Acórdão nº 206/07.1GAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelMOURAZ LOPES
Data da Resolução30 de Junho de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

19 I. RELATÓRIO.

No processo Comum em Tribunal Colectivo n.º 206/07.1GAMMV.C1 foi julgada e condenada, a arguida L pela prática de dois crimes de lenocínio simples, p. e p. pelo artigo 169º n.º 1 do Código Penal, nas penas de dois anos e seis meses de prisão, cada um e em cúmulo jurídico na pena única de 4 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos, acompanhando-se tal suspensão de um regime de prova assente em plano individual de readaptação social.

Não se conformando com a decisão o Ministério Público veio interpor recurso da mesma para este Tribunal, restringido à sua não concordância com a suspensão da pena de prisão e defendendo a aplicação de uma pena de prisão efectiva.

Nas suas conclusões o Ministério Público refere: 1.Ao decidir suspender a execução da pena de prisão em que condenou a arguida pela prática de um crime de lenocínio, violou o Tribunal o disposto nos art.°s 500, n°s 1 e 2, e 400, n.° 1, do Código Penal; 2. Com efeito, tendo em atenção a personalidade demonstrada pela arguida. a incapacidade revelado em inferiorizar o desvalor do seu comportamento e a sua conduta anterior à prática do crime não se pode concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficientes as finalidades da punição; 3. Esta é a segunda condenação da arguida pelo crime de lenocínio; 4. Os factos pelos quais aqui foi condenada foram praticados durante o período de suspensão da pena de prisão em que foi condenada em processo anterior pela prática do mesmo crime; 5. O comportamento da arguida que, não se coibiu de voltar a praticar o crime de lenocínio pelo qual já tinha sido condenada em pena de prisão suspensa e a circunstância de o ter voltado a fazer ainda no decurso do período de suspensão dessa pena, é revelador de total indiferença pela condenações sofrida, da sua nítida propensão para a prática daquele crime e da falta de preparação para uma vida conforme ao direito.

  1. Tal ideia surge reforçada pelo teor do relatório social para determinação de sanção elaborado pela DGRS onde se conclui não existirem elementos que “permitam identificar um claro reconhecimento [ parte da arguida] do desvalor dos tipos de comportamento alegadamente praticados, capaz de levar [ a uma mudança significativa naquele estilo de vida” 7. Se a condenação anterior não foi suficiente para cumprir os objectivos de prevenção geral e especial subjacentes à aplicação das penas, não se vislumbra como tais objectivos possam ser concretizados com a imposição de pena de prisão novamente declarada suspensa na sua execução, mesmo se acompanhada de regime de prova.

  2. A conduta reiterada da arguida é suficiente, ao invés, para concluir que esta não possui a necessária capacidade para sentir a ameaça da execução da pena. de modo a que possa exercer sobre si um efeito dissuasor.

  3. Para além de não ser possível fazer sobre a futura conduta da arguida qualquer juízo de prognose favorável, razões de prevenção geral positiva não permitem a suspensão da execução da pena uma vez que esta colocaria em causa a crença da comunidade na validade da norma violada e, por essa via, o sentimento de confiança e segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penais e nas decisões dos Tribunais.

  4. O conhecimento de que a prática repetida pela arguida do crime de lenocínio e o seu desrespeito perante pena anteriormente aplicada nenhuma consequência teria para a sua liberdade afrontaria de forma insustentável a credibilidade de que ainda gozam as normas penais.

  5. Ora, se estes fins de defesa do ordenamenfo jurídico forem postos em causa pela suspensão da execução da pena, ela não deverá ser decretada, ainda que (não é o caso) se possa formular um juízo de prognose favorável quanto à conduta Mura da arguida no que concerne à eficácia desta pena para a afastar da prática de novos crimes.

  6. Tudo ponderado, entende-se que apenas a condenação da arguida numa pena de prisão efectiva é susceptível de salvaguardar a satisfação dos apontados objectivos da punição, mormente as elevadas exigências preventivas, gerais e especiais, motivos pelos quais entendemos dever o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, condenar-se a arguida em pena de prisão efectiva, o que permitirá responder às exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir.

Em resposta ao recurso a arguida propugnou pela sua improcedência e manutenção da decisão recorrida.

O Exmo Senhor Procurador Geral-Adjunto nesta Relação propugnou igualmente pela revogação da decisão no sentido assumido pelo recorrente, sendo que o arguido, na sua resposta mantém a sua anterior posição sobre a manutenção da decisão.

Por este Tribunal foi recusada a aplicação do artigo 169º nº 1 do Código Penal com fundamento em inconstitucionalidade material, decidindo-se absolver a arguida dos crimes pelos quais vinha acusada e que foram objecto de condenação na decisão recorrida.

Desta decisão foi interposto recurso directo para o Tribunal Constitucional.

Por decisão do Tribunal Constitucional foi decidido «não julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 169º n.º 1 do Código Penal, na redacção conferida pela Lei n.º 59/2007 de 4 de Setembro e ordenar a remessa dos autos ao tribunal recorrido para que seja reformada a decisão recorrida em conformidade com o presente julgamento de não inconstitucionalidade, conforme previsto no nº 2 do artigo 80º da LTC».

* Respeitando a decisão do Tribunal Constitucional e face ao teor das conclusões formuladas pelo Ministério Público expostas no seu recurso no Tribunal da primeira instância, a única questão a decidir é saber se deve ou não ser suspensa a execução da pena de prisão em que a arguida foi condenada, mantendo-se ou revogando-se a decisão.

* Da decisão importa atentar desde logo na factualidade dada como provada que é a seguinte: «1 – a arguida é proprietária de uma casa sita na Estrada Nacional n.º 111, no lugar de , comarca de Montemor-o-Velho, em local próximo do posto de abastecimento de combustíveis “A Lda.”; 2 – em essa casa, a arguida manteve diversas mulheres que, sob a sua orientação, praticavam actos sexuais com indivíduos que ali se deslocavam para tal fim e que pagavam, por esses actos, uma quantia em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT