Acórdão nº 0454405 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Outubro de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução06 de Outubro de 2004
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto O Município de ...............

, instaurou em 11.3.99, pelo Tribunal de Círculo de .............. - actualmente .. Juízo Cível - acção declarativa de condenação com processo ordinário (despejo) contra: "B.............., Lda.".

Alegando, em resumo, que deu de arrendamento à ré um estabelecimento de café sito em ..............., mas este nunca o abriu a público e realizou ali obras que alteraram e ampliaram o local; também sofreu danos com esses factos.

Conclui pedindo que se decrete a resolução imediata do contrato de arrendamento, devendo a Ré ser condenada a proceder à entrega do arrendado e a pagar-lhe a quantia que se vier a determinar em execução de sentença, pelos danos presentes e futuros.

Citada a Ré, veio esta contestar, defendendo-se por impugnação e por excepção: em suma, alega que o Autor age em abuso de direito, que caducou o direito de pedir a resolução do contrato de arrendamento pelo decurso do prazo legal de um ano; impugna, ainda, a matéria peticionada, invocando que as obras estavam a ser acompanhadas e autorizadas pelo autor.

Conclui pela improcedência da acção, devendo ser absolvida do pedido.

Replicou o Autor, respondendo à excepção do abuso de direito e à da caducidade.

Conclui pela improcedência das excepções e como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador e de condensação processual, peça esta que foi alvo de reclamações, parcialmente atendidas.

Teve então lugar, na comarca de ............., a audiência de discussão e julgamento, segundo os legais formalismos, sendo proferido despacho de resposta à base instrutória, peça isenta de reclamações.

*** A final foi proferida sentença que: - Julgou procedentes as excepções de abuso de direito e de caducidade, alegadas pela ré e, em consequência, absolveu a Ré de todos os pedidos formulados pelo Autor.

*** Inconformado recorreu o Autor que, alegando, formulou as seguintes conclusões: I. Consta da al. E) da matéria especificada que o arrendatário ficou autorizado a fazer as obras necessárias à adaptação do local ao fim a que se destina - trata-se da reprodução do constante da clª 5ª do contrato de arrendamento; II. Esta cláusula do contrato de arrendamento consigna expressamente a autorização do arrendatário à execução das obras necessárias à adaptação do local ao fim a que se destina; III. O arrendado destinava -se "a estabelecimento de café, restaurante e pastelaria" como resulta da conjugação do alegado nos art°s 4º da p.i. e 83° da contestação; IV. As obras que o contrato autorizava eram assim, por um lado, as necessárias ao exercício desta actividade, isto é, ao exercício da actividade de café, restaurante e pastelaria e por outro lado obras a ser executadas no arrendado e não fora dele, nem para além dos seus limites; V. A Ré não alegou nem provou que para exercer a concreta actividade que se propunha, tinha de executar obras que constituíssem na completa adulteração do arrendado representada pela construção de duas caves que o arrendado não possuía, e no prolongamento do arrendado para além dos seus limites físicos, acrescentando-lhe uma área de mais cerca de 60 m2.

  1. As obras autorizadas no arrendado só podiam ser as que fossem efectuadas no arrendado com a sua precisa configuração, área, número de pisos e até aspecto exterior.

  2. A construção de duas caves e ampliação do rés-do-chão em cerca de 60 m2, bem como as melhores identificadas nas als. G), J) a II) da Base Instrutória e na resposta aos quesitos 3° e 10°, excedem o âmbito do arrendado e, consequentemente, o âmbito da autorização ínsita naquela cláusula contratual.

  3. A douta sentença por assim o não ter entendido efectuou errada interpretação da clª 5ª do contrato de arrendamento e, consequentemente, errada interpretação da matéria de facto provada (als. J) a z) e AA) a II)).

  4. A execução das obras em edifícios, nomeadamente obras como aquelas que a R. levou a cabo no arrendado, carecem licenciamento municipal.

  5. Enquanto entidade licenciadora de obras o Autor não licenciou as obras nem as autorizou e para tanto basta compulsar o processo burocrático junto aos autos, nele não se encontra qualquer despacho ou deliberação autorizativa ou licenciadora daquelas obras.

  6. O que a lei actualmente em vigor D.L. 555/99, quer os diplomas que a antecederam D.L. 445/91 e D.L.1 66/70, este último em vigor à data em que a R. iniciou as obras, submetiam a prévio licenciamento municipal a execução das obras de construção, ampliação ou recuperação de edifícios.

  7. Serve isto para dizer que sem autorização/licenciamento municipal, isto é, do Autor, a R. não podia nem devia ter levado a cabo as obras que executou.

  8. Acresce ao que antes já foi referido que a R. não logrou provar a autorização/licenciamento das aludidas obras, a qual só poderia revestir a forma de despacho ou deliberação do órgão Executivo que a R. não apresentou por, obviamente, não existirem.

  9. A organização democrática do Estado compreende a Autarquia Local, sendo esta é uma pessoa colectiva territorial dotada de órgãos representativos.

