Acórdão nº 183/08.1TACMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelNAZAR
Data da Resolução07 de Junho de 2010
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da Relação de Guimarães.

No procº 183/08.1TACMN.G1, do Tribunal Judicial de Caminha, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido Hélder M..., imputando-lhe a prática «em autoria e na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, na forma agravada, p. p. pelo artº 256º, nº 1, al. e) e nº 3, do Cód. Penal» . – cfr. fls 81 e ss Distribuídos os autos, a Exmª Sra. Juíza proferiu despacho, a rejeitar a acusação, ao abrigo do disposto no artº 311º, nº 2, al. a) e nº 3, al. d) do CPP, com base na seguinte fundamentação (transcrição): “(…) A Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal deduziu acusação e promoveu a realização de julgamento em processo comum e perante Tribunal singular, do arguido Hélder M..., melhor identificado a fls 81, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de “falsificação de documento”, p. p. pelo artº 256º, nº 1 al. e) e nº 3 do Código Penal.

No entanto, a meu ver, a actuação descrita não descreve matéria com relevância criminal.

Dispõe o artº 256º, nº 1 al. e) do Código Penal: “ 1- Quem, com ilegítima intenção de causar prejuízo a outra pessoa ou ao estado ou de obter para si ou para outra pessoa benefício ilegítimo, ou de preparar, facilitar, executar ou encobrir outro crime: e) Usar documento a que se referem as alíneas anteriores; é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa”.

As alíneas a) a d), inclusive, do nº1 do artigo 256 º do Código Penal prevêem as várias modalidades que pode assumir a falsificação de um documento e as alíneas e) e f) tipificam como crime a circulação do documento falso.

Assim, o tipo objectivo do tipo de crime em análise pode assumir as seguintes modalidades: (1) a fabricação ex novo de documento; (2) a integração no documento de uma assinatura de outra pessoa; (3) a declaração de um facto falso juridicamente relevante; (5) a integração no documento de uma declaração distinta daquela que foi prestada; (6) a circulação do documento falso.

Ora, in casu, não constam da acusação factos que permitam caracterizar o documento “carta de condução”, único mencionado nesse despacho, como incorporando qualquer das características a que se referem as alíneas b), c) e d) do nº 1 do artigo 256º do Código Penal.

Refere-se, apenas, que por forma não concretamente apurada, o arguido logrou obter uma segunda carta de condução, mantendo a primeira.

Esta referência, per si, exclui a consideração da previsão da alínea a) do nº 1 da referida disposição legal.

Assim sendo, não se pode concluir, como se faz no despacho acusatório, que o arguido usava documento “falsificado”.

*** Inconformado com o aludido despacho, o Ministério Público interpôs recurso, cuja motivação remata com as seguintes conclusões: 1. A acusação pública integrou os factos, não na alínea a), mas sim na alínea e) do art. 256º, n.º 1 do C. Penal, sendo a remissão para as alíneas anteriores que ser interpretada dentro do espírito da lei e da conduta típica do crime de falsificação.

  1. O que se pretende colocar no caso sub judice à consideração do venerando tribunal superior, e que são os factos que constam da acusação pública, é saber se um arguido tem, sem se saber, duas cartas verdadeiras (= obtidas da entidade oficial pública) na sua posse que, presumimos nós, e como tal não está descrito, porque é meramente conclusivo e dedutivo até pode ter sido de forma lícita, ou seja um arguido «pensa» que perde a sua carta de condução; pede licitamente uma 2ª via; algum tempo depois reencontra a primeira; não devolve a segunda; entretanto é condenado em tribunal num processo sumário a um período de inibição de conduzir, onde faz entrega de uma das cartas; antes do termo da inibição ali determinada é condenado em dois processos de contra-ordenação, onde é feito um cúmulo do período de inibição, e entrega a outra carta que mantinha na sua posse, obtendo dessa forma um encurtamento do tempo em que está sem carta de condução e inibido de conduzir, benefício que não é legítimo, contrariando as finalidades da lei penal e contra-ordenacional.

  2. Interessa saber se o simples facto de um arguido ter duas cartas emitidas pela entidade oficial pública na sua posse e utilizar as duas em simultâneo para cumprir duas ordens de inibição distintas, obtendo um encurtamento do prazo global de inibição de conduzir, é em si mesma uma conduta típica, ilícita e culposa.

  3. Parece-nos que teremos que concluir que sim, sob pena de deixarmos esta...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT