Acórdão nº 0530823 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Abril de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelPINTO DE ALMEIDA
Data da Resolução14 de Abril de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

B.........., SA intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra C.......... e mulher D.......... .

Pediu que os réus sejam condenados a pagar a quantia de €160.395,32, acrescida de juros de mora contados desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Como fundamento, alegou, em síntese, que foi celebrado contrato de arrendamento entre o réu, como senhorio, e a sociedade "E..........", destinado à afixação de publicidade, parqueamento de viaturas de exposição e venda e atendimento de potenciais compradores sendo que a inquilina cedeu a sua posição à autora.

Esta, por seu lado, levou a cabo obras de melhoramento que importaram em 32.156.374$00, obras essas necessárias para os fins do arrendamento. A autora solicitou depois que o réu marcasse a escritura pública necessária não tendo tido resposta pelo que informou este último que já não tinha interesse no objecto locado, pedindo o pagamento da quantia empregue nas obras em causa.

Os RR. contestaram, alegando que as obras realizadas pela autora não eram necessárias para as finalidades do locado e que não tiveram o valor alegado pela autora.

Concluíram pela improcedência da acção.

Percorrida a tramitação normal, veio a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou os réus a pagarem à autora a quantia correspondente ao aumento do objecto locado e identificado em 1. tendo por referência a data da celebração do contrato e a data da citação para a presente acção, quantia essa a liquidar em execução de sentença, e sem exceder o pedido desta acção.

Discordando desta decisão, dela interpuseram recurso os RR., de apelação, tendo apresentado as seguintes Conclusões: 1. Os Apelantes entendem que não é legítimo aos Apelados pretenderem ser indemnizados pelas obras realizadas no terreno, desde logo porque as mesmas são voluptuárias e portanto apenas serviram para a sua comodidade, no âmbito do fim específico do negocio a que se dedicava a Apelada.

  1. A matéria de facto dada como provada sempre e só refere que as benfeitorias em causa apenas servem para conferir ao locado uma maior comodidade, tendo em atenção a actividade a que a autora se dedicava, classificando depois as mesmas como sendo benfeitorias úteis, em manifesta contradição com os factos assentes.

  2. A recíproca e singela expectativa negocial, traduzida na rentabilização de um determinado espaço para um determinado fim, deve em si conter os limites do risco a que cada uma das partes se sujeita pela contratação.

    A ordem jurídica tutela essa expectativa, dela extraindo os limites de razoabilidade, sendo certo que é manifestamente abusivo que, através de uma posterior cessão de posição contratual, surja uma entidade não considerada no acordo celebrado, com alegados critérios de exigência manifestamente excessivos em relação às objectivas condições do locado, extrapolando desta forma o âmbito previsível das expressas declarações de vontade contidas no contrato.

  3. A tutela do Direito não se concebe apenas na defesa das expectativas contratuais positivas, aquelas que as partes expressamente pré-configuraram na formação da vontade que as levou a contratar.

    A tutela do Direito, antes e também, é chamada a pronunciar-se sobre as obrigações posteriormente geradas de forma manifestamente inesperada, inopinada e excêntrica face ao equilíbrio inicial contratualmente procurado.

    Essas obrigações configuram-se com absoluta autonomia, muito embora encontrem a sua eventual génese e justificação no contrato inicial, sendo certo que ultrapassam o âmbito do contratado como consequências indirectas e não previstas da relação jurídica inicial.

    Tratando-se de obrigações não assumidas nem pretendidas, que em si poderiam facilmente conter o desrespeito pela essencial e inicial formação da vontade de contratar, é necessária especial cautela da ordem jurídica para evitar unilaterais excessos de prestação exigível.

  4. Uma conduta não prevista, não autorizada e unilateral de uma das partes contratantes, sendo susceptível de gerar, de forma potestativa, uma nova e autónoma obrigação, que se irá impor de forma inelutável à contraparte, vai traduzir-se, naturalmente, em manifesto desequilíbrio em relação às prestações essenciais ou previsíveis, ou seja, aquelas que será razoável exigir tenham sido ponderadas pelo cidadão médio, na sua conduta e relação jurídica com os restantes.

    É manifestamente abusivo o exercício do direito que a Apelada pretende ver reconhecido por sentença, sendo o recurso à figura de abuso de direito o meio apropriado para ferir de ilicitude a situação que os autos espelham.

  5. Julgando como julgou, o Tribunal a quo fez má interpretação do estabelecido no artigo 216°, violou as regras contidas nos artigos 1273° e 1275° e fez má aplicação do preceituado no artigo 334°, todos do Código Civil, sendo igualmente certo que a sentença proferida padece da nulidade contida na alínea c) do n° 1 do artigo 668° do Código de Processo Civil.

    Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença proferida e, em consequência, absolvendo-se os Apelantes do pedido.

    A A. contra-alegou, concluindo pela improcedência do recurso.

    Após os vistos legais, cumpre decidir.

    II.

    Questões a resolver: - se a sentença é nula, por contradição entre a decisão e os respectivos fundamentos; - se as obras realizadas pela A. constituem benfeitorias úteis ou voluptuárias; - se a pretensão da A. integra abuso do direito.

    III.

    Na sentença recorrida foram considerados provados estes factos: 1. Por acordo escrito com data de 10 de Março de 1997, o Réu na qualidade de proprietário de um prédio rústico denominado ".........." sito no .........., freguesia de .........., concelho...

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