Acórdão nº 903/08.4TVLSB.L1-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 01 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelILÍDIO SACARRÃO MARTINS
Data da Resolução01 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa I - RELATÓRIO A…, Ldª intentou acção ordinária contra B…, S. A, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 7.392.025,22 até 2007 e ainda o que se vier a liquidar em execução de sentença, considerando os resultados positivos que poderia ter alcançado entre 2007 e 2017.

Alegou, em síntese, que celebrou com a ré (à data com outra denominação) três contratos de locação financeira e que a mesma deveria actualizar as rendas de acordo com a Euribor.

A pedido da autora, a ré não o fez, estando assim numa situação de incumprimento contratual. A autora deixou de lhe pagar as rendas de um dos contratos (estando os outros já findos). Mais alega que, face a tal não pagamento, a ré comunicou o não cumprimento da autora ao Banco de Portugal e à Apelease, tendo tais informações circulado e que, por isso, os seus franquiados deixaram de lhe pagar e deixou de lograr crédito, tendo tido prejuízos no valor pela mesma pedido, tendo cessado a sua actividade.

Contestando, quer por impugnação, quer por excepção, veio a ré alegar que a correcção das rendas não foi tempestivamente por si feita, por lapso informático, mas que a fez posteriormente e que, de qualquer modo, o valor total da referida correcção, quanto ao contrato vigente era de cerca de € 400,00 e, quanto a todos de pouco mais de € 1.000,00 quando cada renda era, no essencial, de cerca de € 3.000,00.

Termina, pedindo a improcedência da acção por, de qualquer modo, a autora não poder, ainda que provasse todos os factos por si alegados, pretender obter os valores por si peticionados apenas com base num plano de negócios que mais não é do que uma previsão e que nem estava a correr como previsto.

Houve réplica, mantendo o pedido formulado na petição inicial.

Foi proferida SENTENÇA que julgou improcedente a acção e absolveu a ré do pedido.

Não se conformando com a douta sentença, dela recorreu a autora, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: 1ª - Nos contratos que estabeleceram entre si a autora assumiu a obrigação de pagar rendas à ré e esta assumiu a obrigação de, ocorrendo certas circunstâncias (variação contratualmente relevante da taxa Lisbor, mais tarde Euribor), liquidar o montante das rendas futuras.

  1. - As rendas que a autora tinha obrigação de pagar tinham sido liquidadas no próprio contrato e constavam dele mas, se ocorressem as mencionadas circunstâncias contratualmente definidas, a ré estava obrigada a liquidar novamente essas rendas de acordo com o teor e extensão dessas circunstâncias.

  2. - É certo que a autora recusou prestar à ré uma outra prestação, mas que já lhe não devia, uma vez que tinham ocorrido as tais circunstâncias contratualmente previstas que impunham nova liquidação, que a ré não realizou.

  3. - A autora jamais recusou prestar à ré o que legalmente lhe devia; a ré é que, tendo obrigação de lhe transmitir o resultado da liquidação a que estava obrigada o não fez e com isso impediu a autora de cumprir, pelo que não são as regras do artigo 428º do código civil que estão em causa, mas sim a do nº 3 do artigo 805º do mesmo código.

  4. - Não se compreende a não correspondência entre as duas obrigações referida na sentença em recurso, uma vez que elas estão ligadas num aspecto e apenas num: a obrigação da autora só poderia ser cumprida demais de a ré cumprir a sua.

  5. - As comunicações da ré ao Banco de Portugal e à Applease no sentido de que a autora tinha incumprido foram abusivas e praticadas apenas com a finalidade de coagir a autora a pagar quantias que não tinha a obrigação de lhe pagar.

  6. - Essas comunicações não foram legítimas: foram ilegítimas e, tenham os seus efeitos sido queridos ou não pela ré o certo é que conduziram à cessação da actividade da autora, ao desmembramento do seu projecto de actividade plasmado no plano de negócios com o prejuízo potencial de quase oito milhões de euros e com o prejuízo real de quatrocentos e oitenta mil euros.

  7. - A sentença em recurso fez errada interpretação e aplicação da lei e com isso violou pelo menos o disposto no artigo 428º e no nº 3 do artigo 805º, ambos do Código Civil.

  8. - Pelo que deve ser revogada e substituída por outra que condene a ré como vem pedido na petição inicial ou, caso se entenda que a ré não provou com suficiente relevância os prejuízo que acima menciona, então que seja a ré condenada no pagamento à autora da indemnização a liquidar em execução de sentença, A parte contrária respondeu, pugnando pela manutenção da sentença.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir II - FUNDAMENTAÇÃO

  1. Fundamentação de facto A)A primeira instância considerou assente a seguinte matéria de facto: A)1º- Por escritura pública lavrada no dia 31 de Dezembro de 1997 no --- Cartório Notarial de Lisboa CM...…, AM… e JC… declararam constituir entre si uma sociedade por quotas que adoptava a firma “ M…., Lda. “, cuja sede se situaria na Av. …, nº …, em …, freguesia de …, sendo o seu objecto social o da difusão e inovação de negócios nacionais e internacionais, gestão e exploração de franquias, gestão e administração de negócios, importação, exportação e comercialização de grande variedade de mercadorias, realização de estudos empresariais, consultoria não jurídica, representações comerciais e prestação de serviços tecnológicos e de marketing, sendo o respectivo capital social de 3.000.000$00, correspondente à soma de três quotas iguais no valor nominal de 1.000.000$00, da titularidade de cada um dos sócios - (A).

