Acórdão nº 0533279 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Julho de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSALEIRO DE ABREU
Data da Resolução14 de Julho de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I.

B............... e C.............., divorciados, intentaram no Tribunal Judicial de Matosinhos acção declarativa, com processo ordinário, contra D........... & Filhos, Ldª, alegando, em síntese, que: Os AA. foram casados entre si, tendo o casamento sido dissolvido por divórcio decretado em 2.5.2001; Por contrato-promessa celebrado em 1.3.2000, o Autor prometeu comprar à Ré, e esta prometeu vender-lhe, uma fracção autónoma destinada a habitação, designada pela letra G, de um prédio em construção na Av. da ....., em Leça da Palmeira, pelo preço de esc. 53.800.000$00; Os AA. pagaram à Ré, naquela data, de sinal, a quantia de esc. 5.380.000$00 e a parte restante seria paga em prestações, nos termos constantes do contrato; Pouco tempo após a assinatura daquele contrato, os AA. entraram em situação de ruptura conjugal irreversível, tendo o A. encetado diligências no sentido de ceder a sua posição no contrato, facto que teve o inteiro apoio da Ré; Por carta de 21.02.2001, a Ré comunicou ao A. a resolução do contrato-promessa, com fundamento na falta de pagamento das prestações vencidas em 1.7.2001 e 1.11.2001; porém, Os AA apenas haviam incorrido, e quando muito, em mora; Assim sendo, foi a Ré quem, com a declaração de resolução do contrato, incorreu em incumprimento contratual definitivo; Para além disso, o contrato-promessa é nulo, dado que as assinaturas não foram presencialmente reconhecidas por notário, nem do contrato consta a certificação, pelo notário, da existência da licença de construção.

Concluíram pedindo se condene a Ré a pagar aos Autores a quantia de € 53.670,55, acrescida de juros desde a citação, por incumprimento definitivo do contrato, por culpa exclusiva da Ré; subsidiariamente, pediram a declaração da nulidade do contrato-promessa e a condenação da Ré a restituir-lhes a quantia de € 26.835, recebida a título de sinal, com juros desde a citação.

Contestando, a Ré excepcionou a incompetência territorial do Tribunal e a ilegitimidade da A. por não ter intervindo no contrato-promessa; alegou a recusa do A. em cumprir o contrato, com a anuência da A.; e a concordância do A. com a omissão dos formalismos no contrato-promessa.

E, deduzindo reconvenção, pediu se declarasse a resolução do contrato, por alegado incumprimento definitivo dos AA., com direito da Ré fazer sua a quantia de 5.380.000$00, entregue pelo A. a título de sinal.

Os AA. replicaram, em articulados autónomos, concluindo pela improcedência das excepções e da reconvenção.

Julgada procedente a excepção da incompetência e remetido o processo às Varas Cíveis do Porto, aqui foi proferido despacho saneador, em que se decidiu ser a A. parte legítima.

Seleccionada a matéria de facto tida como assente e fixada a base instrutória, o processo seguiu a sua normal tramitação, tendo, a final, após audiência de discussão e julgamento, sido proferida sentença em que se decidiu: Julgar a acção improcedente quanto ao pedido principal; mas julgá-la parcialmente procedente quanto ao pedido subsidiário, condenando a Ré a ver declarado nulo o contrato-promessa de fls.11 e seg.s e, por via disso, a restituir ao A. B.......... o sinal entregue de € 26.835,33, acrescido de juros à taxa legal de 4% desde a citação; Julgar a reconvenção improcedente, absolvendo-se os AA. do pedido contra eles formulado.

