Acórdão nº 0343445 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Outubro de 2004
Magistrado Responsável | CONCEIÇÃO GOMES |
Data da Resolução | 13 de Outubro de 2004 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam em Audiência na secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1.
RELATÓRIO 1.1. No ..º Juízo Criminal do ....., o MP deduziu acusação em processo comum singular contra, B.........., devidamente identificado nos autos, imputando-lhe a prática, como autor material, sob a forma consumada, de um crime de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º do CP (fls. 153).
1.2. O ofendido C.......... constituiu-se assistente, aderiu à acusação pública e deduziu pedido de indemnização civil no montante global de 1.000.000$00, pelos factos constitutivos do crime acusado e ainda pelos factos susceptíveis de integrar a prática do amnistiado crime de injúrias (fls.166 e 167).
1.3. Efectuado o julgamento foi julgada a acusação pública procedente, por provada e, em consequência foi o arguido B.......... condenado como autor material e na forma consumada da prática de um crime de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, nº1, do CP, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de €50, o que perfaz o montante global de €3.500.
O pedido de indemnização civil foi julgado parcialmente procedente por provado, e em consequência foi o demandado B.......... condenado a pagar ao demandante C.........., a quantia de €750 a título de indemnização civil por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 10% até 22FEV99 (Portaria 1.171/95, de 25SET) e de 7% (Portaria 158/99, de 18FEV99), até efectivo e integral pagamento.
1.4. Inconformado com a sentença dela interpôs recurso o arguido que motivou, concluindo nos seguintes termos: "1.° O Tribunal a quo não procedeu, como lhe cumpria, através do competente funcionário de justiça ou de pessoa idónea, à transcrição das declarações e dos depoimentos prestados oralmente em audiência de julgamento com juiz singular, sendo certo que não foi prescindida a documentação (cf. Acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ, de 2003. Janeiro. 16, in «D. Rep.», 1 Série-A, de 2003.01.30); em tempo útil, tal transcrição; 2º Apesar de a ter requerido ao recorrente não foi entregue em tempo útil tal transcrição.
3.° Ficou, assim, o Recorrente impedido de - querendo, como quer e desde logo anunciou, impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto - especificar os pontos de divergência, por referência aos suportes técnicos; 4.° Cometeu-se, desta forma, uma irregularidade, manifestamente susceptível de prejudicar o direito do Arguido a impugnar a fixação da matéria de facto e que, por isso, afecta irremediavelmente o valor da omissão praticada; 5º Deve, pois, ordenar-se ao tribunal recorrido que mande transcrever as gravações efectuadas na audiência de julgamento, contando-se a partir da notificação da realização dessa transcrição o novo prazo para interposição do recurso da sentença [cf., supra, nºs 1 a 8]; 6° Foram violadas as normas jurídicas dos arts. 100º, nº 1, 101, nº2, 363º e 412º, nº4, CPP; Ad cavendum e sob reserva do exposto: 7º Foram incorrectamente julgados os pontos nºs 5,6,7,8, e 9 dos «factos provados»; 8° A motivação da sentença assenta, exclusivamente, nas declarações do Assistente e no depoimento da testemunha D..........; 9° Desses meios de prova não resulta, minimamente, a demonstração concreta e objectiva de que o Arguido tenha lesado o corpo ou a saúde do Assistente; 10° O «gesticular» ou o «agitar de braços», que aí se referem, não podem ser «interpretados» noutro sentido, nomeadamente no de representarem sinais materiais da prática de agressão; 11º Quanto muito, poderiam inculcar a existência de uma tentativa de agressão; corpo, designadamente na cabeça» (cf., supra, nºs 11 a 19); 12º Mas, no crime de ofensa à integridade física simples, a tentativa não é punível; 13º Devem, consequentemente, dar-se como não provados os pontos 7, 8 e 9 dos «factos provados» e, em relação ao ponto 5, dar-se apenas como assente que «vários indivíduos não identificados abeiraram-se do assistente e agrediram-no a murro, atingindo-o em diversas partes do corpo, designadamente na cabeça» (cfr. supra nºs 11 a 19).
14º. Não tendo cometido o acto ilícito de que foi acusado, o Arguido e Demandado não pode ser condenado a indemnizar o Arguido e Demandante; 15° A decisão sob censura violou as normas dos arts. 143º e 23º do Código Penal».
Termina pelo provimento do recurso, pugnando pela sua absolvição.
