Acórdão nº 3/10.7PALGS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 31 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO JOÃO LATAS
Data da Resolução31 de Janeiro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Évora

Em conferência, acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora I. Relatório 1. – Nos presentes autos com o número em epígrafe que correm termos no 1º juízo criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Lagos, foi acusado em processo comum com intervenção do tribunal coletivo A, solteiro, nascido a 16/10/1975, ..., pedreiro, com residência na Urbanização..., em Lagos, atualmente, com domicílio profissional nos escritórios centrais da firma “Soares da Costa” sitos ...em Luanda, Angola, imputando-lhe o MP a prática de 10 crimes de coação sexual p. e p. pelo art. 163º/1 do Código Penal, CP, com a agravação p. e p. pelo art. 177º/4 do CP, na redação da Lei 65/98, 30 crimes de violação p. e p. pelo art. 164º/1 do CP, com a agravação p. e p. pelo art. 177º/4 do CP, na redação da Lei 65/98, e, atualmente, p. e p. pelos arts. 164º/1 e 177º/1-b) e /6 do CP, na redação da Lei 59/07, e um crime de coação sexual p. e p. pelo art. 163º/1 do CP, com a agravação p. e p. pelo art. 177º/6 na redação da Lei 59/07 do CP.

  1. – Após audiência de discussão e julgamento, na ausência do arguido que, regularmente notificado, não compareceu, o tribunal coletivo decidiu: a) Condenar o arguido pela prática de 10 (dez) crimes de coação sexual, agravados, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 163º/1 e 177º/4 do Código Penal, na redação da Lei 65/98 de 2/9, na pena, por cada um deles, de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; b) Condenar o arguido pela prática de 30 (trinta) crimes de violação, agravados, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 164º/1 e 177º/4 do Código Penal, na redação da Lei 65/98 de 2/9, na pena, por cada um deles, de 5 (cinco) anos de prisão; c) Condenar o arguido pela prática de 1 (um) crime de coação sexual, agravado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 163º/1 e 177º/6 do Código Penal, na redação da Lei 59/2007 de 4/9, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; d) Operar o cúmulo jurídico das penas parcelares e condenar o arguido na pena única de 16 (dezasseis) anos de prisão.

  2. – Deste acórdão condenatório, recorreu o arguido, extraindo da sua motivação de recurso as seguintes conclusões: « I) O Recorrente foi condenado, pela prática de 10 crimes de coação sexual, agravados, p. e p. pelo art. 163./1, conjugado com o art. 177º/4, todos do CP, com a redação operada pela lei nº 65/98, de 02-0, na pena de 02 anos e 06 meses de prisão por cada um deles, 30 crimes de violação , agravados, p. e p pelo art 164.º/1, conjugado com o art. 177/4, todos do CP, na redação operada pela Lei nº 65/98 e, atualmente, p. e p, pelo art. 164,º/1 e 177.

    0/1/b) e 6, do CP com a redação operada pela Lei n.º 59/07, de 04-09, na pena de 05 anos de pisão, por cada um deles, e 1 crime de coação sexual, agravado, p. e p. pelo art. 163.º/1, conjugado com o art 177 °/6, com a redação operada pela Lei n.º 59/07, de 04-09, todos do CP, na pena de 02 anos e 06 meses, tendo, após o cúmulo jurídico, condenado na pena única de 16 anos de prisão.

    II) O Recorrente não ficou convencido, de facto e de Direito, da Justiça e legalidade do decidido, entendendo que do conjunto da prova produzida, interpretada à luz das regras da experiência comum, não resulta provado que, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas na Acusação, tivesse cometido os crimes em que foi condenado.

    III) As declarações da menor para memória futura, apresentam lacunas, deficiências e contradições ou incongruências, e no respetivo Relatório de Audibilidade (a fls. 111 e ss dos autos), a menor não deu datas aproximada do início e termo das condutas que imputou ao arguido, remeteu-se para "marcos temporais" extremamente imprecisos como se retira ao referir que "tinha para aí i" e "mais ou menos" (cfr. respostas dadas ao M.º JIC a págs. 21 e 28 do Relatório e transcritas em 11. e 14. das Alegações que aqui se dá por reproduzido) que, o que seria relevante para se provar o efetivo lapso temporal das condutas que imputou ao arguido e da credibilidade do seu depoimento.

    IV) Não se sabe se as condutas imputadas ao arguido integradoras de 10 crimes de coação sexual tiveram o seu inicio quando a menor ainda tinha 9 anos, ou não, e o seu termo aos 11 anos, ou não, se perduraram por três, dois ou um ano, uma vez que inexistem datas aproximadas encontradas por referências temporais de mês ou pelo início, meio ou fim de ano, o que seria necessário para que o Tribunal pudesse considerar provado que os 10 crimes de coação sexual foram efetivamente cometidos entre 06/04/2004 e 06/04/2006, datas que apenas se reportam aos aniversários da menor.

    1. O "marco" dos 14 anos como termo das condutas do arguido, foi referido como tendo ocorrido no Norte, em junho de 2009, tendo inicialmente dito que houve uma tentativa para depois referir que foi obrigada (cfr. respostas dadas a págs. 28 e 29 do Relatório já transcritas em 14. e 15. das Alegações que se dão aqui por reproduzidas), o que configura uma clara contradição.

      VI) Tendo a menor referido que em junho de 2009, no Norte, foi obrigada a ter relações sexuais com o arguido pela última vez (cfr. pág. 29 e 30 do Relatório), a 1.ª Instância não podia ter considerado provado que o arguido praticou 30 crimes de violação entre 06/04/2006 e 06/04/2007, inexistindo qualquer prova de que no lapso de tempo alegado na Acusação tenha sido cometido 30 crimes de violação.

      VII) Nas declarações para memória futura (cfr. págs. 28 a 37 do Relatório) a menor respondeu que não se recordava das vezes, que tinha perdido a conta, para de seguida referir que foram “pelo menos” 10 e 30 vezes, sendo incongruente que tivese , imediatamente conseguido contar ou calcular com precisão que tinham sido pelo menos as 10 e 30 vezes que “adiantou” ao Mmo JIC, inexistindo qualquer outro meio de prova que as tivesse comprovado.

      VIII) Os factos imputados ao Arguido nos arts. 14.º a 16.º da Acusação não resultaram provados, tendo a testemunha D contrariado os mesmos com o seu depoimento (cfr. o seu depoimento de 27m08 a 28m40 do registo de áudio, transcrito em 22. das Alegações e que aqui se dá por reproduzido).

      IX) Os factos imputados ao Arguido e descritos nos arts. 3.º a 8.º e de 10.º a 13º .º da Acusação, não foram provados, porque só a mãe da menor é que estava bem posicionada para os confirmar e que apesar de desconfiar e ter tentado apanhar o arguido em flagrante, nunca presenciou qualquer dos factos, não sabendo se os mesmos são verdade ou mentira (cfr. as suas declarações de 09m52 a 10m45, de 12m35 a 12m40 e de 26m08 a 26mB do registo de áudio já transcrito em 25., 26. e 29. das Alegações e que se dão aqui por reproduzidas).

    2. Do depoimento da mãe, constata-se que a menor fez afirmações contraditórias e que põem em causa a credibilidade do seu depoimento para memória futura, tendo, inicialmente acusado o arguido de violação para posteriormente dizer que era mentira e, numa segunda vez, voltar a fazer a mesma afirmação num contexto de zangas, o que não mereceu credibilidade da mãe (cfr. depoimento de 13m11 a 14m02, de 14m31 a 15m14, de 26m08 a 26m13 do registo de áudio já transcrito em 27. e 29. das Alegações que aqui se dão por reproduzidas).

      XI) Inexistem quaisquer manifestações de ordem física que comprovem a práticas dos ilícitos por parte do arguido, tendo a mãe da menor esclarecido que a filha foi ao médico mas que estava tudo bem (cfr. o seu depoimento de 19m17 a 19m24 do registo de áudio já transcrito em 28 das Alegações e que aqui se dá por reproduzido), bem como qualquer tipo de exames ou perícias que comprovem os factos descritos na Acusação.

      XII) Existem flagrantes contradições ou discrepâncias entre as declarações prestadas para memória futura e as prestadas perante a Polícia Judiciária (cfr. a fls. 21 e ss. dos autos), designadamente: Naquelas referiu que o arguido a obrigava a meter a mão no pénis e a mantinha lá se tentasse tirar e nestas referiu que o arguido tentava que ela metesse a mão mas que conseguiu sempre recusar (cfr. págs. 37 e 38 do Relatório e linhas 20 a 22 da fI. 22 do auto de inquirição na P.J., já transcritas em 31. e 32. das Alegações que se dão aqui por reproduzidas); e, relativamente a factos ocorridos fora de casa, naquelas disse que foi em junho de 2009, quando estavam no Norte, que o arguido tentou fazer ou que a obrigou a fazer, mas nestas referiu que a última vez foi em Viana do Castelo, no Natal em dezembro de 2008 (cfr. págs. 28 e 29 do Relatório e linhas 49 a 56 da fIs 23 do auto de inquirição na P.J. e transcrito em 25 das Alegações que aqui se dão por reproduzidas).

      XIII) Os receios da mãe e a fuga de casa da menor não provam que a menor tenha sofrido alterações do seu comportamento, para além de sono agitado e de dificuldades de aprendizagem, bem como enurese noturna, devido a quaisquer comportamentos do arguido, e na comunicação a fls. 39 dos autos apenas foi concluído que se tratava de uma menor deprimida e com claros sinais de negligência, inexistindo qualquer nexo causal entre o estado da menor e quaisquer condutas do arguido, retirando-se das suas declarações para memória futura que foi acompanhada por uma psicóloga apenas por causa do pai (dr. págs. 49 e 50 do Relatório já transcrito em 40. das Alegações que aqui se reproduzem).

      XIV) As declarações da testemunha Domingas da Graça não sustentam as declarações da menor e comprovam que a menor não é credível, bem como, a reação violenta do arguido quando foi confrontado, na segunda vez que a menor o acusou de lhe ter violado, não prova que efetivamente tenha cometido os crimes que lhe foram imputados.

      XV). Dizem-nos os critérios da experiência comum e da lógica do "homem médio" que as crianças ou adolescentes, frequente e facilmente dizem mentiras conscientes ou inconscientes com uma convicção que engana os observadores mais atentos (cfr. ensina Enrico Altavilla, cuja doutrina autorizada se dá aqui por transporta de 44. Das Alegações), pelo que os seus depoimentos não podem fazer prova segura da realidade dos...

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