Acórdão nº 0630190 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Abril de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução20 de Abril de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO.

  1. - "B……, Ldª", com sede na Avª ……, …, Lisboa, instaurou, nas Varas Cíveis do Porto, contra "C……, S.A.", com sede na Avª ….., …., ….º, Matosinhos, a presente acção declarativa, com forma de processo ordinário, pedindo que: a) se declare o incumprimento definitivo do contrato de prestação de serviços por parte da R. e o direito a proceder à sua resolução; b) a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia global de 2.899.875,30 Euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento e c) a R. condenada a pagar-lhe a quantia global de 250.000 Euros, a título de indemnização pelos prejuízos causados à sua imagem, acrescida de juros de mora desde a citação até integral e efectivo pagamento.

    Para fundamentar a sua pretensão alega, em síntese, que prestou a sua actividade de consultoria técnica, económica e financeira à R. com vista à elaboração e apresentação de proposta a concurso público para concessão de movimentação de carga geral fraccionada e graneis no cais do Porto de Leixões e, tendo a R. ganho o concurso, acordaram, como contrapartida, na celebração de um contrato de prestação de serviços, em regime de avença, nos termos do qual seriam pagas 120 prestações mensais, no montante unitário de Esc. 2.600.000$00 (12.968,75 Euros), actualizado anualmente, R. que, após ter pago pontualmente as prestações durante 18 meses, resolveu o contrato alegando incumprimento, resolução que, além de infundada, lhe causou prejuízos, designadamente na sua imagem.

  2. - Contestou a R. alegando, também em resumo, que a A. não lhe prestou o apoio técnico e auxílio necessários, ou prestou-lhos de forma deficiente, abalando a confiança em que assentava o contrato que celebraram, A. que, além disso, violou os deveres de lealdade em que estava constituída para consigo ao prestar serviços idênticos a uma outra empresa concorrente que opera no Porto de Aveiro, o que tudo motivou a resolução do contrato a que procedeu, e, formulando pedido reconvencional, aduz que A. não tinha qualquer fundamento para pôr fim ao contrato e para deixar de cumprir as obrigações contratualmente assumidas.

    Termina pela improcedência da acção e pela procedência da reconvenção, pedindo a condenação da A. a indemnizá-la no montante de 1.699.926 Euros, ou outro que seja considerado equitativo, acrescido de juros de mora desde a citação até efectivo e integral pagamento.

  3. - Replicou a A. e, reafirmando o alegado inicialmente e impugnando os factos em que é alicerçado o pedido reconvencional, cuja improcedência sustenta, mais peticiona a condenação da R., como litigante de má fé, no pagamento de multa e indemnização.

  4. - Proferido despacho saneador em que se afirmou a validade e regularidade da lide, com declaração da matéria assente e elaboração da base instrutória, que se fixaram após desatendimento da reclamação apresentada pela R. e atendimento parcial da formulada pela A., após se ter procedido a julgamento, foi proferida sentença a julgar improcedentes quer a acção quer a reconvenção com a consequente absolvição de R. e A. dos respectivos pedidos.

  5. - No acórdão proferido por este Tribunal na sequência das apelações interpostas por A. e R. foi decidido anular o julgamento, sem prejuízo do já decidido em matéria de facto, bem como os termos subsequentes para que, em novo julgamento fosse apreciada a factualidade alegada nos artºs 46º, 47º e 48º da contestação e 9º a 13º da réplica.

  6. - Em cumprimento desse acórdão, foi aditada a base instrutória com a pertinente factualidade, objecto de aditamento ao quesito 26º ocorrido em audiência, e, tendo a A. arrolado como testemunha D……, opôs-se ao seu depoimento a R., oposição que reiterou em audiência, o que foi indeferido por despacho de que veio a agravar e cujas alegações rematou com as seguintes conclusões: 1ª: O Ora agravante vem agravar do despacho do Tribunal a quo que admitiu o depoimento como testemunha de D….., relativamente aos quesitos aditados à Base Instrutória, por considerar que em 23/02/2005 - data da continuação da audiência de julgamento - aquela pessoa já não desempenhava as funções de sócio gerente da Autora, não obstante se manter como titular de uma quota de 70% do respectivo capital social.

    1. : Tal fundamento da decisão não pode ser fundamento de facto e de direito de tal despacho.

    2. : À data da propositura da acção, isto é, em 14/03/2003, o Sr. D…… era sócio-gerente da A., sociedade que se caracteriza por ser uma "sociedade familiar", sendo seus sócios, para além do Sr. D……, os seus filhos E…… e F…… .

    3. : O Sr. D…… é sócio fundador e maioritário da A., sendo actualmente detentor de 70% do capital social.

    4. : Este sócio cumulou sempre essa qualidade com as funções de gerente, situação que se manteve inalterável até 31/12/2004, data em que renunciou às funções de gerente.

    5. : Na presente acção, o referido sócio-gerente apresentou-se como representante da Autora, tendo estado presente como parte, nas sessões de julgamento, aquando da apreciação de 24 (vinte e quatro) quesitos da Base Instrutória, assistindo, ao lado do seu mandatário, aos depoimentos das testemunhas.

