Acórdão nº 0453927 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Fevereiro de 2005
Magistrado Responsável | MARQUES PEREIRA |
Data da Resolução | 14 de Fevereiro de 2005 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Cível da Comarca do .........., B.........., Lda intentou acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra C.........., Lda., pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de €56.623,54, correspondente ao valor dos alugueres pagos pela Autora durante o período em que não pôde usufruir do veículo alugado.
A não se entender assim, a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de €19.153,84, correspondente à desvalorização sofrida pelo veículo durante o mesmo período.
E ainda nos juros vencidos desde a citação até integral pagamento.
Alegou, para tanto, e em resumo, os seguintes fundamentos: _Em 03/08/99, a Autora celebrou com a Ré um contrato de aluguer de longa duração de um veículo novo, de marca Jaguar, modelo .........., com a matrícula n.º ..-..-NU, conforme documentos juntos; _No referido contrato, figura como fornecedor a sociedade comercial D.........., Lda; _Na mesma data, celebrou com a Ré contrato de promessa de compra e venda do referido veículo, venda que seria realizada no término do mencionado aluguer; _A Autora procedeu ao levantamento do veículo, mas não lhe foram entregues os respectivos documentos (livrete e título de registo de propriedade), comprometendo-se a Ré a fazê-lo no prazo de um mês; _O veículo destinava-se a uso da gerência da Autora no exercício das suas funções; _A Autora pagou integralmente as quantias estabelecidas no contrato de aluguer; _Por falta dos respectivos documentos, a Autora não pôde, porém, circular com o veículo durante um ano e dois meses, o que lhe acarretou prejuízos que indica; _O veículo sofreu, durante o período em que esteve imobilizado, uma desvalorização de 32%.
A Ré contestou, por impugnação, pedindo a improcedência da acção e requerendo o chamamento da sociedade D.........., Lda. nos termos do art. 330 e ss. do CPC.
Deferido o chamamento, a chamada contestou, pedindo a improcedência da acção e requerendo, por sua vez, a intervenção acessória provocada de E.........., Lda.
Este último incidente veio a ser indeferido, por despacho de fls. 112.
O processo prosseguiu os seus termos, tendo sido realizada a audiência de julgamento (com gravação das provas) e proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a Ré a pagar à Autora a quantia em euros correspondente a 10.320.000$00, acrescida de juros de mora, desde a citação até integral pagamento. Custas pela Ré.
Apelou a Ré, terminando a sua alegação de recurso, com estas conclusões: a) A sentença recorrida atribuiu à Apelante a responsabilidade civil pelos alegados prejuízos que a Apelada teria sofrido por não ter recebido os documentos necessários à circulação do veículo locado por aquela a esta, sem que esteja verificado um único dos pressupostos de tal responsabilidade; b) Desde logo, não recaía sobre a Apelante qualquer obrigação de entregar os citados documentos, já que a sua emissão cabe em exclusivo às autoridades competentes e a sua obtenção cabe em exclusivo ao Importador do veículo em causa; c) Por outro lado, também não cabia à Apelante uma qualquer obrigação de meios, que não de resultado, já que, de acordo com o estabelecido no contrato celebrado entre Apelante e Apelada, era esta que mantinha relações negociais com o fornecedor do veículo, por cuja escolha assumiu plena responsabilidade; d) O contrato celebrado entre a Apelante e a Apelada é um contrato misto de locação e de compra e venda, surgindo a locadora como entidade financiadora da aquisição do veículo e mantendo o locatário relações directas com o fornecedor; e) Cabia exclusivamente à Apelada assegurar, junto do fornecedor, a obtenção dos documentos do veículo locado; f) Aliás, durante meses e meses, e mesmo depois do veículo ter supostamente deixado de ser utilizado, a Apelada assumiu integralmente o encargo de obter os documentos do veículo, não tendo sequer comunicado à Apelante que ainda não os tinha em seu poder; g) Só quando concluiu que não conseguia obter do fornecedor os documentos em causa, é que a Apelada resolveu atribuir à Apelante tal encargo; h) Em suma, a Apelada, que entregou no momento da celebração do contrato de ALD todos os elementos necessários para a obtenção dos documentos, não incumpriu nenhuma obrigação, pelo que não cometeu qualquer acto ilícito; i) Tendo a Apelante praticado todos os actos necessários à obtenção dos documentos, e desconhecendo a Apelante em absoluto que a Apelada não havia logrado receber esses mesmos documentos, é manifesto que a Apelante não agiu com qualquer espécie de culpa; j) A condenação constante da sentença recorrida não representa um ressarcimento de hipotéticos prejuízos da Apelada, mas um enriquecimento escandaloso desta, com o correspondente empobrecimento da Apelante; k) Não existe nenhum nexo causal entre um qualquer acto ou omissão da Apelante e os hipotéticos prejuízos da Apelada; I) A sentença recorrida, sem pôr em causa a validade do contrato celebrado entre a Apelante e a Apelada ou de qualquer das suas cláusulas, decidiu em sentido rigorosamente contrário ao acordado contratualmente pelas partes; m) Na verdade, tendo as partes expressamente estabelecido que as rendas são sempre devidas, ainda que o equipamento não possa ser utilizado, a sentença recorrida decidiu que as rendas não eram devidas por o equipamento não poder ser utilizado; n) A sentença recorrida violou, assim, pelo menos o disposto nos arts. 405° e 483° do Código Civil.
Não houve contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Na 1.ª instância, foram dados como provados os seguintes factos: a) A Ré é uma sociedade comercial que, pelo menos, exerce a actividade de Aluguer de Longa Duração de veículos. (A) b) A Autora, em 03/08/1999, celebrou com a Ré um contrato de aluguer de longa duração de um veículo novo, de marca "Jaguar", modelo "..........", ao qual foi atribuída a matricula ..-..-NU, junto a fls. 7 e 8 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (B) c) No referido contrato, além da Autora e da Ré, nas suas condições de Locatário e Locadora, respectivamente, surge como fornecedor do veículo identificado em b) a sociedade comercial "D..........". (C) d) No identificado contrato, em conformidade com as suas condições gerais e particulares, foi estabelecido um depósito caução no valor de Esc. 1.032.000$00, ficando a Autora obrigada ao pagamento de 12 rendas mensais de igual valor, ou seja, de Esc. 1.032.000$00, acrescido das despesas de contrato, no valor de Esc. 23.400$00. (D) e) Na sequência do contrato celebrado, a Autora, em 03/08/99, efectuou o levantamento da viatura no estabelecimento comercial "D.........., Lda", a qual, em 26/07/99, facturou e recebeu da Ré a quantia de Esc. 12.000.000$00, para pagamento do respectivo veículo. (E) f) A Autora procedeu ao levantamento do veículo identificado em b), mas não lhe foram entregues o livrete nem o registo de propriedade. (F) g) Nessa altura foram entregues à Autora o contrato de ALD e o documento cuja cópia se encontra junta a folhas 42 dos autos, documento esse que permitia a circulação do veículo em questão pelo prazo de 30 dias. (G, 21° e 220) h) Teor integral da certidão emitida pela DGI, junta de folhas 89 a 98 dos autos, aqui dado por reproduzido. (H) i) A Autora procedeu ao pagamento de todos os alugueres mencionados em d).
j) Simultaneamente à celebração do contrato mencionado em b), entre Autora e Ré foi celebrado um contrato promessa de compra e venda que tinha como objecto o referido veículo. (2°) k) A venda do veículo coincidiria com o término do contrato referido em b), sendo o preço da venda de Esc. 882.051$00. (3°) I) O veículo destinava-se ao uso da gerência da Autora, para o exercício das suas...
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