nas sus Notas ao CPC-art- 3°) tendo aquele claras manifestações no processo de expropriação e desde logo, como salienta José O. Gomes, na ob. citada, a pág. 369, na possibilidade de recurso da decisão arbitra! e na de delimitarem o tema decidendum no requerimento de interposição de recurso (artº 52° e 58° C. Exp.).

Citando o Prof. A de Castro, nas suas Lições de Proc. Civil-1/167, a acção é um direito instrumental no sentido de que é, por meio dela que se deduz em juízo a afirmação de um direito substancial, trata-se, como também refere, de uma situação jurídica que se pretende ver reconhecida e identifica-se pelos sujeitos, causa de pedir e pedido.

Segundo o Prof. Manuel de Andrade nas suas Noções Elementares proc. Civil a pág. 3 acção é a pretensão de tutela jurisdicional formulada em juízo para determinada relação material de direito.

De acordo com os ensinamentos do Prof. J. de Castro Mendes in Drtº Processual Civil este direito resolve normalmente um conflito de interesses (pág. 62) e na acção ocorre uma causa de pedir e um pedido entendido este como uma pretensão material e processualmente determinada.(pág. 71 e segs).

Já J. Rodrigues Bastos, nas suas Notas ao CPC-nº 2°, na esteira de outros Professores, diz-nos que a acção pode ser vista como o direito à sentença num caso particular.

Como se sabe, uma verdadeira acção inicia-se com a petição inicial na qual é precisamente exposta a pretensão do autor, o pedido, apoiado em determinada causa de pedir (artº 467° CPC) o que constitui mera imposição daquele mesmo princípio do dispositivo (nº 3°), sendo com ela que se abre o litígio cuja decisão se pede ao Tribunal.

Como bem resume o Prof. A Varela no seu Manual de Proc. Civil a petição inicial é o articulado em que o autor propõe a acção formulando a tutela jurisdicional que visa obter e a acção considera-se proposta logo que seja recebida na secretaria (artº 267° CPC).

Por outro lado pensamos ser dado adquirido que a competência se determina pelo pedido do autor, de acordo com a identidade das partes e os termos em que a pretensão é apresentada (BMJ 394/453 3 431/554) e fixa-se no momento em que a acção é proposta (Ac Rel. Porto nos Sumários desta Relação n° 14/2.205 e artº 22° L. Org.).

De igual modo é certo que é com a petição e de acordo com o modo como surge desenhada a pretensão do autor que se deve determinar a forma de processo (BMJ 311/204).

Ora, a nosso ver, quando no artº 97° LOFTJ se atribui a competência das Varas para preparar e julgar «acções declarativas cíveis» o que se pretende abranger são precisamente as «Acções» com as suas características essenciais, tal como procuramos caracterizá-las atrás.

E tanto assim é que no artº 99°, ao fixar-se a competência dos Juízos Cíveis, já não se exige a «acção» bastando-se com os «processos de natureza cível» que como se sabe têm uma latitude bem maior do que as acções declarativas (tenhamos presente que segundo Soveral Martins in Drtº Proc, Civil 1/59, por Proc. Civil se deve entender a instância jurídica formalizadora da actividade de heterocomposição de pretensões de interesses a bens cometida aos tribunais judiciais, o que, portanto, é bem mais lato do que as acções declarativas a que se refere o cit. artº 97°).

Não se nos afigura que uma simples recepção de um processo em Tribunal que numa primeira fase se destina, normalmente á simples adjudicação da propriedade e posse e ás notificações já referidas (não se esqueça, porém, que a remessa a Tribunal pode ocorrer bem antes e para outras finalidades prévias as enunciadas, bastando ter presente o disposto nos artº 42° e 51 o C.Exprop.), possa ser visto como uma «acção»...

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