Acórdão nº 0534230 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJOSÉ FERRAZ
Data da Resolução06 de Outubro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I - B.........., LDA, com sede em .........., instaurou acção declarativa ordinária contra C..........., com domicílio em .........., alegando em suma que adquiriu, por trespasse, um estabelecimento comercial de venda de materiais em pele, que funciona em fracção autónoma arrendada pertencente ao réu, e que, no locado começaram a aparecer infiltrações e humidades, provenientes da cobertura, com algumas inundações, o que levou a autora a reclamar junto o réu a realização de obras, sem qualquer êxito.

Acrescenta que em consequência das infiltrações e humidades sofreu prejuízos consistentes na total danificação de mercadorias cuja aquisição importou no valor total de 16.192,99 € e que os prejuízos resultam de falta culposa de cumprimento das obrigações assumidas pelo réu que está obrigado a assegurar ao locatário o gozo da coisa para os fins a que esta se destina.

Conclui a pedir a condenação do réu a efectuar as obras necessárias no local arrendado, de forma a eliminar as infiltrações e humidades existentes, e a pagar-lhe a quantia de 16.192,99 euros, a título de indemnização pelos prejuízos causados decorrentes do incumprimento contratual, acrescida dos juros de mora à taxa legal a partir da citação.

O réu contestou, alegando que se alguma inundação ocorreu no estabelecimento da autora, não pode ter origem na residência do réu, situada sobre o locado, desconhecendo se houve ou não inundação, podendo, no entanto, a ter ocorrido, ser resultado de obras efectuadas no arrendado pela autora.

Acrescenta que os artigos que a autora diz danificados terão sido adquiridos nos anos de 1995 a 1999, que sendo artigos de moda e destinados a época específica, não são comercializados na época seguinte, não podendo a autora pretender o valor de aquisição, sob pena de enriquecimento ilícito à custa do património do réu.

Pede a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

A autora respondeu, mantendo a posição afirmada na petição inicial.

II - Feita a selecção da matéria de facto, de que não foi feita reclamação, foi realizada a audiência de julgamento e, após decisão sobre a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 16.192,99, acrescida de juros de mora desde a citação.

III - Inconformado com o sentenciado, recorre o réu que encerra as suas alegações concluindo: 1ª - O tribunal a quo ignorou factos comprovados nos autos, relevantes para uma justa composição do litígio.

  1. - Tais factos dizem respeito à proveniência das infiltrações e humidades "de uma tubagem embutida e existente numa das paredes", referida no relatório pericial de fls. 195 e 96 dos autos.

  2. - O Tribunal recorrido podia e devia ter providenciado pela ampliação da base instrutória, de forma a incluir esse facto, nos termos do disposto nos artºs 650º, al. F) do CPC e 264º do mesmo diploma.

  3. - Esta é uma questão de primordial importância para a defesa do aqui recorrente, com relevância na questão da acessibilidade para efeito de realização de obras urgentes pela A., bem como para a qualificação jurídica das obras.

  4. - Impõe-se assim a alteração à resposta dada ao quesito 1º, no sentido de que dela deverá passar a constar que "está provado que no local referido em A), em Dezembro de 2000, surgiram infiltrações através da placa do imóvel que serve de cobertura ao estabelecimento e de uma tubagem embutida e existente numa das paredes e humidades nos tectos".

    Sem conceder, 6ª - Se assim se não entender, deverá ser ampliada a matéria de facto e a repetição do julgamento, nos termos do disposto no nº 4, do artº 712º do CPC.

  5. - Existe contradição entre parte das respostas dadas à matéria de facto e a fundamentação.

  6. - A consideração, pelo Tribunal recorrido, de que "ficou provado que, se o senhorio tivesse consertado atempadamente a varanda - que por acaso é dele mesmo - não teria havido infiltração nem as humidades se teriam espraiado como ocorreu", não colhe qualquer apoio na matéria de facto dada como provada, dado que apenas ficou provado que o aqui recorrente fez obras, em 2002, na cobertura do seu terraço.

  7. - Essas obras - no terraço do recorrente - não se encontram concretizadas nem existe qualquer prova nos autos de que a sua realização teve qualquer efeito na eliminação das infiltrações e humidades.

  8. - A consideração de que "as infiltrações e humidades se propagaram pelo arrendado … e que se prolongaram no tempo", está em contradição com a prova de que aquelas ocorreram em Dezembro de 2000, Fevereiro de 2001 e em data não apurada de 2002 - quesitos 1º, 2º e 3º - e, ainda, com a falta de referência, nos autos à sua extensão.

  9. - As obras dos autos, qualificadas erradamente pelo Tribunal recorrido, como obras de conservação ordinária, deverão passar a ser consideradas como obras de conservação extraordinária.

  10. - Obras de conservação ordinária são as que têm por objectivo manter o prédio em bom estado de conservação, nas condições requeridas pelo fim do contrato, existentes à data da sua celebração.

  11. - Obras de conservação extraordinária são as obras que se destinam a pôr termo a defeitos de construção, ou por caso fortuito ou de força maior.

  12. - No caso dos autos trata-se de obras destinadas a pôr termo a suma situação de infiltração e humidade inesperada, pontual e localizada, que não contribuiu para a degradação do arrendado ou impediu a sua utilização pela A.

  13. Não constando dos autos qualquer acordo entre a A. e Recorrente relativo à realização de quaisquer obras, nem qualquer menção ou prova de que as autoridades administrativas lhe impuseram a sua efectivação, inexiste obrigação do R.

  14. - Inexistindo obrigação do recorrente quanto á realização das obras, também inexiste qualquer obrigação de indemnizar.

  15. - Na hipótese de qualificação como obras de conservação ordinária não merecer qualquer reparo, deverá esse tribunal de recurso revogar a sentença na parte respeitante ao montante da indemnização, pela aplicação do princípio da equidade previsto no artº 566º do CC.

  16. - Por efeito da consideração de que os bens atingidos são artigos de moda, sujeitos a uma desvalorização comercial que, no caso dos autos, resulta do período decorrido entre a data da sua aquisição e a produção dos danos.

  17. - A sentença recorrida violou o disposto nos artºs 650º, nº 2, al. f) e 264º do CPC, artºs 11º e seguintes do RAU e 562º, 564º e 566º do Código Civil.

    Termos em que, Deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-a por outra no sentido explanado nas alegações e conclusões supra".

    A recorrida contra-alegou em defesa da manutenção da sentença.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    IV - Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, e nada havendo a conhecer oficiosamente, são as seguintes as questões colocadas pelo recorrente para serem resolvidas: - alteração da decisão quanto á questão 1 da base instrutória; - ampliação da matéria de facto; - contradição entre as respostas à matéria de facto e a fundamentação; - qualificação da obras necessárias para obstar às infiltrações de humidades; - não obrigação da sua realização pelo Recorrente; - desvalorização dos bens danificados e indemnização devida à recorrida.

    V - Na sentença recorrida vêm considerados provados os seguintes factos: 1) No dia 21 de Julho de 1989 a autora, por escritura pública, tomou de trespasse o estabelecimento comercial, instalado na fracção autónoma designada pela letra "B' correspondente ao R/C, sul, do prédio em regime de propriedade horizontal, sito no .........., em .........., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3220º (A).

    2) O estabelecimento referido em A) foi trespassado sem passivo, mas com todo o seu activo, nomeadamente o direito ao arrendamento do imóvel supra mencionado (B).

    3) O ora réu é dono do prédio referido em A), e é, também, senhorio da autora (C).

    4) O imóvel descrito em A) destina-se à venda de materiais em pele, designadamente sapatos, carteiras, malas e outros materiais de marroquinaria (D).

    5) A autora subscreveu uma carta dirigida ao réu, datada de 11 de Junho de 2001, informando que no armazém do seu estabelecimento se tinha verificado inundação com origem na casa do réu, o que lhe provocou prejuízos em material para venda, acarretando a possibilidade de ocorrência de um curto-circuito (E).

    6) Mostra-se junta aos autos (folhas 11 a 14) uma relação de vários sapatos e bolsas, num total de 511 artigos, na qual os mesmos se encontram...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT