Acórdão nº 1551/09.7TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 28 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO ROMBA
Data da Resolução28 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa “A” intentou a presente acção declarativa com processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra ““B”, EPE – ..., Entidade Pública Empresarial”, alegando, em síntese que foi admitida, em 01.01.1981, ao serviço “C” (“C”), à qual sucedeu o ora réu (por força do Dec. Lei n.º 160/2007 de 27.04), tendo exercido desde aquela data as funções de Bailarina, Professora de Bailado, Assessora da Direcção Artística, Directora do Centro de Formação de Bailarinos da “C”, Directora de Produção e Assessora da Direcção de Espectáculos do “D” (“D”), esta última em regime de comissão de serviço desde 15.05.2008. Desde que o réu foi criado, as funções que a autora exercia desde 01.01.1997, e inerentes à categoria de Directora de Produção, foram abrangidas na sua quase totalidade pelas funções que passaram a ser desempenhadas pela trabalhadora “E”, que foi nomeada Directora de Espectáculos do réu. Em consequência, e desde Janeiro de 2008, a autora interpelou o réu, por escrito e verbalmente, solicitando que lhe fossem definidas funções, uma vez que não lhe era distribuído qualquer tipo de trabalho. Só em Maio de 2008 o réu outorgou com a autora um Acordo de Comissão de Serviço, por um período compreendido entre 15.05.2008 e 14.05.2009, mediante o qual a autora passaria a desempenhar as funções de Assessora da Direcção de Espectáculos do “D”. Contudo, a autora continuou sem qualquer trabalho efectivo distribuído, apesar de continuar a solicitá-lo. Em 16.03.2009 foi-lhe comunicado que, com efeitos a partir de 29.03.2009, e até 12.08.2009, deveria gozar dias de descanso compensatório por trabalho prestado de 2003 a 2007. O réu violou, assim, o dever de ocupação efectiva da autora, o que lhe acarretou uma depressão psicológica grave que se «vem adensando desde Dezembro de 2007», e que implicou o seu tratamento psiquiátrico. A autora é conhecida por ter uma carreira brilhante, de excelência, tendo-se sentido humilhada perante colegas e terceiros pela forma como foi tratada pelo réu.

Concluiu pedindo que o réu seja condenado ao pagamento da indemnização a título de danos não patrimoniais no valor de € 25.000,00 por violação do direito de ocupação efectiva da autora e a pagar, desde a data da citação, uma sanção pecuniária compulsória no valor de € 200,00 devida até à data de atribuição de efectivas funções à autora, ocorrida em Setembro de 2010[1].

O réu contestou, impugnando parte dos factos alegados pela autora e sustentando que, por força da criação do ““B””, foi necessário proceder a uma reestruturação de departamentos e serviços (que ainda não se encontrava concluída à data da Contestação) e que quando foram apresentadas propostas à autora esta entendeu sempre precisar, negociar e discutir as mesmas, antes de iniciar funções. Mais alegou a inexistência de nexo causal entre os danos que a autora alegou e a conduta do réu ou que este tenha agido ilicitamente ou de forma culposa. Concluiu pedindo que fosse a acção declarada improcedente, por não provada, e o réu absolvido dos pedidos.

A autora respondeu, invocando litigância de má-fé do réu, pelo facto de este não desconhecer os factos alegados na p. i., pedindo a condenação deste em multa não inferior a 15 UCs e em indemnização cujo valor relegou para liquidação posterior.

Após o saneamento do processo, a autora veio deduzir articulado superveniente alegando, em síntese, que em 16.09.2009 o réu propôs à autora uma alteração do objecto do contrato de trabalho, em que esta passaria a desempenhar as funções de Gestor de Procedimento, integrada na Direcção Financeira e Administrativa. Como as novas funções não exigiriam a respectiva prestação fora dos limites máximos do período normal de trabalho, o réu entendia que deveria cessar o pagamento da quantia recebida pela autora a título de isenção de horário. A autora disponibilizou-se para negociar tal proposta, desde que não implicasse prejuízo patrimonial sério como o que encerrava a proposta de deixar de receber a quantia mensal de € 1.034,10 a título de isenção de horário, por entender que esta quantia devia ser entendida como uma verdadeira retribuição, atentas as condições em que foi atribuída e recebida. O réu deixou de pagar, em 23.10.2009 a mencionada quantia, paga sob a denominação de isenção de horário de trabalho. A autora foi colocada a substituir uma colega, exercendo funções não compreendidas no objecto do seu contrato, não estando preenchidos os pressupostos da mobilidade funcional. Entretanto, a autora sente-se vexada e o seu estado de saúde agravou-se, tendo passado a frequentar a consulta de psiquiatria no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, encontrando-se incapacitada temporariamente, à data do requerimento de articulado superveniente, para exercer as suas funções.

