Acórdão nº 3425/03.6TBGDM.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução19 de Dezembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 3425/03.6TBGDM.P2 Gondomar Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Apelante/ré: B… Apelados/autores: C…, D… e mulher, E….

1.1. No 2º juízo cível do Tribunal Judicial de Gondomar intentaram os apelados/autores, em 11 de Julho de 2003[1], a presente acção declarativa com processo ordinário, pedindo a condenação da apelada/ré a fechar uma abertura que construiu no muro de divisão do seu prédio.

Em síntese, alegaram que: A autora C… é dona e proprietária do prédio denominado “…”, descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar sob o nº 00120 e inscrito na respectiva matriz sob o artº 598, sito no …, concelho de Gondomar e os autores D… e E… usufrutuários do mesmo.

Prédio que confronta a nascente com dois prédios da Ré, um urbano descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar sob o nº 00680 e inscrito na matriz sob o artº 87, o outro rústico inscrito na matriz sob o artº 599º, da freguesia ….

Apesar do acesso aos seus prédios que a via pública lhe permite, pela Rua …, a ré, nos meses de Janeiro e Fevereiro do ano de 2003, construiu uma abertura no muro de vedação, contíguo ao prédio propriedade da autora C… e nela instalou um portão.

Abertura que deitando directamente sobre o prédio da autora, não respeita o intervalo de metro e meio que a lei determina e, por isso, deve ser fechada.

Não obstante, acrescentaram que: Os segundos autores desde sempre – mesmos enquanto arrendatários, desde 1954 até 12 de Dezembro de 1972 e proprietários que foram – gozaram as utilidades e fruíram de toda a área que constitui o prédio denominado “…”, sem exclusão da parcela de terreno que, em tempos, serviu de passagem.

E enquanto arrendatários e proprietários deste consentiram, até há cerca de 30 anos (até 1974) que os habitantes da Rua …, no …, utilizassem uma parcela de terreno do prédio denominado “…”, contígua aos prédios que agora são da ré, exclusivamente para fazerem a ligação à Rua …, encurtando de forma não significativa o percurso de acesso a um fontanário, que se situava na Rua …, a cerca de 500 metros do prédio dos autores, consentimento que vinha sendo dado pelos anteriores proprietários e seus antecessores.

Passagem que os habitantes da Rua … deixaram de utilizar há, pelo menos, trinta anos e isto porque foram construídos dois novos fontanários, ambos na Rua …, um no seu início, outro no seu termo e existe há, pelo menos, 15 anos rede pública de abastecimento de água no … e os fontanários raramente são utilizados.

Os autores sempre agiram (desde 1954) relativamente à parcela de terreno como se a mesma integrasse o seu prédio, procedendo à sua limpeza e manutenção, à vista de todos, sem oposição alguma, ininterruptamente e na convicção de exercerem um direito próprio e os habitantes do … sabem que aquela parcela de terreno pertence aos autores.

Contestou a ré e formulou pedido reconvencional.

Os seus prédios, sustenta, não confrontam com o prédio dos autores.

E isto porque todos confrontam, os prédios da ré a poente e o prédio dos autores a nascente, com um caminho de passagem pública, que os separa.

Caminho que fazendo a ligação entre a Rua … e a Rua …, serviu livremente à circulação dos habitantes da freguesia …, durante mais de 100 anos e até 2003.

E foi usado por toda a população da localidade que nele circularam nas idas e vindas para a praia do rio …, para circular entre habitações e propriedades rústicas circunvizinhas, para a passagem anual do compasso, pela Páscoa, para ir e vir do trabalho, para se deslocarem aos serviços religiosos da igreja paroquial, para se abastecerem de água num fontanário público, que fica abaixo, para lá da Rua …, para se servirem dum lavatório público, que fica naquele fontanário.

Uso e fruição directa e imediata do caminho que foi exercida livremente por toda a população, sem oposição de quem quer que fosse, no convencimento de cada um de que se servia dum caminho com destino público, entre as ruas … e …, a que serve de ligação.

Existindo, aliás, uma acção popular, a correr termos no 3º Juízo Cível do Tribunal de Gondomar, em que é pedido o reconhecimento da parcela de terreno como caminho público.

A ré reconstruiu um muro preexistente e limitou-se a deixar nele um espaço de passagem ou entrada para o seu prédio, entrada que sempre existiu e que, de qualquer forma, não deita sobre o prédio dos Autores e, assim, deve ser absolvida do pedido.

Reconvindo, continua: Os autores mandaram construir um muro de blocos de cimento e colocaram um portão de ferro no topo sul do caminho que ocupam toda a entrada para o caminho e impede o livre trânsito através dele.

Obra ilícita porque viola os direitos da população e também os da ré reconvinte que por si e seus antecessores, desde há mais de 50 anos, passavam livremente pelo caminho e através dele acediam ao seu prédio rústico, o qual não tem outra saída para a via pública, por uma abertura existente no velho murete de vedação, em pedrinhas de xisto, que ladeava o caminho, por aí circulando a pé, sempre que quiseram e necessitaram, transportando materiais e, em tempos, as suas ovelhas, o que fizeram à vista de todos, sem oposição de ninguém, plenamente convencidos de exercerem um direito próprio, sem depender de autorização ou tolerância de quem quer que fosse.

Conclui pedindo a condenação dos Autores: - a reconhecerem que entre os seus prédios e o prédio destes existe um caminho de livre acesso público, ligando a Rua … à Rua …; - a absterem-se de impedir ou limitar a livre passagem da Ré por esse caminho; - a levantarem o portão e destruírem o muro com o qual taparam o caminho, no prazo de dez dias após o trânsito em julgado da sentença, sob pena de sanção pecuniária compulsória de € 75,00 diários; - a reconhecerem subsidiariamente o direito de servidão de livre acesso ao seu prédio rústico; - ou ainda, a ser declarada constituída uma servidão legal de passagem sobre o prédio dos autores, a favor do prédio da ré.

Replicaram os autores impugnando os factos alegados pela ré e mantendo, no essencial, aqueles que foram por si alegados.

1.2. Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, sem reclamações foi proferido despacho que respondeu à matéria de facto e depois proferida sentença[2] que julgou: - a acção improcedente e absolveu a ré do pedido; - a reconvenção parcialmente procedente e condenou os Autores a reconhecer que entre o seu prédio e os da Ré existe um caminho de livre acesso público, ligando a Rua … à Rua …, absolvendo-os do demais pedido.

1.3. Os autores, inconformados, interpuseram recurso de apelação e, subordinadamente, o mesmo fez a ré.

Apelação que originou o Acórdão deste Tribunal da Relação de 1/6/2009[3], que deliberou: Julgar parcialmente procedente o recurso de apelação da Autora, mantendo a decisão recorrida na parte em que absolve a Ré do pedido, mas revogando a decisão na parte em que julga parcialmente procedente o pedido reconvencional, considerando-o agora totalmente improcedente; Julgar improcedente o recurso subordinado: 1.4. Não se conformando, a ré pediu revista.

O Supremo Tribunal de Justiça, em Acórdão de 8/4/2010[4], encontrou nos factos provados, que indicou, uma intrínseca contradição, e, assim, determinou: “Anula-se a decisão recorrida para que o processo volte ao tribunal recorrido e aí, se possível com os mesmos Juízes, possam ser resolvidas as contradições apontadas.” 1.5. No Acórdão desta Relação de 14/7/2010[5] deliberou-se: “(…) em anular o julgamento realizado na 1ª instância devendo a repetição do julgamento abranger os quesitos relativamente aos quais foi referida contradição pelo STJ, sem prejuízo de o Tribunal ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim exclusivo de evitar contradições na decisão, nos termos do artº 712º, nº4 do CPC.

1.6. Por despacho[6], sem reclamações, foi proferida nova decisão quanto à matéria de facto quantos às respostas sobre a matéria dos quesitos 2º, 5º, 6º, 30º, 31º, 40º, 46º, 48º, 50º e 55º e em seguida proferida sentença[7], em cujo dispositivo se consignou: - Julgo a presente acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolvo a ré B… do pedido contra si formulado pelos autores C…, D… e E…; - Julgo totalmente improcedente a reconvenção deduzida, absolvendo os reconvindos C…, D… e E… da totalidade dos pedidos reconvencionais formulados pela reconvinte B….

1.7. É desta sentença que a ré, uma vez mais irresignada, interpôs o presente recurso, exarando as seguintes conclusões que se transcrevem: “1. Em duas acções distintas da primeira Instância, em que intervieram os ora Recorridos, foram proferidas sentenças por distintos Juízes, que apreenderam directa e imediatamente os impressionantes depoimentos das testemunhas, que presenciaram também a numerosa assistência presente nas audiências de discussão e julgamento, provinda exactamente … ou localidade do caminho público em causa, em que, não tendo ficado com dúvidas nenhumas sobre a existência duma área ou faixa de terreno que desde tempos imemoriais era usada como caminho de todos, área bem delimitada, inclusive por marcos entre os prédios confinantes, e não tendo também duvidado sobre o empenhado e relevante interesse colectivo das populações circunvizinhas na utilização da referida área do domínio público, que não admitiam (nem admitem) perder, decidiram no sentido de condenar os aqui Recorridos a reconhecerem que entre o seu prédio e os da Recorrente existe um caminho de livre acesso público, ligando a Rua … à Rua …, ou, por outras palavras, declarando que entre a Rua … e a Rua …, entre as habitações de D… e de B…, existe um caminho público, que aquele caminho público pertencente ao domínio público da freguesia …, concelho de Gondomar, que é ilegal, ilícita e ilegítima a apropriação e a ocupação do solo e domínio público que os Recorridos efectuaram com a construção do portão e do muro no identificado caminho.

  1. No caso dos autos, a primeira decisão no sentido indicado na conclusão anterior, foi revogada em segunda Instância...

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