Acórdão nº 0443880 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Setembro de 2005
Magistrado Responsável | FERREIRA DA COSTA |
Data da Resolução | 19 de Setembro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: 1. B................. (proc. n.º .....1/03.0TTVFR); 2. C............. (proc. n.º ....2/03.8TTVFR); 3. D............ (proc. n.º .......3/03.6TTVFR); 4. E........... (proc. n.º .......4/03.4TTVFR) e 5. F............ (proc. n.º ......5/03.8TTVFR), instauraram acções, que mais tarde foram apensadas, emergentes de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra G........, Ld.ª, alegando que trabalharam para a R., a quem comunicaram a rescisão do contrato de trabalho, invocando a Lei n.º 17/86, de 14 de Junho, pelo facto de se encontrarem retribuições em atraso, tendo formulado os seguintes pedidos: a) - A declaração de procedência da justa causa subjacente à rescisão do contrato de trabalho, enquanto resultante de uma situação de "retribuições em atraso" e b) - A condenação da R. no pagamento de uma indemnização de acordo com a antiguidade de cada um deles, acrescidas de juros, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Contestou a R., sustentando a inexistência de justa causa para as rescisões dos contratos e que, conhecendo os AA. as dificuldades que a R. atravessava, e sendo a parte das retribuições não pagas de diminuto montante, aqueles agiram com abuso do direito.
Os AA. responderam mantendo, no essencial, o alegado nas petições iniciais.
Realizado o julgamento e proferida sentença, foram as acções julgadas parcialmente procedentes e, em consequência, declarado que cada um dos AA. rescindiu com justa causa o respectivo contrato de trabalho e a R. condenada a pagar aos AA. as indemnizações de antiguidade, nos seguintes montantes: a) B............ - € 16.308,00; b) C............ - € 6.981,00; c) D............ - € 14.732,00; d) E............ - € 6.981,00 e e) F............. - € 18.795,00, acrescidas dos respectivos juros de mora.
Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpôr recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1. Para que o trabalhador possa accionar o mecanismo dos salários em atraso previsto na Lei n.º 17/86, de 14 de Junho, não é necessário que tenha a totalidade da retribuição em atraso.
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Mas não é também a falta de pagamento de qualquer parcela de retribuição que atribui ao trabalhador o direito de rescindir o contrato com fundamento em salários em atraso.
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No caso dos autos e tendo em conta as circunstâncias e as condições específicas que determinaram a existência do atraso do pagamento de uma parte pouco significativa dos salários não pode concluir-se que existia uma situação de salários em atraso.
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A Lei n.º 17/86 não define o conceito de justa causa pelo que tal conceito é aquele que vem referido no regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e do contrato de trabalho a termo (Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro) para o despedimento promovido pela entidade empregadora.
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Para que exista justa causa, necessário se torna a verificação cumulativa de dois requisitos: um objectivo constituído por um comportamento culposo traduzido na violação grave dos deveres profissionais ou contratuais por parte do trabalhador ou do empregador; outro, objectivo traduzido na impossibilidade de manutenção da relação laboral.
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Ora, prescindindo a lei, no caso de salários em atraso, do elemento subjectivo (culpa) não prescindiu do elemento objectivo, ou seja, da prova de que a violação dos deveres contratuais foi de tal modo grave que impossibilitou a manutenção da relação laboral.
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No caso dos autos, a parte do salário não paga (50%) não foi muito significativa e, sobretudo, os AA. não aguardaram pelo prazo normal de pagamento, pelo que nestas circunstâncias não poderá considerar-se que se tenha tornado impossível a manutenção da relação laboral.
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A R. vinha atravessando, desde muitos meses antes da data dos despedimentos, grave crise económico-financeira.
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Durante os vários meses que precederam a data dos despedimentos, a R. vinha pagando os salários com atrasos.
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A sua disponibilidade financeira para pagar salários estava totalmente dependente do pagamento, por parte dos clientes, das mercadorias que a R. lhes vendia.
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A R. vinha pagando os salários com atrasos, ou seja, aos dias 8, 10, 15 ou mesmo data posterior.
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Este facto era do conhecimento dos AA.
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Perante estas circunstâncias de facto, nomeadamente a não totalidade da retribuição em falta mas sobretudo o facto de os AA. terem aguardado apenas um curto lapso de tempo (4 dias a maioria, 6 dias, 2 trabalhadores) para rescindir o contrato bem sabendo que, normalmente, a R. pagava com atrasos superiores, forçoso é concluir que os AA. excederam os limites impostos pela boa fé e pelo fim económico e social do direito.
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Os...
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