    O Município é uma das categorias de autarquias locais dotadas de órgão executivo colegial (Câmara, que aliás, é um seu órgão representativo colegial) - v. art°s 235°, 236°, 250 e 252° da C.R..

    Por sua vez os art°s 2°, n° 2 e 1 3° do CPA estabelecem que órgãos das autarquias locais são órgãos da administração pública.

  10. As decisões do Município são tomadas através de deliberações em reunião do órgão executivo (Câmara).

    Assunto que o CPA, nos art°s 1 4° a 28°, trata com o devido desenvolvimento.

  11. A forma de decisão do Município através do seu órgão representativo (Câmara) é a de deliberação tomada em reunião do seu órgão, prevendo ainda a lei a possibilidade da delegação de competências da Câmara, quer no seu Presidente quer em qualquer um dos seus Vereadores.

  12. Por sua vez, o Regime Jurídico das Autarquias (Lei 100/84 e posteriormente Lei 169/99) regula o exercício de competências, quer da Câmara, quer do próprio Presidente.

  13. O Município vincula-se assim, seja através das deliberações da Câmara, seja através de despachos do seu Presidente ou dos seus Vereadores.

  14. Percorrendo todos os documentos juntos aos autos, processo burocrático incluído, não se encontra deliberação nem despacho que tenha autorizado aquelas obras.

  15. Tanto assim é, que a R. não logrou (e a ela cabia fazer tal prova), apresentar documento de acta de reunião e deliberação da Câmara ou de despacho do seu Presidente ou Vereador, dos quais conste terem as obras sido autorizadas.

  16. Consequentemente a douta sentença, não podia ter dado como provado o que consta da resposta dada aos quesitos 4°, 5º, 6º e 25°, pois que nenhum despacho ou deliberação referem o pressuposto conhecimento do desenrolar e amplitude das obras.

    Respostas estas cuja alteração se requer seja efectuada.

  17. Decidindo de modo diferente e designadamente ao não atender, omitir e desconhecer na ponderação da sentença as normas atrás referidas, a sentença recorrida violou as mesmas normas e fez errada aplicação do direito, e violou os art°s 235°, 236°, 250°, 252° da C.R., 2°, n°2, 13°, 14° a 28° do CPA, a Lei 100/84 e o D.L. 166/70.

  18. A R. iniciou obras no arrendado com a assinatura do contrato de arrendamento, em Outubro de 1989, obras essas que ainda decorriam, encontrando-se na fase de trolharia, quando foram embargadas por despacho, de 23.6.98, do Presidente da Câmara - v. als. LL) e MM) da matéria assente; XXIV. A execução das obras foi assim um facto continuado que persistiu até ao embargo efectuado em 29.7.98.

  19. A acção foi proposta em 11.3.99 e, portanto, menos de um ano após o embargo da obra.

  20. O art. 65° do RAU, estabelece, que a acção de resolução tem de ser proposta dentro de um ano a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento sob pena de caducidade.

    Porém, nos termos do n°2 do mesmo preceito quando se trata de facto continuado e duradouro o prazo de caducidade conta-se a partir da data em que o facto tiver cessado.

  21. As obras invocadas como fundamento do despejo, são mais concretamente obras que "alteram substancialmente a estrutura e configuração do prédio arrendado" ou seja, as obras que consistiram na construção de duas caves que o arrendado não possuía e a ampliação do rés-do-chão do arrendado acrescentando-lhes uma área de mais de 60 m2.

  22. A natureza e alcance dessas obras e o modo como alteraram o arrendado, só vieram a ocorrer e permaneceram com a execução dessas mesmas obras, e ao longo dessa mesma execução; XXIX. O ilícito invocado não são as obras, mas a natureza destas; por isso o facto ilícito não é instantâneo mas continuado e, consequentemente, a disposição legal aplicável é o art. 65°, n°2, do RAU.

  23. Ao efectuar a subsunção dessas obras no n°1 do art.65° do RAU, a douta sentença recorrida violou quer o n°1 e 2 dessa mesma disposição e fez errada aplicação do direito aos factos.

  24. Caso de força maior, considera-se o que é causado pela guerra, prisão, roubo, etc., isto é, trata-se de algo eventualmente previsível mas que não pode ser evitado em si nem nas suas consequências.

  25. O caso de força maior nunca é nem decorre de acto do próprio, sendo por isso incorrecto qualificar como caso de força maior o encerramento do estabelecimento por quase nove anos, em consequência de obras executadas pela própria R., ou pelas dificuldades decorrentes da afluência de água que resultou da emergência de uma nascente que foi igualmente consequência dos trabalhos executados pela R. com a construção de caves que o arrendado não possuía.

  26. Obras necessárias no caso significam apenas as necessárias á adaptação do local ao fim a que se destina, ou seja café, restaurante e pastelaria.

  27. Obras necessárias seriam assim exclusivamente as que fossem imprescindíveis e adequadas a que no local arrendado, com os seus precisos limites físicos aquando da celebração do contrato, pudesse ser exercida aquela concreta actividade constante do objecto do contrato.

  28. Deste ponto de vista, as obras...

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