Acórdão nº 8361/2008-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelTERESA PRAZERES PAIS
Data da Resolução18 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa A ...intentou a presente acção sob a forma ordinária contra "P..., S.A",(M)..., (S)...,R..., E... pedindo a condenação solidária dos RR. a pagar ao a quantia de 70.000,OO € a título de indemnização a título de danos não patrimoniais.

Em abono da sua pretensão alega, em síntese, que na edição do Correio da Manhã, na primeira página, juntamente com a fotografia do A., foi publicada uma noticia no sentido de o A. receber uma reforma da rádio por aí ter trabalhado apenas alguns meses, transcrevendo-se ainda a noticia e publicando um artigo da autoria da 2ª, igualmente transcrita. Além disso, na mesma edição dedicada ao voto online o CM formulava a seguinte questão: A: é eticamente aceitável a reforma da rádio?".

Refere o A. que é uma figura pública de relevo nacional, e os factos imputados ao A. são inteiramente falsos, pois a pensão que lhe foi atribuída não o foi pelo facto de ter trabalhado alguns meses na RDP, mas sim decorrente de todo o período contributivo do A. E o facto de ter atingido 70 anos de idade, ou seja, *ao ser eleito deputado nunca chegou a perder o vinculo com a RDP, mas tal não significa que se tenham acumulado quaisquer vencimentos, mas sim e tão só que os descontos foram efectuados quer nessa entidade, quer também na qualidade de deputado. Assim, o A. Alega que as noticias do CM são falsas e a mesma foi reproduzida nos principais noticiários das televisões nacionais e rádios, e ainda difundida em determinados websides, não obstante alguns meios de comunicação terem desmentido a mesma, como foi o caso do Jornal "0 Público", sem que o CM o tenha feito em algum momento. Mais refere que na noticia faz apelo aos sentimentos mais mórbidos dos leitores, como a inveja e a desconfiança em relação ás instituições, e tais sentimentos forma explorados à custa do bom nome, honra e imagem do A., sem que estivesse justificado pelo dever de informar, visando sim prejudicar o A., na sua imagem e bom nome. 0 A. Alega que sofre do problemas do coração e que tais noticias muito o abalaram quer física, quer emocionalmente, pedindo assim o montante aludido a título de danos não patrimoniais.

Citados os réus, os mesmos contestaram dizendo, em suma, que as notícias em causa eram e são verdadeiras e que a interpretação que o A. faz das mesmas não é a interpretação de um leitor médio. Mais alegam que as noticias reproduzem inclusive a versão assumida pelo A., pelo que entendem os RR. que não existe motivo para esta acção, pois em momento algum se refere que acumulação do vencimento de deputado com a pensão é ilícita, ou ilegítima, dando-se inclusive outros exemplos de tais acumulações, e além disso o A. é chamado a dar a sua versão dos factos, e é um facto que o mesmo consta da lista da Caixa Geral de Aposentações e como reformado da RDP, onde exerceu apenas alguns meses, e que tal era desconhecido de pessoas próximas do A. mais referem que a ré nunca recebeu qualquer rectificação ou reclamação do A., não tendo os réus alterado as declarações do A. sobre esta matéria. Esclarecem ainda que sempre pautaram as suas condutas por respeitos ás normas deontológicas, e o perfil do A. citado parcialmente no CM foi retirado da sua própria página na Internet, e que todos os factos referidos não são difamatórios, mas sim verdadeiros, baseado num documento oficial, e a noticia tinha interesse informativo, sendo um facto público que os políticos têm privilégios que os restantes cidadãos não têm. Impugnam ainda que todos os demais órgãos informativos tivessem por base a noticia veiculada pela ré. Impugnam ainda os factos em que o A. alicerça os danos ditos morais, dizendo ainda que as noticias tiveram por base uma completa investigação jornalística e assente em fontes oficiais, tendo sido respeitados todos os deveres deontológicos, não existindo qualquer culpa nem negligencia, mas sim e tão só o direito de liberdade de expressão e informação, com critérios de verdade informativa e informação com relevo social. Concluem, assim, pela improcedência da acção.

*0 A. respondeu mantendo, em síntese, o alegado em sede de petição inicial.

********A final foi proferida a seguinte decisão: "Por tudo o exposto, decido: a) Condenar a 2ª R. e 3ª Rés, solidariamente a pagar ao Autor a quantia de 15.000 € (quinze mil euros), acrescido de juros de mora desde o trânsito em julgado da presente decisão e até integral pagamento; b) Absolver os 1º, 4º e 5º RR"*****************É esta decisão que o A e as RR (S) e M impugnam formulando as seguintes conclusões: O A a)Com destaque de primeira página, na publicação de 25.7.2006, do jornal Correio da Manhã, noticiava-se que o apelante iria auferir uma pensão de 3.219,95 € por ter trabalhado escassos meses na RDP. e, na publicação de 26.7.2006, igualmente com relevo de primeira página, afirmava-se que o apelante iria acumular com tal pensão uma subvenção vitalícia, qualificada em tal notícia como privilégio injustificado.

b)Como é do conhecimento geral, os factos ocorreram poucos meses após importante resultado eleitoral obtido pelo apelante em eleições presidenciais.

c)Dando como provada a existência de elevados danos morais a douta sentença de 29.2.08, julgou a acção parcialmente procedente, condenando as 2ª e 3ª RR., solidariamente, no pagamento ao A. da quantia de 15.000,00 €, a título de danos morais, com fundamento, apenas, na culpa a titulo de negligência das 2ª e 3ª RR., e só pelas escritos publicados em 25.7.06.

