Acórdão nº 0650359 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Fevereiro de 2006
Magistrado Responsável | FONSECA RAMOS |
Data da Resolução | 13 de Fevereiro de 2006 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto "B.........., Ldª", intentou, em 19.4.2004, pelo Tribunal Judicial da Comarca de .......... - .º Juízo Cível - acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra: "Brisa - Auto-Estradas de Portugal, S.A".
Pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 6.097,75 (seis mil e noventa e sete euros e setenta e cinco cêntimos), acrescida de juros à taxa legal já vencidos e vincendos a contar da citação e até efectivo pagamento.
Alegou a Autora, para tal e em síntese, que exerce a actividade de comercialização de jóias, relógios e colares e que, no exercício dessa actividade, faz-se representar pelo sócio-gerente C......... .
No dia 7 de Maio de 2001, pelas 23,10 horas, este conduzia um veículo automóvel ligeiro de passageiros pertencente à Autora, que ao circular ao quilómetro 33,500 da auto-estrada A4, embateu num javali que atravessou a faixa de rodagem, da berma para o separador central.
Em consequência do embate o veículo sofreu danos, esteve impossibilitado de circular, pelo que a Autora teve de alugar um veículo para substituição daquele, tendo o gerente da Autora perdido três dias de trabalho.
Alegou, ainda, que o javali entrou por um buraco existente na vedação em rede a cerca de cem metros do local do embate.
Na audiência de julgamento, a Autora procedeu à alteração parcial da matéria de facto articulada, alegando que quando referiu na petição inicial a existência de um buraco na rede de protecção, pretendia referir que existia uma abertura com uma armação em madeira com portão que se encontrava aberto.
Citada, a Ré contestou, a fls. 19, impugnando a factualidade alegada e requerendo a intervenção acessória provocada da "Companhia de Seguros X.........., S.A.", concluindo, a final, pela improcedência da acção.
Para tal, alegou a Ré que, no dia em que ocorreu o alegado embate, efectuou patrulhamento à zona do embate, no decurso do qual não foi detectado qualquer animal na via, ou deficiência na vedação, e que a Brigada de Trânsito da Guarda Nacional Republicana também efectuou patrulhamentos no local.
Notificada da contestação, a Autora não respondeu.
Por despacho proferido a fls. 72, admitiu-se o chamamento da "Companhia de Seguros X.........., S.A." Citada, a interveniente Companhia de Seguros X.........., S.A., contestou a fls. 82, aderindo parcialmente à contestação da Ré, invocando a existência de uma franquia no contrato de seguro celebrado com a sua segurada e concluindo a final pela improcedência da acção.
Foi elaborado despacho saneador tabelar a fls. 90.
Procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e à elaboração da base instrutória, que não foram objecto de reclamação.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual foi requerida a alteração da redacção de alguns artigos da base instrutória, tendo-se determinado a alteração da redacção do artigo 8°, da base instrutória e a eliminação do art. 9°, e tendo-se respondido à matéria de facto da base instrutória, conforme resulta de fls. 206 e segs., não tendo havido qualquer reclamação.
*** A final foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a Ré do pedido.
*** Inconformada recorreu a Autora que alegando, formulou as seguintes conclusões: 1. Como, e bem, o Sr. Juiz conclui na sentença recorrida, em face da factualidade apurada e demais elementos dos autos competia à apelada "provar que não teve culpa na ocorrência do embate em causa nestes autos" 2. A apelada não logrou provar, por qualquer forma, que não teve culpa na ocorrência, bem pelo contrário, 3. Dos factos dados como provados resulta claramente que a apelada teve culpa na verificação do sinistro; 4. Resultou provado que "... entre 100 a 500 m do quilómetro 33.500 da Auto-estrada A4, existia na rede da vedação uma abertura com uma cancela em madeira, a qual no dia 8 de Maio de 2001, se encontrava aberta; resp. art., 8° da BI".
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Tendo o Sr. Juiz dado também como provado que "a vedação da Auto-estrada A4 ao quilómetro 33,500 e suas imediações estava intacta em ambos os sentidos", sem ressalvar o facto da cancela aberta, há manifesta contradição nas respostas dadas ao art. 8° da B.I. e ao art. 21° da B.I. da base instrutória, impondo-se a alteração da resposta dada ao art. 21° da B.l. de molde a forma a confirmar as respostas.
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As "alternadas" patrulhas efectuadas na Auto-estrada A4 designadamente na zona do quilómetro 33,500 não desresponsabilizam, por qualquer forma, a apelada, pelo contrário, demonstra a clara omissão dos seus deveres, pois como as testemunhas da própria apelada afirmaram, tais patrulhas consistiam em passar de carro na auto-estrada, donde não era possível ver as vedações nas condições apuradas nos autos.
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A apelada estava obrigada a manter sempre firmemente fechada a cancela referida na resposta ao art. 8° da B.I., como as próprias testemunhas afirmaram.
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Ao não cumprir tal obrigação, cometeu um facto ilícito, que determinou a entrada do javali, porque os javalis não voam e o sinistro com os consequentes danos, estando claramente demonstrado o facto ilícito, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
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Acresce que, como o Sr. Juiz defende na parte final da douta sentença "... a simples presença de um animal na auto-estrada fez presumir a culpa do encarregado da vigilância da coisa", como a Ré não ilidiu tal presunção, impõe-se a sua condenação nos termos peticionados.
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A sentença recorrida violou entre outras as seguintes disposições legais, artigos 483°, 486°, 487°, 493°, 562°, 762°, 798° e contrariou a jurisprudência designadamente os Acórdãos do STJ de 12.11.1996 (BMJ, 461-411) de 25/03/2004 (em www.dgsi.pt), da RC de 85.2001 (CJ XXVI-3,9), da RP de 16.09.2004, processo 0434088 (em www.dgsi.pt), Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, (Miranda Gusmão), de 2000.02.17, Revista n.°1092/1999, 7ª Secção, Primeiro de Janeiro, Suplemento, Justiça e Cidadania de 2000.04.27, pág.15 e Sentença do 3° Juízo de Competência especializada Cível da Comarca de Santo Tirso (Vicente Russo), de 1996.05.02, Colectânea de Jurisprudência 1996, II, pág.303.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso e revogar-se o despacho recorrido, assim se fazendo como sempre a mais elevada Justiça.
A Ré contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença.
*** Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta a seguinte matéria de facto: Dos Factos Assentes: A) No dia 7 de Maio de 2001, cerca das 23,10 horas, C.......... conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, propriedade da Autora, com a matrícula ..-..-JL, pela Auto-estrada A4, no sentido ..........-.........., no concelho de ..........; B) Auto-estrada esta onde existem duas vias no mesmo sentido, tendo cada via o total de cerca de 7,40 metros de largura; C) A Auto-estrada A4 ..........-.......... está concessionada à R. Brisa - Auto- Estradas de Portugal, S.A.; D) A Ré Brisa-Auto-Estradas de Portugal, S.A., transferiu a responsabilidade civil pelos danos causados a terceiros, na sua integridade física ou no seu património, na qualidade de concessionária da exploração, conservação e manutenção da Auto-Estrada A4, até ao montante de € 748.200,00 (setecentos e quarenta e oito mil e duzentos euros), para a interveniente Companhia de Seguros X.........., S.A., através de contrato de seguro titulado pela apólice n° 87/......, válido em 7 de Maio de 2001, conforme documento de fls. 41 e segs., cujo teor se dá aqui por reproduzido; E) No contrato de seguro referido em D) vigora uma franquia de € 748,20 (setecentos e quarenta e oito euros e vinte cêntimos) por sinistro, a cargo da segurada; Da Base Instrutória: F) A Autora tem por objecto a comercialização de jóias, relógios e colares; (Resposta ao art. 1º Base Instrutória).
G) O ..-..-JL seguia a cerca...
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