    6. : Após douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto (processo nº 5728/04) de 09/11/2004, que decidiu o aditamento à base instrutória dos factos alegados sob os artigos 46º, 47º e 48º da contestação e sob os artigos 9º a 13º da réplica, o referido sócio-gerente renunciou formalmente, em 30/12/2004, às funções de gerente.

    7. : Entretanto, aquando da apresentação dos meios de prova nos termos do artº 512º do CPC para prova dos oito novos quesitos, a Autora veio indicar este ex-gerente para testemunhar e o Tribunal a quo, nos termos do despacho recorrido, admitiu tal depoimento como testemunha.

    8. : A admissão como mera testemunha do Sr. D……, veio inquinar o seu depoimento nessa qualidade.

    9. : De facto, dos presentes autos constam inúmeros elementos que provam a capacidade deste sócio para obrigar a sociedade - vejam-se os diversos documentos apresentados pela A., em que aquele sócio-gerente teve intervenção directa na qualidade de representante dessa sociedade e a procuração forense emitida em 10/03/2003 e junta à petição inicial, a qual foi assinada por este sócio-gerente -, são factos demonstrativos do seu poder de decisão, vinculação e representação da A..

    10. : O Tribunal a quo, ao admitir o depoimento deste, ora ex-gerente, mas ainda sócio, como testemunha, permitiu que fosse usada pela A. uma estratégia pouco legítima na prossecução da descoberta da verdade material.

    11. : Nos termos das regras do processo civil, não interessa que o depoente tenha ou não interesse directo na causa, mas tão só se ele é ou não parte no respectivo processo: se o é deve depor como parte; se o não é deve depor como testemunha.

    12. : Portanto, é inábil para depor como testemunha o representante legal de uma sociedade.

    13. : No caso concreto, o Tribunal a quo admitiu que na continuação do julgamento, iniciado em 15/12/2003, designadamente na audiência de 23/03/2005, fosse ouvida como mera testemunha, o sócio fundador e maioritário da A..

    14. : Assim, num único Julgamento, alguém que já foi parte é, agora, testemunha na continuação do mesmo, prestando depoimento como tal, a todos os quesitos aditados à B.I. (8 quesitos).

    15. : O referido Sr. D…… continuando a ser sócio maioritário da sociedade, ora A., e representante legal desta, é ainda parte, sendo inábil como testemunha para depor.

    16. : A A. em seu interesse - uma vez que o ex-gerente mantém a qualidade de sócio e os restantes sócios são os seus dois filhos - tentou e conseguiu que aquele fosse ouvido pelo Tribunal, pois de outro modo, só por depoimento de parte.

    17. : Foram, neste caso, desvirtuadas as normas legais, designadamente o disposto nos artigos 617º e 553º/2 do Código de Processo Civil e aproveitaram-se as lacunas da lei quanto aos depoimentos das testemunhas, tendo o Tribunal a quo permitido que fosse violado o princípio da igualdade das partes e do contraditório.

    18. : Nestes termos, um sócio ou administrador que exerça ou não funções de gerência ou de administração de uma sociedade comercial, não pode ser ouvido como testemunha.

    19. : Pelo que se concluiu que qualquer representante de uma sociedade é inábil para depor como testemunha, só podendo prestar depoimento de parte.

    20. : O Tribunal a quo não valorou a qualidade de parte que o sócio mantém, apesar de já não ser gerente, inquinando o despacho recorrido de nulidade, devendo o mesmo ser declarado nulo, atento o disposto no artº 668º, nº 1, do C.P.C., aplicável ex vi artigo 666º, nº 3 do mesmo diploma legal.

    21. : Deverá, assim, ser ordenada a sua revogação do despacho recorrido e sua substituição por outro despacho que considere nulo o depoimento, entretanto prestado, de D……, como testemunha, nos termos do nº 3 do citado artº 669º do CPC.

  7. - A A. não contra-alegou.

  8. - Teve lugar audiência de julgamento com gravação e foi respondida a matéria de facto aditada, que não foi objecto de reclamações, e, após as partes terem alegado de direito, foi proferida sentença a julgar improcedente a reconvenção, com a absolvição da A. do respectivo pedido, e parcialmente procede a acção, condenando a R. a pagar à A. a quantia de 1.250.000 Euros, acrescida de juros de mora à taxa de 4%, desde a citação.

  9. - Inconformadas, apelaram A. e R. que, alegando, formularam as seguintes conclusões: A A.: 1ª: Atenta a ausência de factos alegados pela R. que demonstrassem que a mesma é manifestamente excessiva não se justifica a redução da cláusula penal operada na decisão recorrida; 2ª: A cláusula penal foi livre e esclarecidamente estipulada pelas partes, tendo em consideração as circunstâncias do caso concreto, designadamente os factos provados D e E e a importância que a manutenção regular do contrato assumia no contexto da actividade da A. pelo que não se justifica a sua redução; 3ª: Assim, a R. deverá ser condenada no pagamento do montante de 2.436.870 Euros; 4ª...

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