Acórdão nº 0633128 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelDEOLINDA VARÃO
Data da Resolução29 de Junho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…….. e mulher C…….. instauraram procedimento cautelar comum contra D…………, SA.

Pediram que a requerida fosse notificada para se abster de executar judicialmente o título-livrança subscrito pelos requerentes que se encontra em seu poder ao abrigo do contrato de mútuo nº 136369, até que se encontre decidida, em acção a propor, a questão da extinção do contrato de mútuo operada em resultado da resolução contratual do contrato de compra e venda a que aquele se encontrava adstrito.

Como fundamento, alegaram factos tendentes a demonstrar que celebraram com a requerida um contrato de mútuo para pagamento do preço de um contrato de compra e venda que celebraram com E……., Ldª, que resolveram o contrato de compra e venda, tendo devolvido o bem que foi objecto do mesmo, e que tencionam instaurar acção a pedir a extinção do contrato de mútuo, que entendem estar ferido de nulidade, sendo que a execução da livrança.

A requerida deduziu oposição.

Percorrida a tramitação normal, foi proferida decisão que julgou o procedimento cautelar procedente e, em consequência, determinou que a requerida fosse notificada para se abster de executar judicialmente o título-livrança subscrito pelos requerentes que se encontra em seu poder ao abrigo do contrato de mútuo nº 136369, até que se encontre decidida, em acção a propor, a questão da extinção do contrato de mútuo operada em resultado da resolução contratual do contrato de compra e venda a que aquele se encontra adstrito.

Inconformada, a requerida interpôs recurso, formulando as seguintes Conclusões 1ª - Vem o presente recurso interposto em razão da plena convicção da agravante que não merecerá provimento o despacho da Mma Juiza a quo que julgou procedente a providência cautelar não especificada, determinando que a aqui agravante se abstenha de executar judicialmente a livrança subscrita pelos ora agravados, nos termos dos artigos 381º, 387º, nº 1 e 392º, n° 3 do CPC.

  1. - Sustenta, em síntese a Mma Juiza a quo que "(..)na execução a instaurar com base na livrança, considerando a sua natureza e o montante que nela configurará como estando em dívida, haverá com toda a probabilidade a dispensa de despacho liminar e de citação prévia(...) como tal, sem que tenham um conhecimento antecipado e antes de poderem reagir com a dedução de embargos, os requerentes poderão deparar-se com uma ampla penhora do seu património (...)", acrescentando ainda que " (...) tal configura a séria possibilidade de ocorrer lesão grave, e mesmo de difícil reparação (...) sendo ainda certo que a providência requerida é adequada a remover o referido periculum in mora (...)".

  2. - Da simples leitura dos artigos 381º e seguintes do CPC pode extrair-se, com toda a clareza, quais os pressupostos de decretamento dos procedimentos cautelares não especificados: 1) Probabilidade da existência do direito tido por ameaçado (artigo 381º, nº 1 e 387º, nº 1 do CPC); 2) fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável ao direito do requerente (artigo 381º, nº 1 e 387º, nº 1 do CPC); 3) não adequação da situação às várias providências tipificadas na lei (artigo 381° nº 3 do CPC); 4) adequacão do procedimento para remover o periculum in mora concretamente verificado (artigo 381º, nº 1 do CPC); 5) não exceder o Dreiuízo resultante da providência o dano aue com ela se quer evitar (artigo 387º, nº 2 do CPC).

  3. - Ora, analisando os pressupostos acima descritos simples será de concluir que nenhum dos mesmos se encontra preenchido no caso sub judice.

  4. - O sucesso de uma qualquer acção cautelar depende, desde logo, da verificação deste requisito, que mais não é do que o da aparência de um direito, o também denominado fumus boni iuris.

  5. - Na verdade, revertendo para o caso dos autos apodíctico se mostra a inexistência daquela probabilidade, atenta a inexistência do próprio direito ameaçado. Com efeito, o "incómodo" invocado na douta sentença recorrida não se confunde, nem jamais se poderá confundir, com a tutela de um direito que se pretende acautelar.

  6. - Assim, para que a probabilidade persista, necessário é, antes de mais, que o direito exista e, in casu, o mesmo não se encontra alegado e muito menos provado.

  7. - Tudo quanto fundamenta a sentença a quo é a ameaça de um incómodo (decorrente de todo e qualquer processo executivo) e não a ameaça de um direito existente e pretender o contrário seria ferir de morte todo o conceito de amplitude do processo executivo.

  8. - Identicamente, não se vislumbra, na presente providência, qualquer fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável por parte dos aqui agravados.

  9. - Na verdade, se os agravados apenas tiveram conhecimento da celebração do contrato de mútuo (alegadamente) em Julho de 2004 (com a informação das transferências bancárias para a conta da agravante) e se aguardaram até Setembro de 2005 - volvido um ano e dois meses - para se manifestarem através do procedimento cautelar, o pressuposto do fundado receio de lesão grave não está preenchido, de todo, no caso sub judice.

    1. - Portanto, analisando e confrontado a situação global em causa e usando um juízo de proporcionalidade e de razoabilidade, o alegado receio por parte dos agravados consubstancia-se num mero expediente dilatório e numa vã tentativa de delongar o normal funcionamento da justiça.

    2. - Acresce ainda que, a verificar-se a lesão grave do direito dos agravados - o que, no caso em apreço, não se concede - terá a mesma que ser dificilmente reparável.

  10. - Na verdade, a iminência de uma execução judicial, com as consequentes diligências de penhora, não poderá, nunca, ser considerada uma lesão dificilmente reparável, sob pena de se aviltarem todas as regras processuais plasmadas no Código de Processo Civil Português, já que assiste sempre aos executados o direito de oporem, através da oposição à execução (artigos 813º e seguintes do CPC) e da oposição à penhora (artigos 863º-A e 863º-6 do CPC).

  11. - Portanto, não poderão os agravados alegar a existência de uma lesão dificilmente reparável, se a própria lei se encarregou de tutelar a efectividade dessas possíveis lesões quando provenientes de actos judiciais de agressão do património.

  12. - Relativamente ao requisito do periculum in mora, para o mesmo se verificar não bastará qualquer receio, terá que ser um receio fundado, baseado em factos que permitam afirmar a gravidade e a actualidade da ameaça e a consequente necessidade de adopção de medidas destinadas a evitar algum prejuízo. Contudo, pelo já exposto, não foram alegados pelos agravados, nem em consequência dados como provados factos que permitissem concluir pela gravidade e actualidade da ameaça, nem da imperiosa necessidade da instauração do presente procedimento cautelar.

  13. - Revestindo todos os procedimentos cautelares um carácter urgente e conforme a manifesta carência de urgência por parte dos agravados, conforme o já explanado pela agravante, não há, no caso sub judice, qualquer periculum in mora concretamente verificado, pelo que, não será a presente providência o meio adequado para remover algo que não se verifica factualmente.

  14. - Finalmente e quanto aos pressupostos de procedência da providência requerida, terá ainda que se atender ao artigo 387º, nº 2 do CPC, isto é, com a mesma não se poderá exceder o dano que com ela se quer evitar.

  15. - Nesta sequência foi proferido um Acórdão, pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 09.03.88, publicado em www.dgsi.pt. com o n° convencional JSTJ00019407, onde se pode ler que "(...) constituem pressupostos legais das providências legais das providências cautelares não especificadas(...) não exceder o prejuízo resultante da providência o dano que com ela se pretende evitar. A falta de verificação do último requisito por carência de alegação e prova de factos só por si basta para impedir o decretamento da providência cautelar não especificada".

  16. - Na verdade, também nenhuma matéria factual, a esse respeito, foi alegada pelos agravados, não podendo a mesma ser suprida por intervenção do Tribunal, por qualquer, porquanto se trata de matéria constitutiva do direito invocado e essencial para a decisão da causa.

  17. - A pretensão dos agravados tem na sua base uma livrança, subscrita pelos próprios, de que é...

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