Inconformados, ambas as partes apelaram, tendo os AA. terminado a sua alegação com as seguintes conclusões: As alíneas r) e t) dos factos provados (FP) encerram em si conclusões e não factos, pois as expressões "estava em situação de não poder cumprir o contrato" e "a quem comunicou a sua indisponibilidade para cumprir o contrato", não traduzem qualquer realidade fáctica, antes conclusões, deduções ou proposições finais de raciocínio, além de que ainda integra conceitos de direito ("de não poder cumprir o contrato" (alínea r)) e "para cumprir o contrato" (alínea t)); Ademais, o significado de indisponibilidade ("qualidade ou estado do que é indisponível") ou seja "que não se pode dispôr, inalienável", não pode ter cabimento no contexto da restante matéria da alinea t) dos factos provados; Não existem nos autos factos escoradores daquelas generalidades, nem a R. os alegou; Assim, tal matéria (alíneas r) e t) dos FP), deve considerar-se por não escrita - por aplicação analógica do nº 4 do art. 646º do CPCivil; Por outro lado, cotejando o que se acha provado nas alíneas g), I), m), n) o) e p) com as alíneas r), s) e t) dos FP, teremos forçosamente de concluir que ocorre evidente contradição entre umas e outras; Se é certo e ficou provado que: 1) estava contratualmente convencionada a possibilidade da cedência da posição contratual do A. apelante; 2) no decurso do mês de Junho de 2000, o A. apelante reuniu com a Ré apelada, dando conta do seu desentendimento conjugal com a sua esposa e do seu inevitável desfecho em divórcio; 3) a R. apelada manifestou lamento e absoluta compreensão pelo inesperado; 4) pouco tempo depois dessa reunião de Junho de 2000 com a R. apelada, o A. apelante assumiu perante aquela a pretensão de ceder a sua posição contratual no contrato-promessa; 5) várias firmas de mediação imobiliária (Réplica, Vila Azul e FBP) trataram de colocar imediatamente em venda a fracção em apreço com vista à cedência da posição de promitente comprador, mediante contratos de mediação imobiliária celebrados em Setembro e Outubro de 2000; 6) tal actividade de mediação durou ininterruptamente meses; 7) estando a R. apelada inteiramente a par da mesma - não é aceitável que se dê como também provado, neste contexto e período de tempo, que, quer na 1ª reunião havida com a R. apelada (aquela em que foi comunicada a ruptura conjugal irreversível), quer na reunião seguinte (concretamente, a de 13 de Julho de 2000), o A. apelante tenha comunicado indisponibilidade para cumprir o contrato; Deste modo, o conteúdo das alíneas r) e t) dos FP é logicamente incompatível com o conteúdo das alíneas g), I), m), n), o) e p), o mesmo é dizer que não podem subsistir utilmente nos autos umas e outras; Quem age como o A. apelante agiu, quer cumprir (ou tudo faz para cumprir) a relação contratual, não fazendo o menor sentido aceitar - ao mesmo tempo que consideramos estes factos - a ideia, dedução ou conclusão de indisponibilidade para o cumprimento; Ocorre igualmente clara contradição entre as mesmas alíneas r) e t) com a alínea h) dos FP; Na alínea h) dos FP, alude-se à carta que a R. apelada dirigiu ao A. apelante, com data de 21.02.2001. Nela a R. apelada exarou, ipsis verbis: "vimos por este meio registar a circunstância de se encontrar em situação de incumprimento no contrato-promessa de compra e venda supra referenciado, por não ter procedido ao pagamento das prestações vencidas em 01 de Julho de 2000 e 01 de Novembro de 2000; Tal incumprimento dá-nos o direito de proceder à resolução do C.P.C. V., o que fazemos através desta carta, para produzir efeitos a partir da data de recepção desta comunicação - cfr. fls. 25 dos autos; Como se vê claramente do texto da missiva, o que a R. invoca para o rompimento contratual a seu favor é o não pagamento das ditas prestações pecuniárias - aliás, assim ficou provado com a redacção da alínea h) dos FP.

Não que o A. apelante tivesse afirmado, aludido, referido, comunicado à R. apelada, em determinado local, reunião, dia e hora, não querer levar por diante aquele contrato; Ora, esse invocado fundamento é incompatível com a alegação de que o A. apelante comunicou indisponibilidade para cumprir, como não faz sentido que essa comunicação possa ter ocorrido no mesmo momento (reunião) em que aquele comunicou à R. apelada a pretensão de ceder a sua posição contratual; Perante as contradições expostas e evidenciadas entre a supra referenciada matéria de facto (g), h), J), m), n), o) e p) dos FP (alegada pelos AA. apelantes) e a matéria contida nas alíneas r) e t) dos FP, bem assim, por inerência ou arrastamento, a da alínea s), todas resultado de alegação da R. apelada - considera-se que esta última foi incorrectamente julgada, pelo que se impõe modificar a decisão de facto quanto à mesma, considerando-a como não provada; Isto porque os factos provados e constantes das alíneas g), I), m), n), o) e p) (alegados pelos A. apelantes) resultam, ora de confissão do representante legal da R. apelada, ora da prova testemunhal apresentada pela própria R. apelada (cfr. julgamento da matéria de facto de fls. 246v., onde se refere "nº 1 a 8"), como ainda do contrato dos autos e dos documentos de fls. 143, 144 e 194, 195 (nunca impugnados no processo); Quanto ao meio de prova que constitui o documento/carta de fls. 25, nunca o mesmo sofreu qualquer tipo de censura nos autos, motivo pelo qual, logo no despacho saneador, se considerou como Matéria Assente o facto que veio a integrar a alinea h) dos FP; Quanto à prova da versão da R. apelada (alíneas r), s) e t) dos FP), assentou toda ela no depoimento da testemunha E......... (funcionário de uma empresa pertencente ao grupo da R.) sendo certo que esta, ao referir que: 1 ) o A. B......... "tinha lá agências a tentar vender o apartamento"; 2) lhe foi proposto pela A. C........ e referidos acompanhantes que incluísse na agência da R. apelada a fracção em causa para ser vendida - o que foi rejeitado por esta com o pretexto que teriam de vender, primeiro, as outras fracções do empreendimento; 3) as pessoas estavam a tentar resolver o problema; 4) nunca houve intenção de dizer "não cumpro" - não falou verdade, quando inquirido acerca da alegada indisponibilidade do A. apelante para cumprir, revelando-se, nessa parte, depoimento influenciado pela relação de dependência trabalhador/empregador, não credível e inadmissível face às regras da experiência comum; Por tudo, pois, não pode merecer qualquer crítica ou censura a tese...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT