Acórdão nº 6/07.9 GBAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelBR
Data da Resolução21 de Abril de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

37 I – Relatório.

1.1. Conjuntamente com outros dois demais arguidos, O, já mais identificados nos autos, foi submetido a julgamento porquanto indiciado, segundo oportuna acusação deduzida pelo Ministério Público, da prática de factualidade consubstanciadora, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, previsto e punido através das disposições conjugadas dos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.ºs 1 alínea a) e 2, alínea e), por referência ao artigo 202.º, alíneas a) e d), todos do Código Penal.

Findo o contraditório, e ao demais por ora irrelevante, proferiu-se Acórdão determinando condenar tal arguido enquanto agente do ilícito assacado, na pena de quatro anos de prisão.

1.2. Porque se não revê no teor do assim sentenciado, interpôs o mesmo arguido recurso, extraindo da motivação apresentada a seguinte síntese de conclusões: 1.2.1. Os pontos 6, 13 e 20 tidos como provados na “Fundamentação” do acórdão recorrido mostram-se incorrectamente julgados.

1.2.2. Isto porquanto no que concerne, o Tribunal a quo baseou – diga-se que indevida e exclusivamente –, toda a sua convicção nas declarações prestadas no decurso da audiência, pelo co-arguido AM 1.2.3. Co-arguido este que, alegadamente, estava ressacado (provavelmente sob o efeito da droga), horas depois de praticar um crime.

1.2.4. E cujas distintas versões (aquando do 1.º interrogatório judicial, nos termos do artigo 141.º, do Código de Processo Penal, e em audiência de julgamento) e contradições destituem de qualquer credibilidade o respectivo depoimento.

1.2.5. Tais circunstâncias conjugadas com o princípio do in dúbio pro reo determinariam também, e ao menos, a excrescência de uma dúvida razoável, sempre ajustável, que apenas poderia redundar em benefício da posição processual do recorrente, conduzindo à sua absolvição.

1.2.6. Mesmo concedendo que a formação da convicção do Tribunal a quo se poderia ater nessa parca prova, sempre dela sobressaem divergências manifestas quanto à sequência e contexto em que o furto teria ocorrido, pois que em ambos os depoimentos prestados, o co-arguido AM assumiu a iniciativa dos factos, o desempenho e móbil para os mesmos, como se realçou ao longo da motivação ofertada.

1.2.7. A co-autoria tem como pressuposto uma repartição de funções da qual possa decorrer, por parte de cada um dos agentes envolvidos, um domínio funcional do facto, isto é, de acordo com o contributo que presta, o sujeito, pelo papel que tem, pela função que desempenha dentro do plano, detém um domínio funcional do facto.

1.2.8. Ora, in casu, o co-arguido AM foi peremptório em afirmar não ter existido qualquer acordo prévio entre si próprio e os demais.

1.2.9. O que, quando muito, apenas possibilitaria a condenação do recorrente enquanto cúmplice no cometimento do crime.

1.2.10. A produção da prova apenas permitiria que se tivesse dado como provado que: - Os arguidos O e M recusaram entrar no stand para furtar um veículo.

- Foi iniciativa exclusiva do arguido AM o furto do veiculo em causa.

- Não foi previamente gizado entre os arguidos qualquer plano de furto, pois que o arguido AM por várias vezes interrogado sobre essa iniciativa assumiu a sua autoria.

- O arguido AM entrou sozinho no stand sem qualquer ajuda.

- Os arguidos O e M ficaram no mesmo sítio de onde o arguido se retirou, não se aproximaram do stand.

- Não se provou que os arguidos M e O estivessem posicionados de molde a ver o arguido AM dentro do stand.

- O arguido AM chamou os arguidos O e M quando já tinha retirado o veículo automóvel do recinto do stand e já se encontrava na via pública.

1.2.11. A subsistir a condenação do recorrente, deverá ela ser pela prática de um crime de furto de uso do veículo, previsto no artigo 208.º, do Código Penal, isto atentando-se em que o propósito que o moveu foi tão somente o de o utilizar enquanto meio de transporte e nunca de o fazer seu em exclusivo.

1.2.12. Manter a condenação do recorrente em quatro anos de prisão efectiva redundará num retrocesso na sua reintegração social, bem como numa “pena acessória” de índole familiar para o seu filho de um ano de idade que crescerá durante tal período sem a presença do progenitor.

1.2.13. Os objectos furtados foram recuperados.

1.2.14. A factualidade em análise remonta a um período anterior à estabilização da vida social, profissional e familiar do recorrente.

1.2.15. Tudo conjugado, impõe-se a suspensão da execução da pena de prisão aplicada.

1.2.16. Decidindo pela forma em que o fez, o acórdão recorrido questionou o disposto nos artigos 26.º; 27.º; 28.º; 29.º; 50.º e 208.º, todos do Código Penal.

Terminou pedindo que no provimento da impugnação: - Seja eximido de qualquer responsabilidade penal, atenta a errónea apreciação da prova produzida e o princípio do in dúbio pro reo.

- Caso assim se não entenda, independentemente da forma de participação nos factos (como cúmplice ou co-autor), bem como da respectiva tipificação (furtum rei ou furtum usus), se determine a suspensão da execução da pena aplicada.

