Acórdão nº 397/03.0TBACN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução19 de Janeiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - Relatório 1. A (…), casada, residente em X..., intentou contra B (…) e mulher C (…), residentes em X..., a presente acção com processo ordinário pedindo se decrete a revogação da procuração arquivada no Cartório Notarial de ..., onde a autora constituiu seu procurador o aqui réu, para o mesmo vender ou prometer vender, a quem e pelo preço e sob as cláusulas e condições que tiver por convenientes, o prédio urbano inscrito na matriz sob o art.º 1111..., bem como onze prédios rústicos que na mesma procuração se identificam, e seja anulada a compra e venda que teve por objecto o prédio urbano inscrito na matriz sob o art.º 2222....e consequente cancelamento da inscrição que o réu conseguiu a seu favor correspondente à G-3.

Alega para tanto, que em 2 de Agosto de 2002 a autora, através da referida procuração constitui seu mandatário o réu, a quem conferiu poderes de vender ou prometer vender, a quem e pelo preço e sob as cláusulas e condições que tiver por convenientes, o prédio urbano inscrito na matriz sob o art.º 1111... da freguesia de .... e ainda 11 prédios rústicos, tudo conforme o documento junto a fls 7 a 9 dos autos. O marido da autora prestou consentimento a sua mulher para os actos previstos na procuração e para cuja validade o mesmo se mostrasse necessário. Acontece que o réu vendeu ambos os prédios a si mesmo, sendo que o correspondente ao art.º 2222....não constava da procuração, agindo com excesso de mandato, e fê-lo por preços muito inferiores ao respectivo valor real, lesando o património da A., pelo que há justa causa para a revogação da procuração.

Os réus contestaram, dizendo, em resumo, que em finais de 1999 a autora e seu marido eram devedores ao réu marido da importância de cinco milhões de escudos, resultante de um empréstimo que este lhes havia feito, mas dada a impossibilidade de pagamento, a autora e seu marido propuseram ao réu a venda do prédio inscrito na matriz sob o art.º 2222...., no que o mesmo concordou. Porque era intenção do réu vender o prédio para realizar o dinheiro, foi outorgada procuração, em 4 de Fevereiro de 2000, para vender tal prédio. Mais tarde o réu voltou a apoiar financeiramente os autores comprometendo-se estes a reembolsá-lo, no valor de 94 252,85 €, mas como reconheceram a impossibilidade de pagar, propuseram a venda de diversos prédios ao réu. Foi na sequência destes factos e da referida procuração entretanto outorgada a 2 de Agosto de 2002, que foi celebrada a escritura de compra e venda de ambos os prédios.

Aliás, já em 10 de Março de 2002, tais prédios tinham sido objecto de promessa de compra e venda, por parte da A. e marido, e mãe da A., ao réu marido. Quanto aos preços constantes da escritura não correspondem a valores reais porque o réu se preocupou em evitar despesas que as escrituras, sisas e registos implicavam, tanto mais que o valor do negócio estava à muito pago e corria agora no interesse exclusivo do réu, e então procurador.

Concluíram pela improcedência da acção.

* A autora replicou concluindo como na petição inicial.

* Foi posteriormente apensada a estes autos a acção comum com processo ordinário nº 621/03.0TBACN onde D (…), marido da A., demanda a mesma e os ora RR, e onde pede se declare nula a venda do prédio urbano inscrito na matriz sob o art.º 1111 e se ordene o cancelamento da inscrição G-3 que sobre o mesmo incide, a favor do réu.

Para tanto, o A. alegou que o consentimento que prestou na procuração de 2 de Agosto de 2002, acima referidos, foi genérico e não especial, como a lei exige.

Os RR contestaram em termos similares à contestação da outra acção, defendendo que o consentimento do A. está bem concretizado.

* Foi proferida decisão, nos seguintes termos:

  1. Julgo procedente por provada a acção principal e em consequência determino a revogação da procuração outorgada pela autora a favor dos réus arquivada no Cartório Notarial de ... sob o nº 13 de fls. 26 a 27 do maço 2 cuja cópia certificada consta de fls. 7 a 9 dos autos; b) Declaro nula e de nenhum efeito por abuso de direito, a escritura de compra venda outorgada no dia 25 de Fevereiro de 2003 no 2º Cartório Notarial de ....e referente ao prédio inscrito na matriz sob o art.º 2222.... e descrito na CRP sob a descrição nº 2777; c) Declaro nulo e de nenhum efeito qualquer registo que do prédio acima descrito exista a favor dos réus.

* Julgo procedente por provada a acção apensa e em consequência: d) Declaro nula e de nenhum efeito a venda do prédio urbano inscrito na matriz sob o art.º 1111 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob a descrição 0.3333... feita através da escritura de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de ....em 25 de Fevereiro de 2003.

e) Declaro nulo e de nenhum efeito qualquer registo do prédio a favor dos réus.

* 2.Os RR B (…) e C (…) interpuseram recurso, formulando as seguintes conclusões que se sintetizam: 1) A sentença recorrida padece de nulidade nos termos do art.º 668º, nº1, c), do CPC; 2) Dando como provada a existência da procuração outorgada em Fevereiro de 2000 e do contrato promessa de 10.3.2002, a dita sentença não relevou tal factualidade para apreciar a validade da escritura posta em causa nos autos, tendo tais elementos de prova sido “esquecidos” na prolação da decisão; 3) Na verdade, nesse contrato promessa, a A. e marido, e sua mãe, prometeram vender ao recorrente, os prédios em questão, pelo valor de 100.000 €, dos quais receberam a quantia de 95.000 €, tendo sido ademais estipulado que com a liquidação do preço acordado o promitente comprador poderá exigir dos promitentes vendedores uma procuração irrevogável com poderes para vender os prédios objecto deste contrato nas condições que entender, o que efectivamente ocorreu; 4) Não podendo concluir-se pela revogação da procuração, por A. e marido já haverem recebido valor superior ao valor que foi atribuído aos referidos prédios, não se verificando, assim, qualquer violação dos deveres contratuais do recorrente, que determine a inexigibilidade para o mandante da continuação da relação contratual; 5) Inexiste qualquer abuso de direito, por supostamente os prédios inscritos na matriz sob os arts.º 1111 e 2222....terem sido vendidos por preço inferior ao seu valor real, como decidido na sentença recorrida, pelas mesmas razões expendidas nas anteriores conclusões, pois não foi criado à A. uma situação lesiva; 6) A haver abuso de direito é da parte dos AA que receberam o dinheiro do recorrente, declararam obrigar-se a emitir a procuração de 2.8.2002, e agora vem invocar justa causa de revogação da mesma; 7) Se algum erro ocorreu na celebração da escritura...

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