Acórdão nº 59/04.1TAOBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 21 de Abril de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório: No âmbito do Processo Comum (tribunal singular) n.º 59/04.1TAOBR que corre termos na Comarca do Baixo Vouga, Oliveira do Bairro, Juízo de Instância Criminal, por sentença datada de 5 de Março de 2008 e transitada em 7 de Abril de 2008, pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal, o arguido F...
foi condenado na pena de 10 meses de prisão, substituída por 300 horas de trabalho a favor da comunidade em instituição e horário a designar pelo IRS, tendo em conta o disposto no artigo 58.º, n.ºs 2, 3 e 4, do Código Penal.
Em 12/9/2009, o Tribunal, nos termos do artigo 59.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, decidiu revogar a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e, em consequência, ordenou o cumprimento da pena de 10 meses de prisão determinada na sentença.
**** Inconformado com tal decisão, dela recorreu o arguido, em 12/1/2010, defendendo que deve a mesma ser revogada, elaborando-se novo plano de trabalho, se possível, com a participação do arguido, extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões: 1. O julgador da 1ª instância sustenta a decisão de que se recorre, essencialmente, no Relatório de Anomalias elaborado pela DGRS.
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Todavia, não menos verdade é que o arguido sempre foi justificando as suas faltas, quer junto da DGRS, quer da instituição onde prestava serviço a favor da comunidade.
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O arguido nunca se opôs ou recusou a prestação de trabalho a que estava condenado.
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Muito menos o fez sem justa causa, tendo explicado por diversas vezes a sua situação de vida pessoal que o impedia de se apresentar quer num quer noutro local.
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O arguido tem a sua mãe de 70 anos de idade, com graves problemas de saúde.
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É o arguido que a acompanha regularmente nas várias deslocações médicas ou internamentos a que esta tem sido sujeita.
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Tal facto, conjugado com a sua obrigação e necessidade de cumprir com o seu horário laboral, foi dificultando a conjugação com a sua obrigação de cumprir o plano de caracterização de trabalho que lhe havia sido aplicado.
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O horário de funcionamento da instituição onde prestava o trabalho também não facilitou o cumprimento, pois colide com as horas produtivas e normais do dia.
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O arguido ficou desempregado entre 12/5/2009 e 2/6/2009, altura em que outorgou novo contrato de trabalho a termo certo com a sua actual entidade patronal.
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Tal situação destabilizou quer a vida particular quer profissional do arguido.
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O arguido vive maritalmente com outra pessoa, em casa arrendada, sendo avultados os encargos da vida corrente.
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Em face da sua situação de desemprego, empregou todo o seu tempo e esforços à procura de novo emprego, tarefa que não se avizinhava fácil.
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Trabalha, actualmente, na empresa G…, S.A., onde é reconhecido, tendo o seu contrato de trabalho sido renovado por duas vezes, passando a definitivo, em Março de 2010.
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O arguido é pessoa perfeitamente inserida no seio familiar, social e profissional onde este se move.
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O arguido tem respeito pelo poder judicial e reconhece a oportunidade que lhe foi dada em substituir-lhe a pena de prisão em que foi condenado na prestação de trabalho a favor da comunidade.
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Será injusto obrigar o arguido a cumprir de forma efectiva a pena de prisão em que foi condenado, quando o arguido nunca se recusou a cumprir a pena de substituição que lhe foi ordenada.
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Dos autos, não resultam provas inequívocas que o arguido tenha infringido grosseiramente os deveres da pena em que foi condenado.
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O arguido passou por uma fase bastante conturbada da sua vida, mas não merece ficar privado da sua liberdade, pelo menos com os fundamentos que constam dos autos.
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A manter-se tal decisão, a mesma iria provocar danos irreversíveis no futuro do arguido, seja a nível social, familiar e, acima de tudo, profissional.
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O arguido não necessita da prisão efectiva para sentir a punição e a repressão pretendidas com a sentença proferida.
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O arguido necessita, e merece, manter-se activo, social e profissionalmente integrado, sendo esta a justiça que se espera.
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o arguido não é um criminoso que mereça a privação da liberdade, reconhecendo as suas falhas, mas necessita de uma oportunidade para ultrapassar esta fase da vida.
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Tem 36 anos de idade e, ainda, uma vida para construir.
**** O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso, em 27/1/2010, defendendo, em primeiro lugar, que o recurso deve ser rejeitado, por ser extemporâneo, e, em segundo lugar, caso assim se não entenda, a improcedência do mesmo, apresentando as seguintes conclusões: 1. A decisão ora recorrida foi pessoalmente notificada ao arguido, em 9/12/2009, tendo transitado em julgado, no dia 21/12/2009, e o recurso apresentado deu entrada nos presentes autos, no dia 12/1/2010, pelo que deve ser rejeitado, por extemporâneo.
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Dispõe o artigo 399.º, do CPP, que “é permitido recorrer dos acórdãos, sentenças e despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei”, sendo aplicável in casu o prazo de dez dias previsto nos artigos 153.º, n.º 1 e 685.º, n.º 1, ambos do CPC, aplicável ex vi do artigo 4.º, do CPP.
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Todavia, e ainda que assim não se entenda, por mera precaução, sempre se dirá que resulta dos autos que o arguido participou na elaboração do plano de trabalho a favor da comunidade e não colocou qualquer obstáculo à implementação do mesmo, nos termos que lhe foram propostos.
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O arguido iniciou a prestação de trabalho a favor da comunidade, em 23/1/2009, e deixou de comparecer na entidade beneficiária, em 19/2/2009, apenas tendo cumprido com 6 (seis) horas de trabalho a favor da comunidade, sendo que, durante esse período, a sua frequência foi irregular e não justificou a sua ausência.
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O arguido não evidenciou empenho no cumprimento da pena, tentando protelar a sua execução.
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O arguido esteve desempregado, entre Fevereiro e Maio/Junho de 2009, e, nessa altura, não se disponibilizou a comparecer na entidade beneficiária do trabalho, nem às solicitações do instituto de reinserção social, tendo ocorrido o último contacto, por iniciativa daquela entidade, em 25/3/2009.
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O facto do arguido se encontrar actualmente inserido profissionalmente não invalida o cumprimento da pena de prisão em que havia sido condenado.
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Nos termos do artigo 59.º, n.º 2, al. b), do Código Penal, “O tribunal revoga a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e ordena o cumprimento da pena de prisão determinada na sentença se o agente, após a condenação: b) se recusar, sem justa causa, a prestar trabalho, ou infringir grosseiramente os deveres decorrentes da pena a que foi condenado;”.
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Desse modo, conclui o Tribunal, e bem, que os pressupostos que estiveram na base da substituição da prestação de trabalho a favor da comunidade não foram alcançados e, portanto, conclui que o único meio possível para que o arguido interiorize tal ilicitude terá de passar pelo cumprimento da pena de prisão.
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Os factos apurados pelo Tribunal levam à conclusão que o arguido revela uma postura de total indiferença pela condenação que sofreu nestes autos, constatando-se que a condenação sofrida neste processo não foi suficiente para o advertir e fazer cumprir com as suas obrigações.
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Assim, e ao abrigo do disposto no artigo 59.º, n.º 2, al. b), do Código Penal, o tribunal, e bem, revogou a substituição da prestação de trabalho a favor da comunidade e ordenou o cumprimento efectivo da pena de 10 (dez) meses de prisão aplicada nestes autos.
**** O recurso foi, em 3/2/2010, admitido.
Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, em 3/3/2010, no sentido de que o recurso merece provimento, devendo ser revogada a decisão proferida, a fim de o arguido ver suspensa a execução da respectiva pena de prisão, nos termos do artigo 59.º, n.º 6, al. b), do Código penal, salientando que “(…) o comportamento do condenado, a falta de...
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