Concluiu pedindo que a quantia auferida a título de isenção de horário seja considerada como fazendo parte da retribuição base, que seja declarada ilegal a decisão da ré de, ao abrigo da mobilidade funcional, ordenar à autora o desempenho de funções desempenhadas por outro trabalhador e a “reintegração” da autora na sua categoria profissional de Directora de Produção, com pagamento das quantias em dinheiro que ilicitamente lhe foram retiradas ou, caso não se entenda que está verificada a modificação substancial da posição da autora, ainda assim seja o réu condenado a devolver a quantia retirada, atento o princípio da irredutibilidade da retribuição e, em qualquer caso, condenar o réu a pagar à autora a quantia de € 25.000,00 a título de danos morais.

O réu respondeu, impugnando os factos e o direito alegados pela autora, concluindo pela improcedência dos pedidos formulados.

Após audiência de julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, 1. condenou o réu a pagar à autora, como parte da sua retribuição, a quantia mensal ilíquida de € 1.034,10 (mil e trinta e quatro euros e dez cêntimos) desde 23.10.2009, até ao trânsito em julgado da presente decisão e para o futuro, excepto as vencidas entre 12.11.2009 e 30.06.2010, acrescidas dos respectivos juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos desde as datas dos respectivos vencimentos e até efectivo e integral pagamento, 2. condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 500,00 (quinhentos euros) a título de indemnização por danos morais, acrescida dos respectivos juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos desde a data da citação do réu e até efectivo e integral pagamento, 3. absolveu o réu dos demais pedidos formulados pela autora e, ainda, do pedido de litigância de má fé.

O R. recorreu, formulando nas respectivas alegações as seguintes conclusões: (…) A A. contra- alegou, pugnando pela improcedência do recurso.

O objecto do recurso consiste na reapreciação das questões de saber se a prestação paga a título de “isenção de horário” podia ser suprimida por decisão do R. e, por outro lado, se estão preenchidos os pressupostos “ilicitude” e “nexo de causalidade” para a condenação em indemnização por dano não patrimonial.

Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1. A autora trabalhou, desde 01.01.1981, sob as ordens, direcção e fiscalização da “C”, tendo exercido, desde aquela data, as funções inerentes às categorias de Bailarina, Professora de Bailado, Assessora da Direcção Artística, Directora do Centro de Formação de Bailarinos da “C” e Directora de Produção.

  1. A autora exerceu as funções de Directora de Produção desde 01/01/1997 e incumbiam-lhe as seguintes funções: • Planificar, de acordo com as indicações do Director Artístico, a prestação do Elenco Artístico, dos artistas convidados e dos criadores; • Negociar a contratação de artistas, criadores e técnicos especializados; • Fazer as consultas necessárias à elaboração dos orçamentos relativos à aquisição de materiais para cenários e figurinos, som, iluminação e outros equipamentos; • Colaborar na organização de ensaios, espectáculos, digressões e estadias, quer do elenco artístico, quer do pessoal técnico, quer ainda dos artistas convidados e dos criadores; • Elaborar os cálculos para pagamento dos Direitos de Autor e direitos conexos; • Apoiar administrativa e logisticamente o elenco artístico; • Elaborar informações, propostas e mapas de despesas; • Gerir o Stock e a distribuição de sapatilhas/calçado de dança; • Estabelecer ligação funcional entre a Direcção de Produção e o Coordenador Técnico, designadamente fornecendo material e diligenciando pela reparação de material; • Auxiliar o Coordenador Técnico na elaboração do Inventário do equipamento que seja propriedade da ré.

  2. O “B”, EPE”, ora réu, foi criado pelo Dec-Lei n.º 160/2007 de 27.4 e passou a integrar o “D” (“D”) e a “C” (“C”).

  3. Sucedendo automática e globalmente à “C”, continuando a personalidade jurídica desta e conservando a universalidade de direitos e obrigações integrantes da sua esfera jurídica no momento da transformação, sendo o novo titular do acervo de direitos e obrigações emergentes da relação jurídico-laboral celebrada entre a autora e aquela Companhia.

  4. O descrito em 3. impôs a reestruturação de departamentos e serviços da “C” e do “D”.

  5. Na “C” existiam duas Directoras de Produção: a de Produção da “C” e a de Produção do “F”.

  6. Uma das medidas de reestruturação foi unir, sob a figura de uma única Directora, as estruturas afectas às produções da “C” e do “F”.

  7. Em 19.12.2007 foi entregue à autora, e aos demais trabalhadores do réu, o Regulamento Interno do “B”, cujo documento se encontra junto a fls. 37 a 58 e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

  8. Em 21.12.2007 foi comunicado à autora e a todos os trabalhadores do “B” a Ordem de Serviço nº 01/07, com um Organigrama como anexo I e com entrada em vigor em 02.01.2008 que, entre outros aspectos, procedeu à nomeação da trabalhadora “E” para a Direcção de Espectáculos “C”.

  9. A partir desta data a autora deixou de...

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