1.5. Na 1ª Instância houve resposta do Ministério Público e do assistente à motivação de recurso concluindo ambos pela sua improcedência.
1.6. O Exmº PGA emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso, 1.7. Foi cumprido o disposto no art. 417º, nº 2, do CPP.
1.8. Na sua resposta o arguido manteve a posição assumida na sua motivação.
1.9. Procedeu à documentação dos actos da audiência.
1.10. Foram colhidos os vistos legais.
1.11. Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo.
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FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Na sentença recorrida deram-se como provados os seguintes factos da acusação, do pedido de indemnização civil e da contestação 2.1.1 No dia 15 de Janeiro de 1999, da parte da tarde, realizou-se no "X..........", nesta cidade do ....., uma Assembleia Geral da Santa Casa da Misericórdia do .....; 2.1.2 Nessa Assembleia participou o arguido na qualidade de Provedor da Santa Casa da Misericórdia do ..... e nela participou também o assistente C..........; 2.1.3. Pelas 20h foram interrompidos os trabalhos da dita Assembleia; 2.1.4. Nessa ocasião, abeirou-se do assistente um indivíduo corpulento não identificado que agarrou o assistente; 2.1.5 Então o arguido e outros indivíduos não identificados abeiraram-se também do assistente e agrediram-no também a murro, atingindo-o em diversas partes do corpo, designadamente na cabeça; 2.1.6 Em consequência do descrito em 5, sofreu o assistente escoriações no braço esquerdo; 2.1 7 Agiu o arguido com o propósito de molestar, como molestou fisicamente o assistente; 2.1.8. Prevalecendo-se do facto de este se encontrar manietado pelo tal indivíduo corpulento acima mencionado e de agir conjuntamente com outros indivíduos; 2.1.9 Sabia o arguido que a sua conduta era criminalmente ilícita; 2.1.10 O assistente sofreu incómodos e grande vexame; 2.1.11 Na Assembleia acima referida estiveram presentes várias centenas de pessoas; 2.1.12 Os factos ocorridos na Assembleia acima referidos foram divulgados na comunicação social; 2.1.13 O arguido é administrador de empresas e aufere um rendimento mensal de cerca de 10.000 euros; 2.1.14. Habita em casa própria, vivendo com a mulher que é doméstica e tem uma filha maior a cargo; 2.1.15 Como habilitações literárias tem o 12° ano de escolaridade; 2.1.16 Não tem antecedentes criminais, tem bom comportamento posterior aos factos, e é uma pessoa considerada no meio social; 2.2. Na sentença recorrida deram-se como não provados os seguintes factos, da acusação e do pedido de indemnização civil, e com relevância para a discussão da causa, 2.2.1.que o arguido presidisse à Assembleia que teve lugar nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 1); 2.2.2. que o arguido tenha dito ao assistente, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 1) a 5) "filho da puta, vou-te Foder"; 2.2.3. que em consequência da actuação do aqui arguido o assistente tenha sofrido dores; 2.3. Na motivação probatória da decisão de facto consta o seguinte: «O arguido negou totalmente a prática dos factos, referindo que viu muita gente à volta do assistente, não sabendo identificar quais eram as pessoas que ali se encontravam e referiu ainda que quando se dirigia para a saída do refeitório, passou perto do local onde o assistente estava. Negou ter proferido quaisquer expressões ou ter tocado no assistente.
O assistente, apesar da forma alterada e nervosa com que prestou declarações, afirmou, no que foi convincente, que os factos foram consequência da intervenção que teve na mencionada assembleia não ter sido do agrado do arguido e de outros presentes. Assim, e quando os trabalhos já estavam suspensos e já se dirigia para a saída, viu o arguido aproximar-se de si, com uma mão levantada, sendo então agarrado por um indivíduo que não sabe identificar, de imediato sentindo duas pancadas, vendo que as mesmas foram desferidas pelo o arguido. Seguidamente, outras pessoas que não sabe identificar, atingiram-no por todo o corpo. Esclareceu que tais factos constituíram enorme vexame, por estarem presentes centenas de pessoas que tomaram conhecimento dos mesmos e ainda porque o ocorrido foi divulgado na comunicação social. Afirmou, no que não logrou convencer, que o arguido o apelidou de "filho da puta, vou-te foder", o que não foi confirmado por qualquer outra das testemunhas presentes, motivo pelo qual tal facto não foi...
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