1.3. Notificado, respondeu o Ministério Público, sufragando o improvimento da impugnação.

1.4. Admitida, foram os autos remetidos a esta instância.

1.5. Aqui, o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer conducente a idêntico improvimento.

Deu-se acatamento ao estatuído pelo artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

No exame preliminar a que alude o n.º 6 deste mesmo inciso, consignou-se não estarmos perante situação em que se imponha decidir sumariamente; não existirem provas a renovar, e, deverem os autos prosseguir seus termos.

Como assim, determinou-se a recolha dos vistos devidos, o que sucedeu, bem como submissão á presente conferência.

Urge então ponderar e decidir.

* II – Fundamentação de facto.

2.1. Relativamente ao ora recorrente, considerou o Acórdão recorrido como provado que: I – Na noite de 2 para 3 de Janeiro de 2007, a hora não concretamente apurada, mas antes das 2 horas do dia 3 de Janeiro, em …. Águeda, os arguidos combinaram entre si dirigirem-se a uma localidade não concretamente apurada, com a finalidade que também em concreto se não logrou apurar.

Para o efeito, deslocaram-se os três num veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, de marca Ford, …. com a matrícula espanhola ….DMH, conduzido pelo arguido O.

Quando chegaram a Mortágua, próximo da Escola EB 2/3, …, a bomba injectora do citado veículo de matrícula….DMH avariou.

Por tal motivo, os arguidos empurraram tal veículo cerca de 200 metros, imobilizando-o nas traseiras da referida escola, … sendo que o mesmo havia sido subtraído em Espanha em circunstâncias não apuradas.

Tendo ficado sem veículo para se deslocarem, o arguido AMl propôs introduzir-se no stand “A..”, localizado a cerca de quinhentos metros do local onde deixaram o referido Ford Transit, com a finalidade de daí retirar um veículo automóvel, o que fez com conhecimento dos demais arguidos e assentimento destes.

Aí chegados, enquanto os arguidos M e O permaneciam no exterior das referidas instalações com a finalidade de vigiar se aparecia alguém, designadamente a GNR e que, nesse caso, dariam sinal ao arguido AM, este dirigiu-se ao interior do mencionado stand.

Para o efeito, o arguido AM dirigiu-se à rede que vedava completamente a entrada para o recinto do mencionado stand, constituída em arame, com cerca de um metro e setenta de altura em todo o perímetro, e cortou-a, por aí entrando no interior do recinto do stand.

Já no interior do recinto do stand, o arguido AM abriu a porta do quarto de banho que se encontrava fechada com o trinco e do seu interior retirou dois auto-rádios, no valor cada um de € 70,00, que levou com ele.

Após, deslocou-se a um contentor, tipo arca frigorífica, que se encontrava no recinto do stand, o qual se encontrava destrancado, e do seu interior retirou uma chave de fendas com cabo vermelho e um raspador de tinta.

De seguida deslocou-se à porta do escritório do mencionado stand e, com os objecto referidos, forçou a fechadura da referida porta, rebentando-a, assim a logrando abrir, e por aí entrou no interior do escritório.

Após, o arguido AM pegou nas chaves da ignição do veículo automóvel de matrícula 72-34.., marca Peugeot, …. , que se encontrava no recinto, em frente a portão de entrada para o referido stand.

De seguida, colocou os dois auto-rádios no seu interior e tentou colocar o referido veículo automóvel a trabalhar.

Como não conseguiu, os arguidos O e M vieram em seu auxílio e ajudaram-no a empurrar o referido veículo automóvel para o exterior do stand, tendo dessa forma danificado o portão de entrada no mesmo, causando danos de valor não concretamente apurado mas não inferior a € 250,00.

Todavia, como mesmo assim o motor do veículo automóvel 72-34-.. não pegava com o acordo dos arguidos O e M, o arguido AM dirigiu-se de novo ao interior da instalações do stand e do interior da casa de banho retirou uma bateria, no valor de € 40,00, do contentor uns cabos de ligação, no valor de € 50,00 e do escritório um carregador de baterias, no valor de € 100,00.

Após, de comum acordo, em conjugação de esforços, os arguidos ligaram o carregador de baterias à bateria do veículo 72-34-.. e, como assim não conseguiram colocá-lo a trabalhar, engataram os cabos de bateria, fazendo uma ligação directa da bateria do veículo…DMH à do veículo 72-34-.. tendo logrado desta forma que o motor do mesmo funcionasse.

De seguida deslocaram-se no veículo 72-34-.. para a zona de Águeda, assim fazendo seus o veículo e demais objectos acima referidos.

O veículo automóvel 72-34-.. tinha o valor de, pelo menos, € 6.000,00.

O arguido AM conduziu o citado veículo automóvel desde Mortágua até …, em … Águeda.

Com a conduta acima descrita, os arguidos causaram na porta de entrada do escritório danos na quantia de € 250,00, na rede danos na quantia de € 50,00 e no portão de entrada para o stand danos na quantia de € 250,00.

Os arguidos actuaram em conjugação de esforços e de intentos, fazendo seus os objectos e veículo que retiraram do interior do...

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