    A)2º - Nos termos da escritura referida em 1 - a gerência da sociedade aludida em 1 – seria exercida por um ou mais gerentes a designar em assembleia geral, tendo à data referida em 1 sido designados gerentes todos os sócios, obrigando-se a sociedade pela assinatura conjunta de dois deles - (B).

    A)3º- Com data de 6 de Dezembro de 2004 foi averbada a cessação de funções dos sócios gerentes da autora aludidos em 2 - por exoneração, verificada em 20.8.2004, tendo sido nomeado gerente CS… - (C).

    A)4º - No dia 4 de Agosto de 1998 a B… SA... acordou com a autora ceder a esta o uso de determinado equipamento pelo prazo de 48 meses contra o pagamento de 16 rendas trimestrais postecipadas e indexadas, no valor, cada uma, de 586.368$00, quantia acrescida de I.V.A. à taxa legal e com a faculdade de, no fim do referido prazo, a autora adquirir o referido equipamento à autora contra o pagamento de um valor residual correspondente a 2% e no valor total de Esc. 194.117$00, com I.V.A. incluído -(D).

    A)5º - Nos termos do acordo referido em 4º, as rendas, quando indexadas, seriam actualizadas em função das alterações que viessem a ocorrer na Lisbor a 3 meses e sempre que o valor acumulado fosse superior a 1 ponto percentual em relação à última alteração, devendo as mesmas alterações ter lugar no final de cada trimestre civil e produzir efeitos na renda imediatamente seguinte, sendo a primeira data de referência para indexação a da data da comunicação à autora do valor das rendas para o presente contrato - (E).

    A)6º - Para garantia do cumprimento do acordo referido em 4 -, com o nº 20598, foram entregues duas livranças em branco subscritas pela autora e avalizadas pelos sócios da mesma e seus cônjuges, com autorização de preenchimento -( F).

    A)7º - Por carta datada de 20.12.1998 dirigida à autora e que a mesma recebeu, a ré comunicou-lhe o plano de pagamentos do acordo aludido em 4º, com as datas das transferências e respectivo montante unitário, sendo cada uma das rendas no valor de Esc. 653.855$00, com I.V.A. incluído, com excepção da primeira, no valor de Esc. 596.701$00, também com I.V.A. incluído, tendo-se feito constar que o valor residual se cifrava em Esc. 183.705$00, com I.V.A. incluído - (G).

    A)8º - Por carta datada de 9 de Julho de 1999, que a autora recebeu, a MC …, S. A. comunicou à autora que a B…SA fora incorporada na mesma, por fusão e que, por isso, a denominação da B…SA passara a ser a de MC …, S. A. e que, por motivos informáticos, se procedera à remuneração do contrato celebrado entre a Autora e a mesma, remuneração a que se procedera mediante a soma do nº 50.000 ao nº do contrato à data por forma a que se o contrato tivesse o nº 23.000, por exemplo, passara a ter o nº 73.000, mantendo-se no mais todas as condições contratuais estabelecidas - (H).

    A)9º - Por carta data de 2 de Abril de 2001 dirigida à autora e que a mesma recebeu a S…comunicou à autora que as sociedades participadas da MC …, SGPS, S. A. estavam, desde o ano anterior, integradas no grupo “ S…… “ e que iriam proceder à alteração da denominação social de “ MC …., S. A. “, que se passaria a chamar “ S……, S. A. “ e que toda a correspondência e remessas de valores fosse emitida utilizando tal designação - (I).

    A)10º - A autora pagou à té, pelo menos, as primeiras 12 rendas referidas em 4º e 7º - ( J).

  2. B) 11º - Por carta datada de 15 de Novembro de 2002 a ré comunicou à autora, relativamente ao acordo referido em 4 -, que dada a situação de grave incumprimento em que o mesmo se encontrava transitara para a Direcção de Contencioso, cujo gestor de processo passara a ser a Drª EF… e que deveria proceder à regularização, no prazo máximo de 8 dias, da quantia em dívida de 10.830,90 euros, sem prejuízo dos juros de mora, prazo findo o qual procederia à cobrança coerciva e que caso o incumprimento fosse superior a 90 dias procederia de imediato à informação dessa situação à Applease – Associação Portuguesa de B)Empresas de Leasing, que processaria automaticamente essa informação e a divulgaria por todas as associadas para conhecimento, assim como comunicariam ao Banco de Portugal a sua situação de mora - (L).

    B)12º – Por mail datado de 18 de Novembro de 2002 dirigido por EF - da Ré – e dirigido a CF…, da autora, a primeira comunicou ao segundo o seguinte: B)“ Vimos por este meio solicitar um contacto da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT