Acórdão nº 1108/12.5T2AVR-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | ARLINDO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A... e mulher B...
, ambos com domicílio na Rua (...) Albergaria a Velha, intentaram a presente Ação de Impugnação da Resolução de Ato em Benefício da Massa insolvente, contra a massa insolvente de C... , representada pela Srª. Administradora de Insolvência Dr.ª D...
, com domicílio profissional na Rua (...), Santa Maria da Feira.
Para o efeito, e em síntese alegaram que o distrate de doação, objeto da resolução, se justificou por falta de cumprimento por parte da insolvente da condição estabelecida na doação, no sentido de prestar a E...
, filho dos autores, tal como a insolvente, todos os cuidados e assistência de que ele necessitasse, bem assim, que desconheciam totalmente nesse momento a situação económica da insolvente.
A ré ofereceu contestação na qual, para além do mais, impugnou o invocado incumprimento da condição aposta na doação e o alegado desconhecimento da situação económica da insolvente por parte dos autores, seus pais, mais afirmando que a situação em causa justifica o enquadramento nos termos dos artº 120 e 121º nº 1 alínea b) do CIRE.
Os autores responderam, reiterando o já por si alegado na p.i., quanto à natureza do negócio em causa e dos encargos impostos na doação que outorgaram a favor da sua filha.
Teve lugar audiência prévia, em conformidade com o disposto no artigo 591.º do nCPC, na qual foi proferido despacho saneador tabelar e se considerou disporem os autos de todos os elementos que, sem necessidade da produção de prova, permitiam conhecer do mérito da causa, fixando-se os factos provados e proferiu-se decisão em que se julgou improcedente a presente acção, com a consequente absolvição do pedido da ré e mantendo-se, em conformidade, os efeitos da resolução operada pela administradora da insolvência, aqui impugnada, ficando as custas a cargo dos autores, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que gozam.
Inconformados com a mesma, interpuseram recurso os autores A... e B..., recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 128), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. Não podem os Recorrentes concordar com a douta sentença proferida pelo tribunal a quo, a qual julgou totalmente improcedente a presente acção pelos Recorrentes intentada com vista à anulação da resolução do negócio promovida pela Exma. Sra. Administradora de Insolvência.
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De facto, veio o tribunal a quo a enquadrar a situação em discussão nos presentes autos no âmbito da alínea b) do n.º 1 do artigo 121.º do CIRE.
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Considerando que o negócio em questão constitui um negócio gratuito, enquadrável em tal alínea e assim passível de resolução incondicional, sendo desta forma despicienda a produção de prova.
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Ora, não discutem os Recorrentes, por decorrer diretamente da lei, que os negócios enquadráveis em tal normativo legal são negócio resolúveis incondicionalmente e sem dependência de quaisquer requisitos adicionais.
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Não pressupondo assim como acontece no artigo 120.º a existência de má fé de entre outros requisitos.
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Contudo, não concordam os Recorrentes que se enquadre a situação em apreço na alínea b) do n.º 1 do artigo 121.º e assim na definição de actos gratuitos para efeitos dessa alínea.
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Na verdade, como resulta dos autos, em 28 de Julho de 2009 foi celebrada escritura de doação em que foram designadamente e no que ora interessa, intervenientes os ora Recorrente e a sua filha C..., tendo através de tal escritura de doação, sido doado à filha dos Recorrentes, ora insolvente, um imóvel, o qual se encontra melhor identificado nos autos, prédio esse que o Recorrente A... havia adquirido por partilha.
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Tal doação foi efetuada pelos Recorrentes numa tentativa de reaproximação à sua filha, destinando-se o imóvel a ser a residência de C....
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Sendo que a doação foi realizada com a condição da donatária prestar ao seu irmão E..., “todos os cuidados e a assistência de que ele necessite, inclusive assistência médica e medicamentosa,” ficando ainda obrigada a prestar-lhe alimentos, se os rendimentos do mesmo fossem insuficientes.
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Tal condição não foi estipulada para o futuro, mas sim, para que fosse cumprida a partir da celebração da escritura.
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De facto, como resulta também dos autos, designadamente do alegado pelos Recorrentes na sua petição inicial e do documento pelos mesmos juntos com tal articulado como documento n.º 6 e 10, o seu filho E... necessita de apoio de terceira pessoa.
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Sendo esse apoio garantido pelos Recorrentes, mas pretendendo os mesmos, atendendo à sua idade e problemas de saúde, começar a transferir o acompanhamento do mesmo para a irmã C....
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A insolvente não cumpriu no entanto a condição imposta, não tendo em momento algum prestado qualquer assistência ao irmão, ou procurado sequer saber do bem estar do mesmo.
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Continuando assim os Recorrentes onerados com tal situação, pelo que, verificando-se o incumprimento das condições impostas com a doação e de cujo cumprimento dependia a manutenção de tal doação, procederam os Recorrentes ao distrate da mesma.
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Ora, entendem os Recorrentes que a situação em apreço não se poderá enquadrar na já indicada alínea, que confere a possibilidade de resolução incondicional do negócio por se tratar de um acto gratuito.
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Entendendo de facto os Recorrentes que o distrate de doação não se poderá considerar como um negócio gratuito para os efeitos da alínea b) do n.º 1 do artigo 121.º do CIRE, uma vez que quando criada, tal norma teria certamente subjacente uma ratio e pressupostos que não se verificam na situação em apreço, designadamente negócios gratuitos propriamente ditos, como ocorreria se a insolvente tivesse doado um bem de sua propriedade a outrem, o que no...
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