Acórdão nº 330/07.0TBMCD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MARTINS
Data da Resolução03 de Julho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso nº 330/07.0TBMCD.P1 Apelação A: B…, Lda R: C…, S.A.

*Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: I- RELATÓRIO 1.

A A.

instaurou contra a R.

a presente acção declarativa sob a forma de processo comum ordinário[1] pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 144.187,03, correspondente a parte do seu contra-crédito que excede o crédito da R., acrescida dos juros legais a contar da citação.

Baseia a sua pretensão na violação, por parte da R., do regime de exclusividade e outros deveres que tinha para com a A., no âmbito de um acordo de distribuição ou concessão comercial exclusiva que tinham celebrado, o qual vigorou entre 2000 e 31.07.2007.

Na sequência da violação daqueles deveres por parte da R, a A resolveu o contrato e pretende ser ressarcida dos danos causados à sua imagem (€ 50.000,00), dos prejuízos pela violação da exclusividade (€ 78.000,00), por ter ficado com produtos impróprios para consumo (€ 4.361,54) e ter ainda produtos em stock que poderão ficar impróprios para consumo (€ 116.073,72), além de pretender uma indemnização por perda de clientela por si angariada (€ 95.122,69).

Considera-se assim credora da R. pelo montante global de € 227.484,23, declarando que aceita ser tal crédito parcialmente compensado pela quantia de que se considera devedora à R., por fornecimentos feitos por esta, no montante de € 83.297,20.

Contestou a R. pedindo a sua absolvição do pedido e, sem prescindir, considera que deve ser compensado o eventual crédito da A com o crédito que tem sobre ela, no montante de € 106.743,54.

Começa por deduzir as excepções de incompetência territorial[2] e de caducidade do direito de resolução.

Nega, depois, ter celebrado qualquer acordo sobre territorialidade ou exclusividade a favor da A., assim como nega ter passado a dispor, por si ou outrem, da clientela da A., sendo certo que esta comercializava outros produtos e comprava também a outros grossistas o mesmo tipo de produtos que comprava à R.

Impugna depois a generalidade dos factos alegados pela A e afirma desconhecer outros, alegando que as condições de venda da R. eram iguais para todos os seus clientes nas circunstâncias da A, concluindo que a degradação da relação comercial entre a A. e a R. resultou apenas do incumprimento dos prazos de pagamento por parte daquela.

Na réplica a A. pede a improcedência das excepções deduzidas e reafirma a posição expressa na p.i., nomeadamente que a relação comercial que vigorou entre a A. e a R. não se resumiu à celebração de sucessivos contratos de compra e venda de produtos com as marcas da R., sendo um verdadeiro contrato de concessão comercial.

Foi elaborado o despacho saneador, aí se concluindo pela competência do tribunal e verificação dos restantes pressupostos processuais, pela inexistência de nulidades, excepções dilatórias ou peremptórias, bem como questões prévias de conhecimento oficioso, tendo-se no entanto relegado para final o conhecimento da excepção de caducidade.

Procedeu-se à selecção dos factos assentes e à elaboração da base instrutória, com reclamação por parte da R., não atendida.

  1. Prosseguindo o processo os seus regulares termos veio a final a ser proferida sentença que julgou improcedente a excepção de caducidade e parcialmente procedente a acção, declarando que a A tem sobre a R. um crédito no montante de € 37.000,00, o qual foi declarado extinto, por compensação, com a correspondente parte do crédito da R., absolvendo esta do demais peticionado.

  2. É desta decisão que, inconformadas, quer a A. quer a R. vêm apelar.

    A A pretende que seja dado provimento ao recurso e, em consequência disso, que seja fixada a indemnização global a receber da R. no montante de € 137.776,52.

    Por sua vez, a R. invoca erro de julgamento da matéria de facto e incorrecta aplicação do direito, concluindo pelo provimento do seu recurso.

    3.1. Alegando, conclui a A.

    : 1. A progressiva internacionalização da economia e o processo de integração europeia, por um lado, e as profundas alterações sociais que se operaram em Portugal, por outro, exigem dos tribunais a tomada de consciência de que muitas vezes o principal activo de uma sociedade comercial não é propriamente o direito de propriedade sobre os seus imóveis e equipamentos mas, sobretudo, a relevância e a qualidade das relações contratuais que mantém com os seus parceiros comerciais.

  3. Ao contrário de outras áreas, como por exemplo, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual e do direito dos seguros, em que os nossos tribunais arbitram indemnizações ao nível da média daquelas concedidas pela generalidade dos tribunais europeus, em sede de atribuição de indemnizações decorrentes da violação de contratos comerciais as indemnizações concedidas são, em regra, miserabilistas e francamente simbólicas, completamente desajustadas da realidade económica e social.

  4. Em face dos factos provados a “indemnização de clientela” só poderá ser considerada equitativa se fixada pelo tecto máximo legal, ou seja, em € 55.0000,00.

  5. Esta compensação traduz uma medida mais próxima do instituto do enriquecimento sem causa do que da responsabilidade civil.

  6. Pelo que não faz qualquer sentido apelar à média anual do “lucro líquido” auferido pelo Agente, pois, não se pretende ressarcir os danos reais sofridos pelo agente em consequência directa e necessária de uma acto ilícito do principal.

  7. Com efeito, “não se pretende ressarcir o agente de quaisquer danos, antes compensá-lo pelos benefícios que a outra parte continua a auferir e que se devam, no essencial, à actividade do seu ex-agente. Mesmo que este não sofra danos, haverá um enriquecimento do principal que legitima e justifica uma compensação”, (Vide António Pinto Monteiro, excerto do Parecer anexo).

  8. Não há aqui que aplicar o regime estabelecido no C. Civil para a obrigação de indemnização (artºs. 483º e 798º C. Civil).

  9. O lucro líquido está talhado para a obrigação de indemnização nos termos gerais.

  10. Se fosse para compensar o Agente dos lucros reais que deixou de auferir, então haveria que ter em consideração que após a cessação do contrato o concessionário, ao contrário do agente, continua a ter que suportar os investimentos, rendas, salários, impostos, seguros, indemnizações, compromissos financeiros etc.

  11. Sendo com o lucro bruto ele fazia face a todos esses encargos, o seu prejuízo real corresponderia à perda de lucro bruto que o contrato lhe proporcionava.

  12. Os concessionários realizam, em regra, investimentos em instalações, recursos humanos, viaturas, equipamentos publicidade, etc.

  13. Ao invés, o agente não suporta os investimentos e os custos de exploração comercial das respectivas marcas que representa, limitando-se a vender em nome e por conta do principal.

  14. Por vezes nem sequer emitem uma factura relativa à revenda, antes se limitam a emitir um recibo de comissões a favor do principal.

  15. Assim, e até por argumento de maioria de razão, faz todo o sentido utilizar o critério do lucro bruto na atribuição da indemnização de clientela ao concessionário.

  16. O critério do “lucro líquido”, apesar de ser seguido pela jurisprudência nacional, conduz a soluções injustas e desfasadas da realidade.

  17. Imagine-se uma concessão com mais de cinco de anos de duração, sete, por exemplo, como a dos presentes autos, mas em que nos últimos cinco anos a sua exploração foi deficitária.

  18. Ora, de acordo com o critério do lucro líquido não assistiria ao concessionário qualquer direito ou compensação pela clientela angariada.

  19. Ora, a jurisprudência belga determina a indemnização compensatória dessa concessão deficitária em função do benefício bruto auferido nos dois ou três exercícios anteriores à cessação do contrato.

  20. E em Espanha existe uma tendência generalizada na jurisprudência para conceder o tecto máximo legal da chamada indemnização de clientela.

  21. É manifesto que para a Ré/Recorrida a cessação do contrato não representou a supressão de qualquer rendimento, na medida em que a clientela angariada pela Autora/Recorrente passou a ser abastecida pelos novos distribuidores nomeados pela Ré/Recorrida, em substituição da Autora/Recorrente.

  22. Já para a Autora/Recorrente a extinção do contrato representou a cessação da distribuição das marcas da Ré/Recorrida.

  23. Para efeitos de determinação dos lucros cessantes o douto tribunal “a quo” só tomou em linha de conta o período correspondente ao ano de 2006.

  24. Ora, de acordo com o critério usado na douta sentença ter-se-á de concluir que no período de 01.01.2006 a 31.07.2007, data da extinção do contrato, a Autora/Recorrente viu os seus lucros reduzidos na ordem dos € 51.680,49, razão pela qual a indemnização por lucros cessantes deve ser fixada em € 50.000,00.

  25. Pelas razões supra expostas justifica-se a obrigação de retoma do stock, em espécie, pela Ré, com base no princípio da boa fé.

  26. Consequentemente, deve operar-se a compensação do crédito que assiste à Autora/Recorrente, decorrente da retoma de stock, no valor de € 116.073,72, com o contra crédito da Ré/Recorrida emergente do saldo da conta corrente existente à data da cessação do contrato, no valor de € 83.297,20.

  27. Assim, deve a Ré/Recorrida ser condenada a pagar à Autora/Recorrente o remanescente do crédito aludido na antecedente conclusão, no valor de € 32.776,52, acrescido da quantia de € 55.000,00, a título de indemnização de clientela e ainda da quantia de € 50.000,00, a título de lucros cessantes.

  28. A douta sentença recorrida acolhe errada interpretação e aplicação, nomeadamente, do disposto no art. 34º do DL. 178/86, de Julho, 562º, 564º, 239º, 433º e 434º, todos do C. Civil.

    3.2.

    Já a R.

    remata as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Ocorreu incorrecto julgamento dos concretos pontos 15, 16, 20, 23, 27, 28, 30, 33, 39, 42, 44, 46, 47, 48, 50, 52, 53, 55, 58, 59, 69, 71, 72 e 78 de facto da douta sentença.

  29. Com efeito deve o Tribunal “ad quem” considerar apenas provados, a propósito daqueles concretos pontos de facto, apenas que: “15. Um dos...

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