Acórdão nº 1922/05.8TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução29 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I – Relatório 1. LM e AM intentaram, em 29/03/…, junto das Varas Cíveis de Lisboa, acção declarativa, sob a forma de proces-so ordinário, contra M.P., Sociedade de Advogados e advogados sócios de capital e/ou indústria da dita sociedade AP e outros, em que pedem a condenação solidária de todos os R.R. no pagamento do montante total de € 11.801.197,33, acrescidas de juros de mora a contar da citação, compreendendo: A – A quantia de € 6.128.744,83, a título de indemnização por da-nos patrimoniais, que, por sua vez, inclui: a) - a parcela de € 5.736.912,00, relativa ao dano por perda de chance; b) - a parcela de € 391.832,83, correspondente a honorários e outras despesas pagas pelos A.A.; B - A quantia de € 5.672.452,50, a título de danos não patrimoniais.

Alegam, no essencial, o seguinte: - Em 1998, os A.A. outorgaram procuração a favor da sociedade R. para intentar uma acção contra o Estado a pedir a correcção monetária do valor recebido pela nacionalização das 203.408 acções que aqueles A.A. detinham na sociedade CEL, no valor unitário de 4.190$50, atenta a evolução da inflação verificada nas últimas três décadas; - Essa acção foi precedida de pareceres de alguns jurisconsultos portugueses, tendo a sociedade R. e alguns dos seus advogados aceite patrociná-la por considerarem provável o seu merecimento e ganho, estando os A.A. dispostos a recorrer para todas as instâncias, incluindo o Tribunal Constitucional (TC) e o TEDH, tanto mais que o R. CV estava particularmente credenciado para litigar nesta instância por ter sido juiz em foros internacionais.

- Em 20/03/…, o TAC de Lisboa proferiu decisão desfavorável aos A.A., da qual foi interposto recurso para o STA cujo prazo para alegações terminava no dia 17/06/..; - Porém, as alegações de recurso foram enviadas por fax para o STA, sendo que, segundo aquele Tribunal, parte das mesmas começaram a ser enviadas às 00H01m13 do dia 18/06/..; - O TAC de Lisboa considerou as referidas alegações extemporâneas e deserto o recurso, decisão que foi confirmada pelo STA, em 22/05/ …, tendo sido interposto novo recurso para o TC, que foi rejeitado, implicando o trânsito em julgado da decisão do STA; - Em virtude disso, os A.A. perderam a possibilidade de vir a obter uma sentença que lhes reconhecesse o direito de receber do Estado Português uma indemnização superior a 20 milhões de contos.

- Os advogados que patrocinavam então os A.A. poderiam, de forma mais segura, ter apresentado aquelas alegações em mão na secretaria do tribunal até às 16h30 do dia 17/06/…, ou usado dos meios alternativos por via postal; - O uso de telefax, pouco antes da meia-noite do último dia do prazo, para envio das referidas alegações era muito arriscado, como os R.R. bem sabiam, o que os faz incorrer em negligência grave pelo sucedido; - Além disso, os R.R. nem sequer invocaram, como deviam, o justo impedimento com fundamento na anomalia ocorrida na transmissão por fax; - A negligência dos advogados que patrocinavam a causa foi grave e grosseira, tendo daí resultado danos materiais correspondentes à perda de possibilidade de obter a condenação do Estado Português no pagamento de uma indemnização superior a 23 milhões de contos; - Tendo em atenção que não havia garantia de êxito da acção, e sen-do a obrigação dos advogados uma obrigação de meios, o dano material deverá ser calculado com base no coeficiente de 5% sobre o valor da causa, acordado para efeito de honorários, tendo ainda em conta o valor que os A.A. teriam de pagar ao Estado, a título de custas nas três instâncias, caso per-dessem a acção pela totalidade do pedido, valor este que computam na ordem dos € 5.736.912,18; - Acresce que os AA sofreram outros danos materiais correspon-dentes a entregas para honorários e despesas no valor de € 391.832,83; - Os A.A., perante o desfecho daquele processo, sofreram imenso, com revolta e descrédito na seriedade dos homens e das instituições em Portugal, tendo em conta que a decisão de instaurar a acção contra o Estado foi reflectida e de molde a honrar a memória e a vontade do seu pai, que construiu a fábrica de celulose, a qual foi nacionalizada em 1975, encon-trando-se em fase de reprivatização, e que os A.A. lutaram durante 20 anos nos tribunais para tentar fazer valer os seus direitos; - Justifica-se, assim, a condenação dos R.R. no pagamento de uma indemnização, a esse título, equivalente ao montante das custas que o Estado reclama àqueles que recorrem aos tribunais e perdem demandas, no valor de € 5.672.452,50; - Com a referida conduta os R.R. incorreram em responsabilidade civil contratual, por violação dos deveres profissionais, nos termos do disposto no art.º 83.º, alínea d), do EOA, correspondente ao art.º 95.º, n.º 1, alínea b), do actual EOA, aprovado pela Lei n.º 15/2005, de 26/01, bem como nos artigos 1157.º, 1158.º, n.º 1, 1161.º, alínea a), 1178.º, 798.º, 799.º, n.º 1 e 2, 487.º, 485.º, n.º 2, e 486.º do CC.

  1. Os R.R. contestaram, sustentando que: - O valor da compensação pela nacionalização de cada uma das acções da CEL foi definitivamente fixado em 4.190$50, em 1996, na sequência de vários processos instaurados pelos A.A. e patrocinados por outro escritório de advogados, tendo os A.A. deixado passar largos meses sobre a decisão judicial e, apenas em 11/03/97, contactaram o R. CV no sentido de estudar a possibilidade de recorrer a qualquer instância internacional com vista a rever o valor da compensação que lhes tinha sido definitivamente arbitrada; - O R. CV, ficou de estudar a possibilidade de instaurar uma acção que constituísse o pressuposto necessário da possibilidade de apresentar uma queixa contra o Estado Português no TEDH; - Foi acordado que, apesar de serem reduzidas as probabilidades de se conseguir uma mudança da jurisprudência portuguesa (STA e TC), no que concerne à diferença de regimes entre expropriação e nacionalização, se iria equacionar a proposição de uma acção em que a decisão de fundo - de actualização da indemnização fixada por acção - fosse objecto de decisão; - A acção teve por finalidade o reconhecimento do direito dos A.A. pelos prejuízos sofridos em consequência da desvalorização monetária e da evolução das taxas de juro ou da imobilização de capital entre a data da nacionalização e a data do efectivo pagamento da compensação, tendo sido pedidos vários pareceres; - Foi dado a conhecer aos A.A. que o TEDH não costumava ser muito “generoso” nas indemnizações fixadas, não sendo, pois, criadas quaisquer expectativas àqueles quanto ao êxito da acção; - Algum tempo depois de ter ocorrido o episódio que integra os fundamentos da presente acção, os R.R. propuseram aos A.A. a instauração de nova acção cujo fundamento seria o enriquecimento sem causa do Estado Português, atento o processo de privatização em curso, tendo chegado a elaborar um projecto de petição, com vista a que a questão da majoração da indemnização fosse colocada ao TEDH, mas os AA não aceitaram instaurá-la, dizendo que pretendiam receber dos R.R. o valor que ora reclamam; - A apresentação das alegações no último dia do prazo não resultou de nenhum descuido dos R.R., mas sim do facto de os advogados incumbidos de elaborar o recurso terem estado à espera de pareceres pedidos a fim de reflectir a argumentação aí expedida na motivação do recurso; - Como os pareceres chegaram em cima do termo do prazo, as alegações foram sendo sucessivamente aperfeiçoadas, completadas, alteradas em conformidade com tais argumentos; - As alegações ficaram definitivamente concluídas cerca das 23h40 do dia 17/06/… e foram de imediato enviadas por fax, mas, apesar de várias tentativas, não foi possível estabelecer comunicação de imediato; - O envio iniciou-se às 23h58m48s do dia 17/06/…, mas, sendo as mesmas extensas, a comunicação foi interrompida por causas não respeitantes ao fax do escritório da sociedade R., tendo ainda sido enviadas mais 38 páginas, não se tornando possível enviar mais, enquanto que o original das alegações foi entregue no início da manhã do dia seguinte; - Quer o TAC de Lisboa, quer o S.T.A., entenderam que as alegações não tinham sido apresentadas tempestivamente pelo facto da totalidade da peça não ter sido recebida até às 24h do dia 17/06/…, entendimento esse que os R.R. têm por controverso; - Uma vez que as probabilidades de insucesso da acção eram muito superiores às de ganho da causa, o que os A.A. sabiam, a perda da possibilidade do recurso para o STA não constitui, em si mesma, no caso concreto, um dano indemnizável autonomamente; - Não ocorre um nexo causal entre a deserção do recurso e um qualquer dano que os A.A. possam invocar, pelo que não existe qualquer obrigação de os R.R indemnizarem os A.A., à excepção do pagamento das cus-tas devidas pela deserção, o que já fizeram; - Os factos invocados para fundamentar os danos morais não têm correspondência com a realidade, tanto mais que boa parte da doutrina não admite danos morais na responsabilidade civil contratual; - A responsabilidade dos sócios da sociedade de advogados é subsidiária e não solidária, nos termos do art.º 19.º, n.º 2, do Dec.-Lei n.º 513-Q/79; - Os R.R. não invocaram o justo impedimento por entenderem que a sua interpretação do art. 150.º, n.º 2, alínea c), do CPC era a correcta e que as alegações tinham sido apresentadas tempestivamente; - O dano da perda da “chance” não é reconhecido nem admitido pela ordem jurídica portuguesa; - A R recebeu apenas € 122.783,99, a título de honorários e despesas de expediente, sendo que as demais despesas dizem respeito ao pagamento de pareceres e estudos; Concluíram os R.R. pela improcedência da acção e pela sua absolvi-ção do pedido, tendo, a par disso, deduzido incidente de intervenção principal provocada da Seguradora CST, S.A., com a alegação de que a R. transferira para esta a responsabilidade civil profissional.

  2. Os A.A. apresentaram réplica, dizendo que: - O primeiro objectivo dos...

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