Acórdão nº 1828/09.1TBPVZ-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução28 de Novembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Oposição à execução 1828/09.1TBPVZ-B do 2º juízo de competência cível do TJ de Póvoa de Varzim Sumário: I. Uma declaração de dívida não é título exequível para obter a restituição de uma quantia objecto de um mútuo nulo por falta de forma.

  1. Mesmo que se tenha o entendimento contrário (como é o caso da maioria da jurisprudência das Relações que vai contra a maioria da doutrina), ele não pode valer para o caso de a execução se ter iniciado para exigir o cumprimento do contrato (incluindo juros remuneratórios), pois que a execução não pode ser convolada (art. 272 do CPC1961 = art. 264 do CPC2013), na contestação à oposição, em execução para obter a restituição da quantia mutuada com base na nulidade do contrato.

    Acordam no Tribunal da Relação do Porto os juízes abaixo assinados: B… instaurou uma execução contra C… e marido, D…, para pagamento de 147.333,36€, dizendo, em síntese, que em 27/08/2007 lhes fez um empréstimo de 137.500€, entregando-lhes tal quantia; aquando do empréstimo foi subscrito por ambos os executados uma declaração de dívida da quantia mutuada, que devia ser paga em 30 dias, e para garantia do pagamento da quantia mutuada, os executados subscreveram um contrato-promessa; foram interpelados para o pagamento e não o fizeram; querem o pagamento dessa quantia, sem prescindir dos juros moratórios vencidos e vincendos.

    O título executivo é a declaração de dívida. Os juros foram calculados desde 29/09/2007 à taxa legal de 4% ao ano.

    Ambos os executados deduziram oposição à execução, mas, por razões ligadas ao sistema de apoio judiciário, as oposições foram deduzidas em datas diferentes, sendo que a oposição da executada, num outro apenso do processo executivo, já foi julgada improcedente com trânsito em julgado.

    Na oposição do executado, este alega que, como resulta da confissão da dívida, por trás dela existiu um contrato de mútuo; ora, nos termos do art. 1143 do Código Civil, o contrato só seria válido se fosse celebrado por escritura pública; como o exequente não refere a forma do contrato, indicia-se que não cumpriu as formalidades legais, donde o contrato é nulo, nulidade essa que é de conhecimento oficioso; é certo que a nulidade acarreta a restituição de tudo o que tenha sido prestado, mas uma coisa é a restituição por força da nulidade outra é a exigibilidade de cumprimento da obrigação emergente do contrato; portanto, o título não é exequível, como se decidiu no ac. do STJ de 08/11/2005, recurso 3033/05, e é defendido por Abrantes Geraldes, Títulos executivos, Themis, ano IV, nº. 7, 2003 (embora a propósito da restituição de bens imóveis). Pelo que a execução devia ser extinta (arts. 810 e 820 do CPC).

    Acrescenta ainda que o teor de uma cláusula resolutiva do contrato-promessa invocado pelo exequente revelaria que os executados e o exequente quiseram que, no caso de não ser paga a dívida, valesse o contrato-promessa e não a confissão de dívida; pelo que o que o exequente devia ter feito, em vez de executar a confissão da dívida, era executar o contrato-promessa; por fim, ainda diz que como o imóvel objecto do contrato-promessa foi entretanto adquirido pelo exequente numa outra execução, o contrato-promessa já não pode ser cumprido por parte dos executados, o que, segundo o executado, acarreta a extinção da obrigação, por força dos arts 779 e 790, 795, todos do CC.

    O exequente contestou a oposição, entre o mais dizendo, em síntese, que no requerimento executivo reconhece e alega que o contrato de mútuo foi celebrado mediante uma declaração de dívida e não por escritura pública; ora, nessa confissão de dívida/contrato de mútuo consta tudo o que é abrangido pela consequência legal da nulidade, ou seja, consta o reconhecimento de uma obrigação pecuniária cujo montante está determinado e por isso é título executivo; isto é, ele podia requerer a restituição da quantia mutuada sem necessidade de propor acção declarativa, como foi decidido pelos acs. do STJ de 19/02/2009 (07B4427) e de 13/07/2009 (6357/04.7TBMTS-B) e é defendido por Anselmo de Castro, A acção executiva singular, comum e especial, págs. 41 e 42 da 3ª edição.

    Quanto à vontade das partes, relativamente ao contrato-promessa, ela era de o mesmo servir apenas de garantia do pagamento do mútuo e não a de vender/comprar o imóvel objecto do mesmo, contrato-promessa esse que ficaria sem efeito com esse pagamento. Quanto à impossibilidade de cumprimento, diz que a questão já está resolvida no apenso de oposição deduzida pela executada, com trânsito em julgado. À cautela, diz que a impossibilidade de cumprimento não lhe poderia ser oposta, pelo que as normas invocadas pelo executado não teriam aplicação; diz que o executado está a agir em abuso de direito; conclui pela improcedência da oposição.

    *Depois de realizado o julgamento, foi proferida sentença a julgar a oposição improcedente.

    O executado recorre desta sentença, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: I. O menor acerto da sentença no que respeita à questão de facto, prende-se com o facto de não considerar o facto de existir, na base do documento dado a execução, um contrato de mútuo.

  2. As testemunhas E… e F… referem claramente a existência do contrato de mútuo que esteve na base do documento dado a execução.

  3. A declaração de nulidade do contrato de mútuo acarreta a restituição de tudo o que tenha sido prestado, sendo que uma coisa é a condenação a devolver o dinheiro que se recebeu, por força da declaração de nulidade e outra é a exigibilidade de cumprimento da obrigação emergente do contrato de mútuo.

  4. Ora, in casu, a relação causal da declaração de dívida é nula, o que inquina a exequibilidade do título dado à execução, isto é, retira-lhe a eficácia executiva.

  5. Por outro lado, a sentença fundamenta a sua decisão no facto do exequente ter interpelado os executados para a celebração da escritura de compra e venda, com vista ao cumprimento da obrigação a que estes se tinham vinculado, quando na realidade o que resultou da prova testemunhal foi que tal interpelação nunca ocorreu (veja-se o depoimento da testemunha E…, supra melhor identificada a passagem em questão).

  6. Apurou-se que a prestação do executado se tornou impossível por culpa imputável ao credor. O executado viu-se impossibilitado de entregar o bem dado como garantia porque o exequente o adquiriu através de venda judicial por si promovida noutra execução.

  7. Tendo o bem passado a ser propriedade do exequente, deve considerar-se cumprida a obrigação dos executados.

  8. Ao decidir como decidiu, a sentença proferida violou os arts 45/1, 810, 811/1a) e 820 do CPC.

    O exequente não contra-alegou.

    *Questões que importa decidir: se os factos provados devem ser outros; se o título dado à execução era inexequível; se a prestação se tornou impossível; se a obrigação se deve considerar cumprida.

    * Se os factos a considerar devem ser outros Das conclusões I e IIO executado pretende que a sentença devia ter considerado ainda o facto de existir, na base do documento dado a execução, um contrato de mútuo.

    Não diz, no entanto, como é que esse facto devia ser inserido nos factos provados.

    Apesar disso, o executado tem razão.

    Basta a leitura dos factos dados como assentes para se reparar que os mesmos foram insuficientemente transcritos: com efeito dizer-se, em A) dos factos assentes, que “[…] se confessam devedores ao exequente da quantia de 137.500€, efectuado em 27/08/2007” não faz qualquer sentido, havendo uma óbvia omissão da acção que se diz ter sido efectuada em 27/08/2007.

    Mas para isto não se tem de recorrer às testemunhas, nem esse recurso teria eficácia, visto que não...

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