Acórdão nº 245-B/2002.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Junho de 2008

Magistrado ResponsávelJORGE ARCANJO
Data da Resolução03 de Junho de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I – RELATÓRIO 1.1. - A... – deduziu embargos de terceiro por apenso ao procedimento cautelar de arresto que B... instaurou, na Comarca de Tomar, contra C..., Alegando, em resumo, haver comprado, em 13 de Março de 2002, ao Stand «D...», sito na Avª. Carvalheiro, freguesia de Galegos em Penafiel, o veículo automóvel arrestado em 16/5/2002, com inscrição no registo a seu favor, pediu Que seja reconhecido o direito de propriedade do embargante sobre o veículo automóvel ligeiro de passageiros arrestado, de marca «Volkswagen», modelo «Sharan» e matrícula 16-27-IA e que a posse sobre o mesmo lhe seja restituída.

Contestou apenas a requerente do arresto, B..., defendendo-se por impugnação motivada, arguindo ainda a falsidade da declaração de venda com base na qual foi registado o veículo.

No saneador afirmou-se a validade e regularidade da instância.

1.2. - Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença que decidiu pela improcedência dos embargos.

1.3. - Inconformado, o embargante recorreu de apelação, com as seguintes conclusões: (…) Não foram apresentadas contra-alegações.

II - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. – O objecto do recurso: O recorrente impugna a matéria de facto, mas omitiu o ónus da especificação, nos termos do art.690-A nº1 do CPC.

A revisão do Código de Processo Civil, operada pelo DL 329-A/95 de 12/2, instituiu, de forma mais efectiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto. Porém, o poder de cognição do Tribunal da Relação sobre a matéria de facto não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento de facto. Desde logo, a possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados, com os pressupostos adrede estatuídos no art.690-A nº1 e 2 do CPC.

A razão de ser da exigência do ónus da especificação consta do preâmbulo do Dec.Lei nº39/95 de 15/2, visando afastar a possibilidade de o recorrente se limitar “a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo pura e simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em 1ª instância e manifestando genérica discordância com o decidido”, decorrendo ainda dos princípios estruturantes da cooperação, lealdade e boa fé processuais.

Os concretos pontos de facto impugnados devem ser feitos nas respectivas conclusões, porque delimitadoras do âmbito do recurso e constituírem o fundamento da alteração da decisão. Já quanto à especificação dos meios probatórios, a lei não impõe que seja feita nas conclusões, podendo sê-lo no corpo da motivação ( cf., por ex., Ac do STJ de 20/11/2003, de 8/3/06, de 13/7/06, disponíveis em www dgsi.pt/jstj ), mas em todo o caso impõe-se a obrigatoriedade de conexionar cada facto censurado com os elementos probatórios correspondentes.

Sobre a sanção para o incumprimento do ónus da especificação, existem actualmente duas teses: a) - Uma, no sentido da rejeição imediata do recurso, sem prévio convite. Argumenta-se, para o efeito, não só com a letra da lei ( “ deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição” ), como com a interpretação sistemática, pois se fosse aplicável a regra do art.690 nº4 do CPC o legislador tê-lo-ia dito, e a própria teleologia, o duplo grau em matéria de facto converge com o ónus da especificação, já que, de outro modo, implicaria numa substituição pelo tribunal do ónus que impende sobre as partes de litigar diligentemente, contendendo com o direito da outra parte a fazer valer, segundo o princípio da igualdade, da forma como a contra-parte litiga ( arts.3 e 264 do CPC ) ( cf., neste sentido, por ex., AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., pág.157, LOPES DO REGO, Comentários ao Código de Processo Civil, pág.466, Ac STJ de 20/5/04, de 1/7/04, de 25/11/04, de 29/11/05, de 7/12/05, 25/5/06, de 14/9/06, disponíveis em www dgsi.pt/jstj ).

  1. - Outra, que defende o convite ao aperfeiçoamento apenas quando estiver em causa uma mera deficiência do ónus de especificação, tanto por aplicação analógica do art.690 nº4, como da regra geral dos arts.265 nº2 e 266 nº2 do CPC.

Justifica-se, para tanto, que a sanção deve ser proporcional à gravidade do incumprimento, cominando a lei a rejeição imediata do recurso, à semelhança da imediata deserção no caso de falta (absoluta) de alegações (art.690 nº3 do CPC), mas já não quando ocorre uma simples deficiência ( cf., por ex., Ac do STJ de 20/3/03, 29/11/05, de 6/7/06, de 13/7/06, de 7/2/07, em www dgsi.pt/jstj ).

Analisando as alegações do embargante, constata-se não haver individualizado, nas respectivas conclusões, “os pontos de facto” que pretende impugnar, limitando-se a afirmar genericamente que a decisão “assenta em factos que não devem ser considerados provados” Por isso, verificando-se total omissão sobre o ónus de especificação, por ausência de individualização da matéria questionada, impõe-se a rejeição do recurso de facto.

Deste modo, o objecto do recurso circunscreve-se à questão de direito, designadamente, quanto a saber se está comprovada a titularidade do direito de propriedade do embargante sobre o veículo automóvel arrestado.

2.2. – Os...

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