Acórdão nº 517/08.9JACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTIGOS 131º,132º.Nº1 E 2AL.B), E)E J) 40º, 71º DO CP 127º,374º,379º, 410º 412´º 428ºDO CPP,494ºE 496º DO CC.

Sumário: 1.O objectivo da fundamentação ( prof. Germano Marques da Silva) é a de permitir “a sindicância da legalidade do acto, por uma parte e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando, por isso como meio de autodisciplina”..

  1. Na motivação da matéria de facto, o acórdão recorrido, de forma clara faz um exame crítico das provas e indicou as provas em que se fundou para formar a sua convicção, indicando a razão de ciência de cada uma das pessoas cujos depoimentos tomou em consideração.

  2. A “convicção do Tribunal “a quo” é formada da conjugação dialéctica de dados objectivos fornecidos por documentos e outras provas constituídas, com as declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, em função das razões de ciência, das certezas, das lacunas, contradições, inflexões de voz, serenidade e outra linguagem do comportamento, que ali transparecem”.

  3. A solução a que chegou o tribunal é razoável atendendo á prova produzida e está fundamentada. Na verdade, face a todo o material probatório tudo indica que o tribunal recorrido captou a verdade material.

  4. As circunstâncias enunciadas nas diversas alíneas do nº 2 do artigo 132º do CP não são de aplicação automática, por resultar do nº 1 da mesma norma a exigência, de carácter geral, de que o agente tenha agido com “especial censurabilidade ou perversidade” tratando-se os elementos descritos no nº 2 de meros exemplos que poderão – ou não – preencher a exigência do nº 1, dependendo das circunstâncias concretas do caso.

  5. Assim é possível ocorrerem outras circunstâncias, para além das mencionadas, se bem que valorativamente equivalentes, as quais revelem a falada especial censurabilidade ou perversidade; e, por outro lado, apesar da descrição dos factos provados apontar para o preenchimento de mais alíneas do n.º 2 do art. 132.º, não é só por isso que o crime de homicídio cometido, deverá ter-se logo por qualificado.

  6. “A prevenção geral atinge as suas exigências mais prementes ou mais elevadas, o seu expoente máximo de maior intensidade dissuasora na punição do crime de homicídio, em que a reposição contrafáctica da norma violada pressupõe o restabelecimento da confiança da comunidade na norma violada, pois que ninguém se sentirá seguro, nem haverá sociedade que subsista se a punição das actuações homicidas ficar aquém da necessidade, forem inadequadas ou desproporcionais ao âmbito de protecção da norma na defesa e salvaguarda da vida humana”.

  7. Por sua vez, as exigências de prevenção especial, mostram-se intensas, na medida em que o arguido demonstrou ter uma personalidade que não respeita os valores humanos, age emotivamente, com pouca capacidade de controlo e é bastante agressivo.

  8. A culpa do arguido, por sua vez, é muito elevada, traduzindo qualidades especialmente desvaliosas em termos de relevância jurídico-penal, pelo desvalor da acção que quis empreender e do desvalor do resultado que procurou e conseguiu atingir.

    Decisão Texto Integral: 81 No processo Comum Colectivo, supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferido acórdão que condenou o arguido J..

    como autor de: - um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts 131º e 132º, nºs 1 e 2, als b), e) e j) do CPenal, na pena de 20 (vinte) anos de prisão.

    - um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts 131º e 132º, nºs 1 e 2, als e) e j) do CPenal, na pena de 18 (dezoito) anos de prisão.

    - um crime de detenção de arma ilegal, p. e p. pelo art 86 nºs 1 al c) da Lei nº 5/2006, de 23/2 (versão em vigor à data dos factos) na pena de 2 (dois) anos de prisão.

    -Em cúmulo jurídico, condenar o arguido na pena única de 25 (vinte e cinco) anos de prisão.

    - Na procedência parcial do pedido cível foi o arguido condenado a pagar: - Aos requerentes M e R a título de danos próprios da vítima, a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros).

    - À requerente M, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros); - Ao requerente R a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros); - Ao requerente R, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros); Sobre todas estas quantias acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a presente data até integral pagamento.

    Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso o arguido J. que na respectiva motivação concluiu: A) Ao dar simultaneamente provados os factos nºs 11 e 61 o douto acórdão recorrido deu ao mesmo tempo como provado que no dia …/…/2008, chegado a …. provindo de Espanha após se ter munido da espingarda caçadeira o arguido de imediato se deslocou à residência da ofendida e seus filhos (facto n° 11) e que chegado àquela localidade ali permaneceu algum tempo (nº 61); B) O mesmo sucede em relação aos pontos 27 e 69, pois se naquele se dá corno provado que após a prática dos factos o arguido se encaminhou a pé, em direcção a …. tendo entretanto sido interceptado nesse percurso por uma patrulha da GNR que havia sido chamada ao local neste último dá-se como provado que depois de deixar os filhos com a sogra o arguido deslocava-se a pé em direcção a GNR cuja patrulha ele próprio interceptou no caminho informando-a do sucedido; C) Estes factos assim dados como provados não são esclarecedores quanto a saber se o arguido se entregou por iniciativa própria à GNR ou se foi esta força de segurança que o interceptou e deteve; D) Da fundamentação de facto assim expendida no douto acórdão recorrido e atenta a sua manifesta oposição e incongruência fica-se sem saber se afinal se deu como provado que o arguido provindo de Espanha se deslocou de imediato a M… ou se antes disso permaneceu algum tempo em Oliveira de….. e nesta hipótese por quanto tempo; E) A condenação proferida na parte em que qualificou ambos os homicídios por via da al j) do nº 2 do art 132º do CPP não constitui portanto resultado lógico e congruente em face dos tactos dados como provados e como não provados.

    1. A enumeração pelo douto acórdão recorrido dos factos provados e não provados nos termos sobreditos por contraditórios e manifestamente incompatíveis fá-lo incorrer em falta de fundamentação exigida pelo artº 374° nº 2 do CPP e torna-o nulo nos termos do disposto no artº 379º nº 1 al a) do CPP; G) No douto acórdão recorrido incorreu-se em erro na apreciação da matéria de facto tendo sido incorrectamente julgados os pontos de facto referenciados nos seus números 3, 4, 7, 10, 11, 19, 20, 21, 27, 33, 34, 35, 36, 39 e 41, uma vez que a prova produzida impõe decisão diversa da recorrida.

    2. Efectuou pois o tribunal a “quo” uma errada interpretação e aplicação do artº 127º do CPP uma vez que ao dar como provados tais factos, não formou uma convicção assente em regras de experiência comum mas antes decidiu segundo (eventual) impressão gerada pelos diversos meios de prova; I) Para dar como provados os factos constantes dos seus nºs 3 e 4 o tribunal recorrido formou a sua convicção assente no diário da vítima nos elementos clínicos da ofendida ao Hospital …., na carta de fls. 26 e no depoimento da testemunha MR J) Porém, tais elementos de prova assim enunciados no douto acórdão recorrido não podem levar a formar a convicção nos termos em que o fez o tribunal, uma vez que o denominado diário da vitima não passa de um documento cuja origem e autenticidade é desconhecida e não se encontra sequer assinado traduzindo-se em declaração anónima que, nos termos do art 164º nº 2 do CPP nem sequer deveria ter sido junto aos autos e não pode portanto ser relevante para a formação da convicção do tribunal tendo sido portanto aquele disposição legal violada; K) Além do que, todas as referências no mesmo diário contidas, revelam necessariamente uma visão parcial e emocionalmente não isenta da realidade dos factos inerente à generalidade das situações de divórcio o mesmo sucedendo com a carta de fls 26; L) Também dos elementos clínicos da ofendida no Hospital … não resulta ter sido o arguido o autor das sequelas ali mencionadas, as quais envolveriam a prática de crimes pelo arguido pelos quais este nunca foi condenado, nem sequer julgado; M) Por seu turno, o depoimento das testemunhas GF, NM (da sessão de 23.0609. com início de depoimento às 16:19.17 horas e terminus às 16.24:00 horas dos 00.0240. aos 00.0400.do registo áudio) JM (da sessão de 29.06.09, com início de depoimento ás 14:41:50 e teminus às 14:47:56, dos 00:01:40 aos 00:02:05, do registo áudio; e JH (da sessão de 23.06.09, com início de depoimento às 17:04:32 horas e terminus às 17:09:55 horas. dos 00:02:00, aos 00:03:20, do registo áudio) impõem que se dêem tais factos como não provados; N) E o depoimento da testemunha MR mãe da ofendida naturalmente comprometida com a situação e irada contra o arguido, não pode merecer o mínimo de credibilidade, atento o seu carácter vago e selectivo, tendo chegado mesmo a declarar que não queria falar sobre o assunto (da sessão de 23.06.09 com inicio de depoimento às 17:12:53 horas e terminus às 17:57:44 horas, dos 00:19:40, aos 00:20:20 do registo áudio); O) É o próprio tribunal que não confia nas suas declarações ao admitir expressamente a possibilidade de ter sido esta testemunha a transmitir ao arguido preocupação pelo estado dos filho:" apesar desta o ter negado em audiência de Julgamento; P) Não ficou provado o facto constante do n) 7 do douto acórdão recorrido na parte em que se concluiu que os ofendidos iriam iniciar uma vida comum, juntamente com os quatro filhos da ofendida mas apenas que mantinham à data uma relação amorosa uma vez que nenhuma prova foi produzida nesse sentido...

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