  1. Quanto à absolvição da 1ª R., fundamentou-se a sentença recorrida no facto de não resultar dos factos provados que o director do Correio da Manhã tenha tido conhecimento das notícias e não se tenha oposto à respectiva publicação.

  2. Ora, no art. 56 da petição inicial, o apelante alegou que "pelo facto de terem sido alvo de destaque de primeira página, e dado o número de artigos dedicados aos factos ora em causa naquelas duas edições, os mesmos não podiam deixar de ser do conhecimento do editor do director do Jornal, ou seu legal substituto, que não se opôs, o que se releva para efeito do disposto no art.29 nº2 da Lei de Imprensa.» f) Pelo que, sendo facto pessoal dos RR., por falta de contestação, se deveria ter considerado como provado o conhecimento e falta de oposição do directo, nos termos do art.659 nº3 do CPC, Neste sentido, Lebre de Freitas (Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, Vol. li, pág. 383), e o Ac. STJ de 4.2.75 (em www.dgsi.pt).

    g)Ainda que, por hipótese, assim não fosse, certo é que o art.29 nº2 da Lei de Imprensa, conjugado com o dever do director de orientar, superintender e determinar o conteúdo da publicação, constante do art.20 al.a), dessa mesma Lei, estabelece, uma presunção de conhecimento e falta de oposição por parte do director do jornal. Neste sentido, o acórdão de Relação, de 4.7.2006 h) Também quanto à presunção expressa na antiga Lei de Imprensa (redacção constante do Dec-Lei nº 85-C/75, de 26/2), quanto à responsabilidade criminal do director, e no sentido de que o art.26 nº2, al. b), não ora inconstitucional, os Acs. do Tribunal Constitucional n/s. 270/87, de 10/7, e 447/87, de 18.11 (BMJ 371, págs. 193 e ss.). E bem assim, Faria Costa, "Aspectos Fundamentais da Problemática da Responsabilidade Objectiva no Direito Penal Português - Separata dos Estudos em Homenagem ao Professor Teixeira Ribeiro", Vol.3º, 1981, pág. 36 e 37, no sentido da responsabilidade objectiva, derivada directamente do resultado produzida e não da omissão de intervenção por parte do agente na prevenção desse resultado.

    i)Por maioria de razão, não sendo inconstitucional tal presunção, face ao princípio in dubio pro reo, pedra basilar do processo crime, também o não será no processo civil, onde tal princípio não existe, quanto à responsabilidade civil da empresa jornalística, resultante do art. 29 nº2, da Lei de Imprensa (na actual e na anterior redacções).

    J)0 próprio Ac. STJ, de 7.2.08, citado na sentença recorrida, vai no sentido da existência de presunção de conhecimento prévio da notícia por parte do director: "as suas funções poderiam levar a menor exigência de prova sobre o seu conhecimento prévio das notícias ou até levar a presunções judiciais que a tal conduzissem" (em www.dgsi.pt k) Mas, mesmo que tal presunção não existisse, certo é que face aos factos dados como provados atinentes ao destaque editorial dado às noticias em causa e ao grau de divulgação que as mesmas mereceram nos outros meios de comunicação social, torna-se evidente, à luz da experiência comum, que o director não podia, no caso concreto dos autos, deixar de conhecer tais notícias, e bem assim, que não se opôs às mesmas.

    1) E caso os RR. Invocassem o contrário, sempre estariam a defender-se com a inobservância de um dever legal do director, o que consubstanciaria manifesto abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprio, não esquecendo, a este propósito, que a 2 ª R. era sub-directora do Correio da Manhã, e cabia-lhe, nos termos do art. 21 nº2, da Lei de Imprensa, coadjuvar o director, nomeadamente, quanto ao conteúdo da publicação. Pelo que se deverá considerar que recaía sobre os RR. O ónus da contraprova sobre tal facto.

  3. Finalmente, o entendimento de que num caso como o dos autos, face à prova produzida, cabia ao apelante provar, veja-se através de depoimento de jornalista do Correio da Manhã, que o director conhecia e não se opôs às notícias, equivaleria a onerar o apelante com uma prova impossível, dado que, na prática, nenhum funcionário de nenhum jornal terá disponibilidade para afrontar os interesses da entidade empregadora.

    n)Uma tal interpretação do disposto no art. 29 nº2 da Lei de Imprensa, seria desconforme à própria ratio do ordenamento jurídico, patente no Código Deontológico dos Jornalistas, que apela ao sentido de auto-responsabilização dos jornalistas, tal como a doutrina tem assinalado - cf. J. M. Coutinho Ribeiro, A Nova Lei de Imprensa (Anotada) face ao novo Código Penal, 1995, pgs. 53-54, e João Luís de Moraes...

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